Operação Hurricane

Desembargadores do TRF-2 são presos pela Polícia Federal

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13 de abril de 2007, 9h46

A Polícia Federal deflagrou nesta sexta-feira (13/4) a Operação Hurricane, nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e no Distrito Federal para deter envolvidos em esquemas exploração de jogo ilegal (caça-níqueis) e crimes contra a administração pública. De acordo com a PF, entre os presos estão os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, José Eduardo Carreira Alvim e José Ricardo de Figueira Regueira e o procurador regional da República no Rio, João Sérgio Leal Pereira.

Conforme publicou ontem a Consultor Jurídico, na sessão administrativa que elegeu a nova direção do TRF-2, em 1° de março, Carreira Alvim havia afirmado ter sido vítima de escuta ambiental em seu gabinete e que seus familiares haviam sido grampeados (Clique aqui para ler a notícia). As acusações foram feitas depois que ele foi preterido pelos colegas na eleição para a presidência do TRF-2. O clima entre o desembargador e seus colegas era de estranhamento, causado justamente por liminares dadas por Carreira Alvim em casos de bingos e caça-níqueis.

Na operação da PF foram cumpridos 70 mandados de busca e apreensão e 25 mandados de prisão contra chefes de grupos ligados a jogos ilegais, empresários, advogados, policiais civis e federais, juízes e membros do Ministério Público Federal.

Os presos serão transferidos para Brasília (DF), onde serão interrogados e permanecerão à disposição da Justiça. O material apreendido será analisado na Diretoria de Inteligência Policial com o objetivo de complementar os trabalhos de investigação.

A Polícia Federal informa que o trabalho que resultou na Operação Hurricane teve início com a identificação de uma organização criminosa especializada e estruturada para a prática de vários crimes, incluindo exploração de jogos ilegais, corrupção de agentes públicos, tráfico de influências e receptação. Foi apurado durante a investigação o envolvimento de pessoas com prerrogativa de foro, o que implicou no encaminhamento de Relatório de Inteligência Policial ao Supremo Tribunal Federal. Isto resultou no Inquérito 2.424/2006 – STF, relatado pelo ministro Cezar Peluso. O inquérito embasou a manifestação do procurador-geral da República Antônio Fernando Souza, que culminou na expedição das buscas e prisões.

Também foram detidos Anísio Abraão David, ex-presidente da Escola de Samba Beija-Flor de Nilópolis, Capitão Guimarães, presidente da Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro, e Antônio Petrus Kalil, conhecido como Turcão, apontado pela Polícia como um dos mais influentes bicheiros do Rio; o procurador regional da República João Sérgio Leal Pereira; a corregedora da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Suzi Pinheiro Dias de Matos; o juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Ernesto da Luz Pinto Dória.

Atuação polêmica

Carreira Alvim foi vice-presidente do TRF-2 até quinta-feira (12/4), quando tomou posse a nova direção. Pela tradição, se tornaria presidente por ser o mais antigo da casa, mas foi preterido por entrar em atrito com seus colegas.

Processualista reconhecido, com dezenas de livros publicados, Carreira Alvim provocou atritos com seus colegas por conceder liminares em Ações Cautelares interpostas contra decisões que nem sequer tinham sido ainda tomadas. Ou seja, eram liminares em recursos futuros, que só poderiam ser interpostos depois da publicação dos acórdãos, ainda não votados. Elas acabaram sendo vistas pelos seus pares como uma forma monocrática de a vice-presidência, então ocupada por Carreira Alvim, rever decisões que seriam tomadas pelas turmas ou pelo pleno.

Um desses casos envolveu justamente a apreensão de máquinas caça-níqueis. Em junho do ano passado, ele determinou a liberação de 900 destas máquinas recolhidas de casas de bingos da cidade de Niterói. Um pedido de liminar em Mandado de Segurança já tinha sido negado pelo relator do caso, desembargador Sérgio Feltrin. A decisão do vice-presidente deu-se antes do julgamento do Agravo interposto pela defesa dos bingos contra a recusa da liminar.

Carreia Alvim baseou-se no entendimento de que a “jurisprudência orienta-se no sentido de ser possível o empréstimo de efeito suspensivo a recurso, ainda não interposto na origem, quando presentes o perigo de lesão irreversível e a aparência de bom direito”.

A devolução da máquina, que deveria ter ocorrido em um sábado, foi suspensa por desembargadores de plantão, diante de alegadas dificuldades burocráticas sustentadas pela Polícia Federal. Isto provocou um novo despacho do vice-presidente, no qual ele não escondeu sua contrariedade: “O órgão hierarquicamente competente para reexaminar as decisões do Vice-Presidente do Tribunal de origem na Medida Cautelar é, unicamente, o Superior Tribunal de Justiça, o tribunal de destino (…) pelo que as decisões proferidas pelos ilustres desembargadores Benedito Gonçalves e Messod Azulay Neto, desta Corte, em regime de plantão, não tem sustentáculo legal”.

A decisão de Carreira Alvim acabou suspensa por outra decisão do presidente do TRF-2, Frederico Gueiros, na qual ele ironizou as atitudes do colega lembrando suas reconhecidas qualidades de processualista: “a decisão alvejada através do presente mandado de segurança foi proferida por emérito professor de direito processual civil que, talvez, pelo acúmulo de serviço na Vice-Presidência e o natural açodamento que é exigido dos magistrados em questões urgentes, olvidou-se de perquirir acerca do interesse no manejo da medida cautelar para emprestar efeito suspensivo a recurso contra decisão inexistente”.

A 1ª Turma negou o Mandado de Segurança, acompanhando o voto do relator, desembargador Feltrin, em que ele também não perdeu a oportunidade de criticar o colega justamente por rever decisão dos seus pares. “Assumiu, mediante tais atos, o Senhor Vice-Presidente, com afirmativas do tipo que ‘Portaria é coisa de Porteiro’ (N.R. referência a uma Portaria da Receita Federal considerando as máquinas caça-níqueis contrabando), a condição de mandatário-mor, ordenador único, competência exclusiva deste relator, valendo lembrar que está a falar de um agravo interno ainda não julgado pela 1ª turma especializada, estabelecendo a seu talante modos e meios de atendimento a um estranho pedido cautelar, que visa proteger um futuro recurso que o e. vice-presidente tem absoluta certeza de que um dia virá a ser interposto, em defesa de que interesses e bens não se consegue ficar sabendo com a necessária, a indispensável segurança, tal a confusão buscada instaurar.”

Negada a segurança pela Turma, os advogados dos bingos recorreram ao STJ, onde o ministro Paulo Medina liberou liminarmente as máquinas. A disputa processual prosseguiu através do Procurador-Geral da República, Antônio Fernando Souza, que recorreu à presidente do Supremo, ministra Ellen Gracie, com um pedido de Suspensão de Liminar.

Ao atendê-lo, ela entendeu que “se encontram demonstradas graves lesões à ordem e à segurança públicas, pois a liberação das máquinas eletrônicas apreendidas, a serem utilizadas na exploração de jogo de azar e loterias, é, num juízo prefacial e estritamente necessário para a apreciação do pedido de suspensão, medida que se incompatibiliza com a natureza contravencional dessa atividade”. As máquinas, porém, já tinham sido devolvidas e nem todas foram reencontradas.

O mesmo expediente de concessão de liminares em recurso futuros beneficiou empresas como a Refrigerantes do Rio de Janeiro (fábrica da Coca Cola), a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), uma adega de vinhos, um importador de alho e a fábrica de cigarros American Virgínia, fechada pela Receita Federal por ser considerada contumaz sonegadora. Em todos estes casos, a Procuradoria da Fazenda Nacional recorreu ao pleno do TRF-2 através de Mandados de Segurança, conseguindo anular tais decisões.

Mas, a liminar para a fábrica de cigarros foi mantida pelo ministro Teori Albino Zavascki, do STJ, com o entendimento de que a decisão de vice-presidente em recurso para tribunal superior só poderia ser revista por aquele tribunal. Carreira Alvim apega-se a esta decisão para demonstrar que suas liminares têm respaldo no STJ.

Confira a relação das pessoas presas pela PF nesta sexta

Ailton Guimarães Jorge

Ana Claudia Rodrigues do Espírito Santo

Anísio Abrão Davi

Antonio Petrus Kallil

Carlos Pereira da Silva

Delmiro Martins Ferreira

Ernesto da Luz Pinto Dória

Evandro da Fonseca

Francisco Martins da Silva

Jaime Garcia Dias

João Sérgio Leal Pereira

José Eduardo Carreira Alvim

José Luiz Rebello

José Renato Granado Ferreira

José Ricardo de Figueira Regueira

Julio Guimarães Sobreira

Laurentino Freire dos Santos

Licinio Soares Bastos

Luiz Paulo Dias de Mattos

Marcos Antônio dos Santos Bretas

Paulo Roberto Ferreira Lima

Sérgio Luzio Marques de Araújo

Silvério Néri Cabral Junior

Suzi Pinheiro Dias de Mattos

Virgilio de Oliveira Medina

Notícia atualizada às 19h para acréscimo de informações.

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