Nu público e notório

Não há dano em exibir na TV foto de modelo que posou nua

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27 de junho de 2006, 16h45

Modelo que posa para revista masculina e aceita a divulgação do material não pode reclamar na Justiça da exibição das fotos em programa de TV. O entendimento é da juíza Daniela Brandão Ferreira, da 38ª Vara Cível do Rio de Janeiro. Ela livrou o SBT de pagar indenização para a ex-modelo Simone Carvalho. Cabe recurso.

Simone entrou com ação de indenização porque o programa Ratinho Livre exibiu, em 2000, fotos de artistas que posaram nuas e se tornaram evangélicas. Entre o material exibido, havia imagens de Simone Carvalho, sem que ela tivesse autorizado a divulgação.

Na Justiça, a defesa de Simone alegou que houve violação da intimidade. Pediu que a emissora lhe entregasse a fita do programa e as fotos usadas. Já o SBT sustentou que o direito à própria imagem é limitado quando se trata de personalidade pública. Também argumentou que as imagens não foram captadas sem o conhecimento de Simone.

A juíza acolheu os argumentos do SBT. “A reportagem não exibiu qualquer imagem inédita, cuja veiculação já não houvesse sido anteriormente autorizada, nem divulgou fato inverídico, já que é incontroverso que a autora era modelo, posou despida e ora abraçou religião cujos preceitos éticos são incompatíveis com sua conduta anterior e, sendo pessoa conhecida do grande público, tem a sua conversão interesse jornalístico”, afirmou.

“Não se pode atribuir à conduta da ré o efeito pretendido pela autora, eis que os fatos passados existem e em nada a desmerecem no que concerne à sua respeitabilidade, pretérita ou presente”, concluiu.

O SBT foi representado pelo advogado Marcelo Migliori, do escritório Migliori Alves Advogados.

Processo 2000.001.156618-7

Leia a íntegra da decisão

TRIGÉSIMA OITAVA VARA CÍVEL Processo n. 2000.001.156618-7 SENTENÇA Vistos, etc. SIMONE DE SOUZA CARVALHO ajuizou, pelo procedimento comum ordinário, ação em face de SISTEMA BRASILEIRO DE TELEVISÃO S/A, alegando, em resumo, que durante muitos anos exerceu a profissão de artista nos mais diversos meios de comunicação, sendo conhecida publicamente como Simone Carvalho, porém, há três anos, abandonou a vida artística e passou a se dedicar à fé que aderiu, conduzindo-se de acordo com os preceitos éticos e morais de sua religião.

Ocorre que, no dia 10/02/00, no programa ´Ratinho Livre´, o apresentador mostrou diversas fotografias suas onde aparece nua, sem que fosse autorizado, violando a sua intimidade. Diante disso, requereu a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, em valor a ser arbitrado pelo Juízo. Requereu, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela, para que lhe fosse entregue a fita de gravação do programa e as fotografias e imagens ali exibidas. Instruiu a inicial com os documentos de fls. 08/20. À fls. 21 foi deferida a gratuidade de justiça.

Citada, a ré apresentou contestação às fls. 46/66, requerendo, inicialmente a retificação do seu nome para TV SBT-CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A. Prossegue, sustentando, a aplicabilidade da Lei de Imprensa à hipótese, suscitando objeção de decadência e argüindo, preliminar de falta de pressuposto específico para a propositura da ação, qual seja, a notificação premonitória, o que fez com que a gravação não mais exista, diante da carência dos suportes materiais para conservação e tráfego de fitas.

No mérito, aduz, em síntese, que a autora não comprovou o alegado e que cedeu suas imagens à editora da revista, que detém a propriedade dos negativos. Observou que o direito à própria imagem é limitado quando se trata de personalidade pública e celebridade no desempenho da sua função, como é o caso.

Asseverou que as imagens não foram captadas sem o conhecimento da autora, que também estava ciente da possibilidade de serem reutilizadas em reedições. Por fim, esclareceu que as fotos foram usadas em reportagem jornalística, onde se fez um cotejo entre mulheres que posaram nuas e hoje estão voltadas exclusivamente às suas respectivas crenças, concluindo por requerer a extinção do processo na forma do art. 269, III, do CPC ou a extinção do processo sem análise do mérito ou, ainda, a improcedência dos pedidos. A resposta veio acompanhada dos documentos de fls. 67/119.

Réplica, às fls. 121/128. Saneador, às fls. 141/142, rejeitando a objeção de decadência e a preliminar argüida, deferindo a produção de prova documental superveniente e pericial e indeferindo a produção de prova oral. Interpostos Embargos de Declaração da referida decisão, estes foram rejeitados, consoante fls. 157. Laudo pericial às fls. 207/225, sendo oportunizada a manifestação das partes. As partes apresentaram alegações finais, sob a forma de memoriais, às fls. 239/245. Relatados, decido. Cuida-se de ação onde pretende a autora a composição de danos morais decorrentes da exibição em programa de televisão de fotografias publicadas em antiga revista masculina. Não lhe assiste razão.

Uma vez que cedeu sua imagem à publicação em revista de grande tiragem e circulação, aceitou a sua divulgação, sendo que ao ser exibida a revista em programa televisivo, o foi dentro do contexto da reportagem, relativa a personalidades que se voltaram para a religião. A reportagem não exibiu qualquer imagem inédita, cuja veiculação já não houvesse sido anteriormente autorizada, nem divulgou fato inverídico, já que é incontroverso que a autora era modelo, posou despida e ora abraçou religião cujos preceitos éticos são incompatíveis com sua conduta anterior e, sendo pessoa conhecida do grande público, tem a sua conversão interesse jornalístico.

Diante disso, tenho que não se pode atribuir à conduta da ré o efeito pretendido pela autora, eis que os fatos passados existem e em nada a desmerecem no que concerne à sua respeitabilidade, pretérita ou presente. Isto posto, julgo improcedente o pedido. Pagará a autora às despesas do procedimento e honorários advocatícios que arbitro em 10% do valor da causa, suspensa, entretanto, a sucumbência, ante o deferimento da gratuidade de justiça. P.R.I.

Rio de Janeiro, 17 de março de 2006.

Daniela Brandão Ferreira

Juíza de Direito.

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