Vidas arriscadas

Pesquisadora lança livro sobre jovens que trabalham no tráfico

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17 de outubro de 2006, 20h29

A Editora Vozes lançou, nesta terça-feira (17/10), a obra Vidas Arriscadas, o Cotidiano dos Jovens Trabalhadores no Tráfico, de autoria de Marisa Feffermann. A autora é doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela USP, professora da Faculdade Montessori e pesquisadora do Instituto de Saúde do Estado de São Paulo. Com 350 páginas, a obra é seminal para quem quer entender os porquês da gênese do narcotráfico.

Em entrevista à revista Consultor Jurídico, ela diz que a pesquisa que deu origem ao livro “deu prioridade à voz dos jovens, a parte perceptível do tráfico, a que exibe toda a violência incrustada em sua economia ilegal, àqueles que são um apêndice, a um tempo indispensável e descartável, nas conexões internacionais da ‘indústria’ do tráfico de drogas, uma das de maior rendimento da atualidade”.

Marisa Feffermann salienta que, “na pesquisa, foi possível destacar que os discursos dos seus representantes legais, inseridos em uma política de tornar democrático o Estado, permanecem imbuídos de arrazoado com práticas repressoras, autoritárias e muitas vezes corruptas. Quanto ao problema específico do tráfico, o discurso é de impotência, o que os imobiliza da tomada de qualquer atitude, ou têm atitudes muito autoritárias”.

De acordo com a pesquisadora, “nestes discursos vão se delineando inimigos e responsáveis pela impotência na resolução do problema. Se, por um lado, é o Estado que não oferece meios para a atuação dos seus representantes legais, por outro, reafirmam um discurso ideológico que torna culpados o indivíduo e sua família pela sua impotência, e por toda violência. Pode-se inferir que o discurso do poder é importante para mistificar o tráfico, pois quando faz isto enaltece o lugar dos policiais e das autoridades que devem enfrentar o problema”.

Quanto às relações existentes no tráfico, Marisa afirma que as regras são estabelecidas para que o comércio ilegal de drogas possa ocorrer de modo satisfatório e lucrativo.

“Os problemas relacionados com o ‘trabalho’ são resolvidos com o gerente do ponto de venda, e os casos que extrapolam esta situação são encaminhados ao dono do ponto de venda. As relações são assimétricas, o poder do dinheiro e do lugar ocupado determinam a situação, mas os elementos que garantem esta relação são, de um lado, o medo de ser morto, ou excluído da comunidade, e de outro, a necessidade de ser aceito e incluído no grupo. A lealdade e o respeito com o patrão garante que jovens pertençam a um grupo. A manutenção do poder é condição de ser respeitado, seja por medo, ou dívida de gratidão. Este poder é mantido não somente à custa de armas, mas por lealdade, confiança, que estes jovens têm para os donos de pontos de venda.”

Ela conclui que “os valores do processo de sociabilidade possuem traços idênticos aos de uma sociedade em que as relações de trabalho ocorrem como forma de exploração. Nestas relações, são identificadas regras que não disfarçam a dominação. Este sistema, inserido na lógica capitalista, se fundamenta no poder econômico. O tráfico de drogas deve ser considerado uma indústria global do mercado ilegal de drogas”.

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