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Supremo decide quem pode ser amicus curiae

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2 de abril de 2009, 18h05

Antes de decidir se é legal a exigência de diploma para o exercício do jornalismo, o Supremo Tribunal Federal analisará a possibilidade de admitir uma pessoa física como amicus curiae no processo que definirá a questão. O relator é o presidente da corte, ministro Gilmar Mendes.

O pedido para falar nos autos foi feito por Alon Feuerwerker, editor de política do jornal Correio Braziliense. Feuerwerker trabalha com jornalismo desde 1981, já foi premiado por seu trabalho, mas não fez faculdade de jornalismo. Chegou a cursar a Escola de Comunicação e Artes da USP, mas não concluiu o curso.

Como a decisão do STF influi diretamente em sua vida, o jornalista pediu para se manifestar no processo. O ministro Gilmar Mendes ainda não analisou o pedido. Até hoje, o Supremo nunca admitiu formalmente pessoas físicas como amicus curiae. A jurisprudência da corte, contudo, tem evoluído claramente no sentido de permitir cada vez mais a participação da sociedade nos processos.

Até 2005, por exemplo, o Supremo não admitia a participação de amicus curiae em Recursos Extraordinários. Apenas nas ações de controle concentrado, como Ação Direta de Inconstitucionalidade e Declaratória de Constitucionalidade, a participação formal de terceiros interessados na causa era aceita.

A mudança na jurisprudência se deu justamente em um recurso que tinha como relator o ministro Gilmar Mendes, que decidirá o pedido de Alon Feuerwerker. O presidente do Supremo deu voz à Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos no processo que discutia revisão de benefício de pensão por morte.

De lá para cá, a figura do amicus curiae é perfeitamente aceita em Recursos Extraordinários. Em recente pesquisa feita para sua tese de mestrado que leva o título Amigo da Corte ou Amigo da Parte? — Amicus Curiae no Supremo Tribunal Federal, a advogada constitucionalista Damares Medina analisou 98 recursos e mostrou que em 10% deles houve a participação de amicus curiae.

“Com a adoção da repercussão geral como condição para análise dos Recursos Extraordinários, a tendência é a de que o amicus curiae esteja cada vez mais presente nessas discussões”, afirma Damares. A advogada lembra que, formalmente, nunca houve casos de pessoas físicas como amicus curiae. “Apesar de não acolher formalmente o pedido, os ministros juntam as manifestações aos autos.”

De acordo com as leis que regulam a matéria, cabe ao relator do processo, considerando a relevância da causa e a representatividade de quem postula ter voz na causa, “admitir a manifestação de outros órgãos ou entidades”. As regras dispõem apenas sobre entidades e órgãos, não sobre pessoas físicas.

O advogado Valmir Vieira, que representa Alon Feuerwerker, fundamentou seu pedido na repercussão que a decisão do Supremo terá na vida de diversos jornalistas sem diploma. “A relevância e a temática da questão justificam a participação de terceiros interessados no processo”, disse. Se o STF não admitir a participação do jornalista como amicus curiae, o advogado pede, alternativamente, o ingresso na causa como assistente do Ministério Público.

Papel de jornalista

Está em curso no Supremo recurso que discute se o diploma de jornalismo é obrigatório para o exercício da profissão de jornalista. Hoje, quem não tem diploma pode trabalhar em jornalismo graças a uma liminar do ministro Gilmar Mendes. A liminar que garante o exercício da profissão sem a necessidade do diploma foi concedida por Mendes em 16 de novembro de 2006 e referendada pela 2ª Turma do STF cinco dias depois. A turma, no entanto, não tomou posição contra ou a favor da exigência.

Quando corroboraram a decisão de Gilmar Mendes, os ministros garantiram o exercício da atividade jornalística aos que já atuavam na área sem o registro no Ministério do Trabalho ou diploma, enquanto o Supremo não decide o mérito da questão. A matéria pode ser definida em breve. O recurso foi apresentado pelo Ministério Público Federal e pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo. O MPF alega que o jornalismo é uma atividade intelectual, que prescinde de obrigação de formação superior.

A polêmica em torno da necessidade de diploma de jornalismo para o exercício da profissão esteve presente na imprensa desde a edição do Decreto-Lei 972/69, que regulamenta a atividade, mas ganhou força em outubro de 2001, quando o Ministério Público entrou com ação para derrubar a exigência de diploma.

No dia 23 de outubro de 2001, a Justiça deu liminar para suspender a obrigação de ter diploma de curso de jornalismo para a atividade jornalística. A Justiça acolheu o argumento da procuradora da República Luiza Fonseca Frischeisen de que o decreto que regula a profissão não foi recepcionado pela Constituição de 1988. A exigência foi cassada.

A União e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) recorreram ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região. No final de 2005, a 4ª Turma do tribunal derrubou a sentença de primeira instância e restabeleceu a obrigação de os jornalistas terem curso superior na área específica. O relator da matéria, desembargador Manoel Álvares, entendeu que o Decreto-Lei 972/69 foi, sim, recepcionado pela Constituição.

Foi a vez, então, de o MPF recorrer ao Supremo. O argumento do MPF é o de que o artigo 5º da Constituição fixa o direito do livre trabalho e da livre expressão da atividade intelectual e de comunicação. Para o Ministério Público, a exigência de diploma para exercer a profissão de jornalista se choca com esses princípios constitucionais.

Em Ação Cautelar, o procurador-geral da República, Luiz Fernando de Souza, conseguiu liminar para suspender a exigência do diploma. Agora, o Supremo decidirá o mérito da questão. O caso estava na pauta de quarta-feira (1/4), mas como o julgamento sobre a Lei de Imprensa foi extenso, não chegou a ser apregoado. A discussão pode voltar à pauta do STF no dia 22 de abril.

RE 511.961

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