Conflito de dados

Bons Ventos diz que obras não estão suspensas

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29 de outubro de 2009, 1h12

A Bons Ventos Geradora de Energia, responsável pela instalação do Parque Eólico de Aracati, formado por três usinas (Bons Ventos, Enacel e Canoa Quebrada) informou que as obras não foram totalmente suspensas, como informou o Ministério Público Federal, autor da ação. De acordo com decisão da 15ª Vara Federal, foi paralisada apenas o erguimento dos últimos três aerogeradores até que o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) faça um relatório sobre os riscos de danificar os sítios arqueológicos encontrados na região. O MPF no Ceará entrou com recurso contra a decisão.

A empresa afirmou que as obras estão passando por “demandas judiciais”, mas que a última decisão da Justiça Federal foi divulgada de forma distorcida pelo Ministério Público. De acordo com a denúncia do MPF, ficou constatada a necessidade de licenciamentos das usinas mediante Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima). Em sua decisão, o juiz Lauro Henrique Lobo Bandeira afirma que a apresentação do Relatório Ambiental Simplificado (RAS) torna desnecessário o EIA/Rima pelo fato de o “empreendimento se encontrar localizado em zona costeira ou em área de preservação permanente”.

A informação divulgada pelo Ministério Público também informou que a obra estava causando a destruição de inúmeros sítios arqueológicos localizados no distrito Cumbe/Canavieiras. Segundo texto da decisão, esses impactos ainda não foram comprovados, já que o juiz determinou que o Iphan execute vistoria no local para confirmar se há riscos contra o patrimônio.  Para impedir que algum dano seja causado, foi determinada a suspensão da construção de torres que ainda não foram iniciadas. A empresa pode ser multada em R$ 10 mil caso descumpra a ordem.

A assessoria de imprensa da Bons Ventos informou que os impactos ambientais do “parecer técnico” informado pelo Ministério Público não correspondem aos estudos desenvolvidos pelo IPHAN, Semace e outros especialistas. “As alegadas irregularidades constatadas pelo escritório regional do Ibama nunca foram apresentadas para apreciação do Juízo. Caso exista este relatório, a suposta conclusão de que os empreendimentos não configuram baixo impacto ambiental está em desacordo com a lei e o trabalho de licenciamento realizado”, informa o texto enviado à ConJur.

O juiz ainda alerta para o caso de que há uma ação semelhante ajuizada pelo Ministério Público Estadual na 2ª Vara da Comarca de Aracati-CE. A única diferença entre elas é o pedido de de reparação ambiental formulado contra o Iphan. “Percebe-se, pois, a existência de uma nítida relação de continência ou litispendência parcial entre a presente ação e a que se encontra em curso no Juízo Estadual, sendo a reunião dos feitos medida recomendável para evitar-se decisões conflitantes sobre a mesma questão”, afirma. A decisão ainda recomenda que a União seja intimada nesta ação estadual, já que os sítios arqueológicos são bens do Estado.

Recurso
O MPF no Ceará entrou com recurso contra a decisão da 15ª Vara. Por meio de Agravo de Instrumento ajuizado no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, nesta quarta-feira (28/10), o órgão pede a paralisação de todos os 64 aerogeradores da Usinas Eólicas e também a não instalação de novas torres. Segundo o procurador da República em Limoeiro do Norte, Luiz Carlos Oliveira Júnior, é necessária a observação quanto aos laudos existentes no processo, que atestam, graves danos causados ao meio ambiente e ao patrimônio cultural.

Leia a decisão.

Processo n°. 2009.81.01.000396-3
Classe: 1 – Ação Civil Pública
Autor: Ministério Público Federal e Outro
Réu: Superintendência Estadual do Meio Ambiente – SEMACE e Outros

DECISÃO

1. Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e MINSTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em litisconsórcio ativo, contra a SUPERINTENDÊNCIA ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE – SEMACE, INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL – IPHAN e BONS VENTOS GERADORA DE ENERGIA S/A, visando à anulação do processo de licenciamento da obra de construção do Parque Eólico do Aracati, localizada no Distrito de Cumbe/Canavieiras, Aracati/CE, bem como seja proibida a realização de qualquer obra ou intervenção na área destinada ao empreendimento sem estar precedido de EIA/RIMA.

                      Aduz o Ministério Público que a construção do Parque Eólico do Aracati, formado pelas Usinas Eólicos Bons Ventos (composto de 24 aerogeradores), Enacel (composto por 15 aerogeradores) e Canoa Quebrada (composto de 28 aerogeradores), de responsabilidade da empresa BONS VENTOS GERADORA DE ENERGIA S/A, vem causando graves danos ambientais no campos de dunas fixas e móveis da planície costeira do Cumbe e aos sítios arqueológicos existentes na área do empreendimento.

                       Afirma que no licenciamento das obras foi dispensado o EIA-RIMA, aceitando a SEMACE como suficiente o RAS – Relatório Ambiental Simplificado, conforme Resolução CONAMA 279/2001. Defende, no entanto, que a adoção do referido procedimento de licenciamento ambiental simplificado tem por pressuposto que o empreendimento seja de impacto ambiental de pequeno porte, o que não se verifica na hipótese, uma vez as obras se encontrarem em área de preservação permanente (APP) e de proteção ambiental (APA), além de ocupar Zona Costeira, fato que por si só reclama o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para implantação de qualquer construção, instalação ou funcionamento de atividades no local, nos termos do art. 6º, § 2º, da Lei 7.661/88.

                       Salientou, também, a presença de sítios arqueológicos na região do empreendimento, conforme estudo elaborado por equipe de antropólogos, mostrando-se necessária, desse modo, a elaboração do EIA/RIMA, uma vez que o estudo simplificado (RAS) não foi capaz de identificar de maneira clara todos os impactos ambientais negativos que estão ocorrendo na área de influência do projeto.

                       Ao final, formulou requerimento de antecipação dos efeitos da tutela, para que seja determinada: a) a imediata suspensão dos efeitos do RAS referente aos empreendimentos em questão, sob responsabilidade da empresa BONS VENTOS; b) a paralisação das obras, bem como retirada de todo o maquinário da construção; c) a proibição de qualquer outra intervenção na área em comento sem o devido estudo de impacto ambiental (EIA/RIMA); d) a identificação e isolamento pelo IPHAN, em um prazo de 60 (sessenta) dias, de todos os sítios arqueológicos existentes no local do empreendimento.

                       Em atenção ao princípio do contraditório e para coletar dados mais precisos sobre a questão, determinei a prévia ouvida das partes demandadas.

                       A empresa BONS VENTOS GERADORA DE ENERGIA S/A, em sua manifestação sobre o pedido de tutela antecipada (fls. 11125/1182), após tecer considerações acerca da importância e benefícios da energia eólica para a preservação do meio ambiente e para o desenvolvimento econômico local, destaca que: a) o RAS, apesar da denominação, constitui estudo dotado de complexidade e detalhamento apto a detectar os possíveis impactos ambientais gerados pelo empreendimento e os meios necessários a repará-los; b) que a adoção do RAS em substituição ao EIA/RIMA tem fundamento na Resolução nº 279/2001, expedida pelo CONOMA com base no poder regulamentar que lhe foi conferido pela Lei 6.938/81; c) ser plenamente possível a realização de empreendimentos desta natureza em APP, face às disposições da Resolução CONAMA nº 369/2006; d) a existência de expressa declaração do IPHAN, por meio do Ofício nº 083/08-GEPAN/DEPAM/IPHAN, atestando a regularidade do empreendimento na esfera do patrimônio arqueológico.

                       Embora pendente de intimação a SEMACE e o IPHAN para se manifestarem sobre o pedido liminar, atravessou o Ministério Público Federal a petição de fl. 2194, requerendo urgência na apreciação do pleito de tutela antecipada, em razão dos moradores das Comunidades do Cumbe e de Canavieiras terem denunciado a ocorrência de possível danos ao maior sítio arqueológico situado nas dunas, "pois as máquinas da empresa Bons Ventos já se encontram a menos de 50 metros do maior foco do sítio."

                       Em razão disso, vieram-me os autos conclusos.

                       2. Decido.

                       A Constituição Federal, em seu artigo 225, § 1º, IV, prescreve o estudo prévio de impacto ambiental como uma exigência para o licenciamento de obras ou atividades potencialmente causadoras de significativa degradação ao meio ambiente, verbis:
"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(…)
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;"
                       Trata-se de nítida medida preventiva, calcada no princípio da precaução, tendo como finalidade evitar riscos ao meio ambiente a partir da exploração de atividades que se afigurem potencialmente lesivas, devendo sua exigência dar-se na forma da lei.
                       Nos termos da Lei 8.938/81, que institui a Política Nacional do Meio Ambiente, tem-se que:
"Art. 8º. Compete ao CONAMA:
I – estabelecer, mediante proposta do IBAMA, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, a ser concedido pelos Estados e supervisionado pelo IBAMA;

Art. 9º. São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente:
(…)
III – a avaliação de impactos ambientais;"
                       Como se nota, ao CONAMA compete estabelecer normas e critérios para o licenciamento de atividades efetivas ou potencialmente poluidoras. Nesse desiderato, o CONAMA editou a Resolução 279/2001, prevendo Relatório Ambiental Simplificado – RAS para empreendimentos com impacto ambiental de pequeno porte, necessários ao incremento da oferta de energia elétrica no país, sendo incluídas as usinas eólicas:
"Art. 1º Os procedimentos e prazos estabelecidos nesta Resolução, aplicam-se, em qualquer nível de competência, ao licenciamento ambiental simplificado de empreendimentos elétricos com pequeno potencial de impacto ambiental, aí incluídos:
I – Usinas hidrelétricas e sistemas associados;
II – Usinas termelétricas e sistemas associados;
III – Sistemas de transmissão de energia elétrica (linhas de transmissão e subestações).
IV – Usinas Eólicas e outras fontes alternativas de energia.
Parágrafo único. Para fins de aplicação desta Resolução, os sistemas associados serão analisados conjuntamente aos empreendimentos principais." (destacou-se)

                       De acordo com o art. 2º, I, da Resolução nº 279/2001, o RAS engloba estudos relativos aos aspectos ambientais relacionados à localização, instalação, operação e ampliação de uma atividade ou empreendimento, apresentados como subsídio para a concessão da licença prévia requerida, que conterá, dentre outras, as informações relativas ao diagnóstico ambiental da região de inserção do empreendimento, sua caracterização, a identificação dos impactos ambientais e das medidas de controle, de mitigação e de compensação.
                      

Nessa perspectiva, o RAS atende a exigência constitucional de avaliação de impacto ambiental, pois embora cuide de um procedimento simplificado, seu conteúdo encerra certo grau de complexidade, reunindo uma gama de informações sobre a extensão do empreendimento e dos prováveis impactos ambientais e sócio-econômicos decorrentes da sua implantação e operação na área de influência do projeto.

                       Ademais, a simples apresentação da RAS não garante o direito ao procedimento de licenciamento ambiental simplificado, ficando tal enquadramento a depender de parecer técnico fundamentado do órgão ambiental competente, elaborado com base nas informações contidas no estudo apresentado. Verificado que o empreendimento não atende às exigências para ser enquadrada no licenciamento simplificado, a concessão da licença ficará a depender de Estudo Prévio de Impacto Ambiental – EIA (artigo 4º da Resolução 279/2001).

                       Esclareça-se que a Avaliação de Impactos Ambientais é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, nos termos do art. 9º, III, da Lei 6.938/81, sendo o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório Ambiental Simplificado (RAS) suas espécies, cabendo ressaltar que a conveniência da exigência de um estudo ou do outro dependerá sempre da análise técnica do órgão de fiscalização competente, à vista do impacto potencial do empreendimento.
                     

Nessa perspectiva, não há ilegalidade no procedimento de licenciamento ambiental simplificado previsto na Resolução nº 279/81, pois ao CONAMA, com base no poder regulamentar que lhe foi conferido por lei, compete regulamentar os procedimentos de licenciamento cabíveis, observadas as especificidades e particularidades próprias a cada empreendimento.

                       Assim, o impacto ambiental aferido através do RAS, no caso, torna desnecessária a apresentação do EIA – RIMA, sendo irrelevante, nos termos da legislação específica, o fato do empreendimento se encontrar localizado em zona costeira ou em área de preservação permanente. O que importa, nos termos da legislação, é a constatação de que o empreendimento é classificado como sendo de pequeno potencial de impacto ambiental.

                       Nesse sentido, colham-se os seguintes precedentes do TRF da 5ª Região:

"EMENTA: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR INOMINADA PREPARATÓRIA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PARALISAÇÃO DE OBRAS. PARQUE EÓLICO. IMPACTO AMBIENTAL DE PEQUENO PORTE. RELATÓRIO AMBIENTAL SIMPLIFICADO – RAS. LEI Nº 6938/81. RESOLUÇÃO Nº 279/2001 DO CONAMA – CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. I. A Lei 6938/81, em seu artigo 8º, atribuiu ao CONAMA, mediante proposta do IBAMA, o estabelecimento de normas e critérios para o licenciamento de atividades efetivas ou potencialmente poluidoras. Assim, editou o CONAMA a Resolução 279/2001, prevendo o Relatório Ambiental Simplificado – RAS para empreendimentos com impacto ambiental de pequeno porte, necessários ao incremento da oferta de energia elétrica no País, sendo incluídas as usinas eólicas. II. Desta forma, tratando-se o empreendimento da presente lide de usina eólica, classificada como de impacto ambiental de pequeno porte, suscetível é de aferição pelo Relatório Ambiental Simplificado – RAS e não obrigatoriamente pelo EIA – RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental). III. É fato que a Lei nº 6.938/81, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, dispõe em seu artigo 10, caput, que a implantação de empreendimentos que envolvam a utilização de recursos naturais e que possam causar, de qualquer forma, a degradação do meio ambiente, dependerá de prévio licenciamento do órgão estadual competente e do IBAMA, em caráter supletivo. Entretanto, reserva a competência da autarquia federal quando se tratar de licenciamento de obras que envolvam significativo impacto ambiental, de âmbito regional ou nacional. IV. O Ministério Público Federal não juntou aos autos qualquer documento comprobatório de vistoria nas obras, sequer relatório substancial do IBAMA, que indique os prejuízos ao meio ambiente alegados na exordial. V. Agravo de Instrumento Improvido."
(TRF-5, AGTR 86786-CE, 4ª T., Rel. Marco Bruno Miranda Clementino, DJ 07/07/2008, p. 878)

"ADMINISTRATIVO. PARALISAÇÃO DE OBRAS DE IMPLANTAÇÃO DE USINAS EÓLICAS. IMPACTO AMBIENTAL DE PEQUENO PORTE. RELATÓRIO AMBIENTAL SIMPLIFICADO – RAS. LEI Nº 6938/81. RESOLUÇÃO Nº 279/2001 DO CONAMA – CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. 1. Versam os autos sobre Agravo de Instrumento, interposto pelo IBAMA contra decisão que, em mandado de segurança, deferiu a liminar pleiteada, para suspender os efeitos do embargo administrativo efetuado pelo ora Agravante em face das obras de implantação das usinas eólicas "Canoa Quebrada", "Enacel" e "Bons Ventos", localizadas no Município de Aracati/CE. 2. A Lei nº 6.938/81, que institui a Política Nacional do Meio Ambiente, preconiza, em seu artigo 10, caput, que a implantação de empreendimentos que envolvam a utilização de recursos naturais e que possam causar, de qualquer forma, a degradação do meio ambiente, dependerá de prévio licenciamento do órgão estadual competente e do IBAMA, em caráter supletivo. Entrementes, protrai-se do parágrafo 4º da norma em referência que a competência do IBAMA é reservada aos casos de licenciamento de obras que envolvam significativo impacto ambiental, de âmbito regional ou nacional. 3. A Resolução do CONAMA n.º 279, de 27 de junho de 2001, em seu art. 1.º, classifica as Usinas Eólicas como empreendimentos de pequeno potencial de impacto ambiental, o que afasta, até prova em contrário, a competência da Autarquia Federal para o seu licenciamento ambiental. 4. Os empreendimentos em questão obtiveram licenciamento do órgão competente, na espécie, a SEMACE – Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Ceará, para a implantação do parque eólico, de forma que milita em seu favor a presunção de conformação ambiental, consoante destacou a decisão agravada. 5. Pelo que evidencia os documentos coligidos aos autos, não ficou caracterizada a omissão do órgão ambiental estadual, a qual justificaria a competência supletiva da Autarquia Federal. 6. Os empreendimentos do caso em apreço (usinas eólicas), devem ser enquadrados como de impacto ambiental de pequeno porte, portanto suscetíveis de aferição pelo Relatório Ambiental Simplificado – RAS e não necessariamente pelo EIA – RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental). 7. Precedentes deste eg. Tribunal: (AGTR 86786/CE – Rel. Des. Federal (Convocado Marco Bruno Miranda Clementino – DJU 07/07/2008 – AGTR 92911-CE – Des. Federal Marcelo Navarro – Publ. 26/11/2008). 8. Agravo de instrumento improvido. Prejudicado o pedido de reconsideração atravessado pelo IBAMA contra a decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo."
(TRF-5, AGTR 93284-CE, 2ª T., Rel. Francisco Barros Dias, DEJ 17.09.2009, p. 600)

Tenha-se presente, por outro lado, que a Resolução CONAMA 279/2001 encontra fundamento de validade na Medida Provisória 2.152/2001 (Art. 8º), que, por sua vez, mitiga (derroga) os efeitos do Art. 6º, § 2º, da Lei 7.661, de 16/05//88, quando determinou a realização do EIA – RIMA para empreendimentos com alterações das características naturais da Zona Costeira. Além do mais, a Resolução CONAMA 369/2006, excepcionalmente, autoriza a intervenção ou supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente – APP para a implantação de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública, como se extrai do seu art. 2º, verbis:

"Art. 2º O órgão ambiental competente somente poderá autorizar a intervenção ou supressão de vegetação em APP, devidamente caracterizada e motivada mediante procedimento administrativo autônomo e prévio, e atendidos os requisitos previstos nesta resolução e noutras normas federais, estaduais e municipais aplicáveis, bem como no Plano Diretor, Zoneamento Ecológico- Econômico e Plano de Manejo das Unidades de Conservação, se existentes, nos seguintes casos:
I – utilidade pública:
……..
b) as obras essenciais de infra-estrutura destinadas aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia;"
                       No que atine ao alegado dano a bem cultural, verifico que o IPHAN, através do gerente do patrimônio arqueológico e natural, reconheceu que o empreendimento em tela encontra-se de acordo com a legislação de proteção e preservação do patrimônio arqueológico, estando apto a receber a Licença de Instalação, conforme se extrai do Ofício nº 083/2008-GEPAN/SEPAM/IPHAN (fls. 2135/2136).

                       O referido ofício aponta a existência de 5 (cinco) condições a serem observadas pelo empreendedor na execução do projeto, visando à preservação dos achados arqueológicos, dentre elas a de realizar o resgate dos sítios arqueológicos identificados nas áreas que sofrerão impactos diretos pela implantação do empreendimento.

                      Entretanto, o Ministério Público Federal juntou um abaixo assinado, encaminhado pelos moradores da Comunidade do Cumbe e Canavieira, em que denunciam a iminência de destruição do maior sítio ecológico situados nas dunas, pois máquinas se encontrariam a menos de 50 (cinqüenta) metros do maior foco do sítio, conforme fotos juntadas aos autos (fls. 2200/2206). Pôs dúvida, desse modo, sobre o cumprimento pela empresa promovida das condições impostas pelo IPHAN para a preservação dos sítios arqueológicos.

                       Nesse passo, apesar da ausência de certeza em torno do fato alegado, mas com o intuito de prevenir eventuais danos irremediáveis ao patrimônio arqueológico existente no local, cabendo destacar que, na dúvida, deve-se optar sempre pela preservação do bem ambiental, tenho como pertinente a suspensão das obras das torres de aerogeradores cujos processos de implantação ainda não se iniciaram, até que o IPHAN esclareça, mediante vistoria in loco, o cumprimento ou não pela empresa empreendedora das determinações contidas no Ofício nº 083/2008-GEPAN/SEPAM/IPHAN.

                       Por fim, anoto que a empresa BONS VENTOS GERADORA DE ENERGIA S/A, em sua manifestação preliminar, juntou cópia da inicial da Ação Civil Pública nº 2008.0029.4266-2 (fl. 1184/1224), anterior a esta, ajuizada pelo Ministério Público Estadual perante a 2ª Vara da Comarca de Aracati-CE, cujos fundamentos são praticamente os mesmos dos deduzidos nesta ação, inclusive a questão envolvendo os sítios arqueológicos.

                       Com efeito, do cotejo das iniciais, percebe-se que a matéria fática subjacente e os pedidos em ambas as ações são basicamente os mesmos, pois envolvem a discussão da regularidade da construção de usinas eólicas em Aracati, tendo o presente feito, como particularidade, a existência de pedido de reparação ambiental formulado contra o IPHAN, o qual não consta da ação anterior. Percebe-se, pois, a existência de uma nítida relação de continência ou litispendência parcial entre a presente ação e a que se encontra em curso no Juízo Estadual, sendo a reunião dos feitos medida recomendável para evitar-se decisões conflitantes sobre a mesma questão.

                       Por outro lado, sendo os sítios arqueológicos bens da União (art. 20, X, CF), sobressai, a princípio, evidente o interesse do referido ente em integrar a lide em curso na Comarca de Aracati, não havendo notícias de que tenha sido intimada naquele feito para manifestar tal interesse.

                       Nesse contexto, afigura-se prudente e recomendável que seja intimada a União para dizer se tem interesse neste feito, e dar-lhe ciência da ação civil pública em curso na Justiça Estadual, devendo, para tanto, peticionar diretamente àquele Juízo expondo seu interesse, que, sendo positivo, viabilizará a reunião dos feitos para julgamento conjunto na Justiça Federal.

                       3. Ante o exposto, DEFIRO parcialmente a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar à promovida BONS VENTOS GERADORA DE ENERGIA S/A que suspenda as obras de construção das torres de aerogeradores, localizadas no Parque Eólico de Aracati (Usinas Bons Ventos, Canoa Quebrada e Aracati), cujos procedimentos de implantação ainda não tiveram início, sem prejuízo da conclusão daquelas já iniciadas, pois já removidas as terras do local, e do funcionamento regular dos geradores já montados, ficando arbitrada multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em caso de descumprimento. Deverá o IPHAN, no prazo de 20 (vinte) dias, apresentar laudo de vistoria no local dos empreendimentos, explicitando se a empresa apontada vem cumprindo as determinações referidas no Ofício nº 083/2008-GEPAN/SEPAM/IPHAN.

                       Intimem-se, com urgência. Citem-se.
                       Intime-se a União para dizer se tem interesse no presente feito, bem como tomar ciência da Ação Civil Pública nº 2008.0029.4266-2, em trâmite na 2ª Vara da Comarca de Aracati-CE.
                       Limoeiro do Norte (CE), 23 de outubro de 2009.
                          LAURO HENRIQUE LOBO BANDEIRA
                            Juiz Federal Substituto da 15.ª Vara

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Subseção Judiciária do Ceará
15ª Vara

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