Jogo de interpretação

Reino Unido define prescrição em ação de consumo

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6 de junho de 2010, 8h42

Analisar o pedido do suposto ofendido, os argumentos da parte contrária, interpretar a lei nacional, a jurisprudência e as diretivas internacionais e chegar a uma solução que respeite todos os fatores. Foi essa a missão enfrentada pela Suprema Corte do Reino Unido para definir quanto tempo um consumidor tem para reclamar indenização por prejuízos causados por determinado produto.

A Suprema Corte do Reino Unido definiu que mover processo contra a distribuidora de determinado produto, quando esta está ligada diretamente à fabricante, por exemplo, como subsidiária dela, interrompe o prazo de prescrição, que é de 10 anos. Isso porque, para a corte, processar a subsidiária é o mesmo que processar a fabricante. Além disso, o prazo para prescrição começa a contar a partir da distribuição, que é considerado o dia em que a distribuidora colocou o produto no mercado, e não do dia em que ele saiu da fábrica.

A decisão britânica foi tomada depois de duas consultas à Corte de Justiça da União Europeia. De acordo com a Diretiva 85/374/EEC da comunidade, o consumidor prejudicado tem 10 anos para reclamar seus direitos a partir do momento em que o produto causador foi distribuído. A regra é genérica e não abrange particularidades presentes na legislação de cada país.

Em 1992, uma criança tomou uma vacina e, nove anos depois, foi à Justiça alegando que sofreu danos cerebrais por conta da vacina. O processo, no entanto, foi movido contra a subsidiária inglesa da fabricante francesa, que prontamente alegou que só distribuiu o produto. A defesa do menino, um ano depois, iniciou outro processo contra a fabricante francesa, que argumentou que o direito estava prescrito, já que já tinham passado os 10 anos previstos na diretiva da UE.

Os advogados do menino partiram para outra estratégia. Uma lei britânica permite que a distribuidora seja substituída no mesmo processo pela fabricante, quando o consumidor se engana e processa a empresa errada. A discussão, então, passou a ser se essa substituição afrontaria o prazo de 10 anos previsto pela União Europeia.

Parecer do parecer
Em novembro de 2003, a Justiça britânica foi consultar à Corte da União Europeia para saber como agir. A resposta, mesmo não tão clara, foi suficiente para que decidisse a favor do consumidor. A fabricante francesa recorreu à Corte de Apelação, perdeu, tentou na House of Lords (antiga Suprema Corte britânica) e também fracassou. Como a particularidade do caso rachou a House of Lords e a decisão não foi unânime, ficou decidido que uma nova consulta seria feita à corte da UE.

Em dezembro de 2009, chegou a resposta. A partir daí, coube à Suprema Corte interpretar as diretrizes da UE. A conclusão inicial foi de que as normas baixadas pela União Europeia prevalecem. Ponto pacífico, portanto, que o prazo de 10 anos de prescrição não pode ser desrespeitado e, substituir uma empresa pela outra, como prevê a lei britânica, levaria a isso. Não importa se o consumidor se enganou, disse a corte da UE, o prazo tem de ser observado para manter equilibrada a relação de consumo.

A defesa do menino, então, levantou outra questão. Na resposta da UE, encontrou uma brecha para permitir a substituição, de acordo com a relação das empresas. E, nesse ponto, convenceu. De acordo com as normas e as diretrizes dadas pela União Europeia, a Suprema Corte concluiu, por unanimidade, que o produto só é considerado distribuído quando vai para o mercado. Só aí começa a contar o prazo de prescrição.

Sobre a substituição de empresas, a conclusão foi de que, quando o distribuidor faz parte do processo de fabricação, por exemplo, uma subsidiária da empresa responsável por colocar o produto no mercado, mover ação contra uma é como mover ação contra a outra. Por conta dessa ligação, é considerado que o processo contra a empresa certa começou dentro do prazo, independente do erro do consumidor.

Clique aqui para ler a decisão em inglês.

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