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STJ mantém prisão preventiva de Edemar Cid Ferreira

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7 de junho de 2006, 16h30

O ex-controlador do Banco Santos, Edemar Cid Ferreira, deve continuar preso preventivamente. A decisão é do ministro Paulo Gallotti, do Superior Tribunal de Justiça.

O ministro rejeitou pedido de liminar em Habeas Corpus ajuizado pela defesa do ex-banqueiro por entender que não houve flagrante ilegalidade que justifique a concessão de liminar antes do julgamento do mérito de idêntico pedido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

Para revogar o decreto de prisão, de acordo com o ministro, há a necessidade de um exame mais apurado dos fundamentos das decisões contestadas e dos argumentos da defesa, o que não pode ser feito em sede de medida liminar. “A não ser assim, a liminar em Habeas Corpus deixará de ser exceção para constituir providência de verdadeira antecipação do julgamento de mérito que ainda não foi operado na instância anterior.”

A defesa de Edemar Cid Ferreira recorreu ao STJ contra decisão do TRF-3, que também não permitiu que o empresário respondesse à ação penal em liberdade. O réu está preso desde o último dia 26 de maio por determinação do juiz da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo. Edemar é acusado de cometer fraudes contra o sistema financeiro que levaram à intervenção do Banco Santos.

No pedido de Habeas Corpus ao STJ, os advogados do empresário alegaram que a prisão preventiva foi ilegal porque não apresentava os requisitos jurídicos que a autorizavam. “Como se disse à exaustão, o paciente (Cid Ferreira) sempre esteve à disposição da Justiça, comparecendo a todos os atos processuais para os quais foi convocado, não apresentando qualquer resistência ao cumprimento de intimações ou de qualquer forma obstruindo o bom andamento dos feitos em trâmite.”

A defesa de Edemar também alegou que o decreto de prisão tem como um dos fundamentos o teor de mensagens trocadas pelo ex-controlador do Banco com seus advogados, via e-mail. Essas mensagens, segundo os advogados, são protegidas pelo sigilo profissional e, ainda que pudessem ser utilizadas, já estão nos autos desde março de 2005, o que não justifica sua utilização agora para fundamentar o decreto de prisão.

Para a defesa, Edemar Cid Ferreira não pode ser responsabilizado pelo desaparecimento de obras de arte que não estavam alcançadas pelo seqüestro judicial.

O ex-controlador o Banco Santos está preso desde o dia 26 de maio. Ele é acusado pelo Ministério Público Federal, junto com outros 18 executivos do banco, de gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. O Banco Santos sofreu liquidação do Banco Central e teve sua falência decretada pela Justiça no ano passado.

HC 59.614

Leia a íntegra da decisão

HABEAS CORPUS Nº 59.614 – SP (2006/0110809-8)

RELATOR : MINISTRO PAULO GALLOTTI

IMPETRANTE : ARNALDO MALHEIROS FILHO E OUTROS

IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO

PACIENTE : EDEMAR CID FERREIRA (PRESO)

DECISÃO

Cuida-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de Edemar Cid Ferreira, desafiando decisão de Desembargadora do Tribunal Federal da 3ª Região que indeferiu o pedido de liminar em writ ali deduzido.

Colhe-se dos autos que o paciente, ex-controlador do Banco Santos S/A, teve a prisão preventiva decretada em procedimento criminal de seqüestro e busca e apreensão associado à ação penal em que é acusado da prática de crimes contra o sistema financeiro, contra a ordem econômica, de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Busca a impetração, inclusive liminarmente, a revogação da custódia, sustentando que não estão presentes os requisitos que a autorizam, enfatizando que “o paciente sempre se apresentou espontaneamente ao Juízo de primeiro grau, foi por ele devidamente interrogado, sendo que a ação penal em questão encontra-se atualmente em fase de instrução, em que são ouvidas as testemunhas de defesa”.

Afirma que a decisão do magistrado tem como um dos fundamentos o teor de mensagens trocadas pelo paciente com seus advogados, via e-mail, que estariam protegidas pelo sigilo profissional, sublinhando, ainda, que o respectivo conteúdo se encontra nos autos desde março de 2005, não se revelando possível, agora, ser utilizado para justificar a segregação.

Destaca, também, que a custódia antecipada não pode ser imposta com o objetivo de evitar a dissipação de bens que seriam produtos de crime, não devendo ser o paciente responsabilizado pelo desaparecimento de obras de arte que não estavam alcançadas pelo seqüestro judicial.

Não há como dar seguimento ao pedido.

O Superior Tribunal de Justiça tem compreensão assentada no sentido de não caber habeas corpus contra decisão que denega medida liminar, a não ser que reste demonstrada flagrante ilegalidade, o que não ocorre na espécie, bastando ver o teor do ato atacado:


“Trata-se de habeas corpus , com pedido de liminar, impetrado pelos advogados Arnaldo Malheiros Filho, Ricardo Tepedino, Flávia Rahal e Daniella Meggiolaro, em favor de Edemar Cid Ferreira, objetivando a concessão de ordem para cassar a prisão preventiva decretada pelo Juízo Federal da 6ª Vara Criminal de São Paulo/SP, nos autos do Procedimento Criminal de Seqüestro, Busca e Apreensão, registrado sob o nº 2005.61.81.900396-6, a partir de requerimento do Ministério Público Federal.

Consoante extraído da inicial (fls. 2/39) e documentos que a acompanham (40/417), o paciente, ex-controlador do Banco Santos S/A, responde, perante à 6ª Vara Federal Criminal/SP, à ação movida pelo Ministério Público Federal (Proc. nº 2004.61.81.008954-9), imputando-lhe, em concurso com outros acusados, a prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei nº 7.492/86) e de Lavagem de Valores (Lei nº 9.613/98), que teriam dado causa à intervenção do Banco Central do Brasil – BACEN naquela instituição financeira, a qual já teve a falência decretada, em 20/9/2005.

Dentre outros fatos ilícitos descritos nos tipos penais dos artigos 4º, caput (gestão fraudulenta de instituição financeira), e 22, parágrafo único, última figura (manutenção de depósitos, em bancos estrangeiros, sem declaração à Receita Federal), ambos da Lei nº 7.492/86, e do artigo 288 do CP (quadrilha ou bando), a denúncia imputa ao ora paciente, a formação de seu patrimônio com o produto de sua conduta ilícita à frente do Banco Santos S/A (artigo 1º, VI e VII, da Lei nº 9.613/98, c.c. o parágrafo 4º do mesmo dispositivo, e a Lei nº 9.034/95), pois pré-ajustado e com unidade de desígnios com outros acusados, teria dissimulado a origem e a propriedade de valores oriundos de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, utilizando-se, entre outros mecanismos, da conversão de parte desses valores supostamente em ativos ilícitos, como imóveis e obras de arte.

Dando origem ao citado Procedimento reg. nº 2005.61.81.900396-6, distribuído ao Juízo da 6ª Vara Federal Criminal, por dependência à Ação Penal reg. nº 2004.61.81.008954-9, com base nas peças informativas (PI) nºs 1.34.001.006667/2004-12, 1.34.001.000442/2005-25 e 1.34.000733/2005-13, que lhe foram encaminhadas pelo Banco Central do Brasil – BACEN, o Ministério Público Federal requereu, ao Juízo da causa, o seqüestro de bens do acusado, ora paciente, a busca e apreensão de documentos ou outros objetos que guardassem relação com a eventual prática de delitos previstos na Lei nºs 7.492/86 e 9.613/98, restando determinado, em 18/2/2005 e 15/7/2005, pela autoridade judicial, dentre outras medidas, o seqüestro dos seguintes bens:

a) imóvel situado à rua Gália, nº 120, Morumbi;

b) obras de arte e objetos de decoração encontrados no referido imóvel;

c) obras de arte e objetos de decoração existentes na sede do Banco Santos S/A; e

d) obras de arte localizadas no imóvel situado à Rua Merghentaler, nº 900 – oportunidade em que Edemar Cid Ferreira foi nomeado depositário judicial dos aludidos bens, à exceção, num primeiro momento, dos referentes aos localizados na sede da instituição financeira, que ficaram sob o encargo do respectivo interventor.

Na seqüência, seguiram-se decisões tendentes à preservação das aludidas obras de arte, culminando, ao que consta, em 4/11/2005, com a destituição do paciente da função de depositário judicial, ao fundamento de rompimento do encargo e conseqüente quebra de confiança em relação ao Juízo, por ações ou omissões de Edemar Cid Ferreira, que teriam colocado em risco a integridade do acervo, parte deste, posteriormente, destinada, pelo Juízo, em caráter provisório, à guarda em Museus e Instituições públicos, na cidade de São Paulo (Museu Paulista/USP, Museu de Arte de Contemporânea – MAC /USP, Museu de Arte Sacra, Fundação Memorial da América Latina, Centro Cultural da Marinha em São Paulo, Instituto de Estudos Brasileiros – IEB/USP e Museu de Arqueologia e Etnologia – MAE/USP, este, com a guarda definitiva dos bens tidos arqueológicos tidos de propriedade da União).

Informam, os impetrantes, ter o paciente resignado-se, só tendo se insurgido, através do remédio adequado, contra a remoção de 3 (três) peças marajoaras que entendia não serem, de modo algum, pertencentes à União.

Inferindo que tal irresignação não foi encarada com a serenidade ínsita a todos os magistrados, aduziu que:

‘Surpreendentemente, a reação do magistrado foi célere, áspera e apaixonada. Ex officio , sobreveio a decisão de destituir o paciente da condição de depositário fiel do imóvel e dos bens que o guarnecem, expulsando a ele e a sua família daquela residência (doc. nº 4).

Contra a ilegalidade, foi impetrado a esse e. Tribunal novo mandado de segurança (nº 2005.03.00.098444-5), tendo sido suspensa por decisão do Superior Tribunal de Justiça em medida cautelar.’


Da documentação acostada, aflora que em 21/11/2005, 1/12/2005 e 6/02/2006, foram determinadas, pelo Juízo, em decisões fundamentadas no artigo 4º da Lei nº 9.613/98 (Lavagem de Valores), e na esteira do estabelecido na Convenção de Palermo das Nações Unidas sobre o Crime Organizado Transnacional (Decreto nº 5.015/2004 e Decreto Legislativo nº 231/2003), medidas assecuratórias de extensão dos seqüestros efetivados, com a constrição dos bens ao Juízo, preservados no distrito de culpa e, na medida do possível, em unidade de acervo, visando garantir futura restituição à União, na hipótese de eventual condenação (artigo 91, II, ‘b’, do CP), incluindo-se, entre outros, o imóvel ocupado pelo paciente, situado à Rua Gália, nº 120, tido por obra de arte arquitetônica e concebido em processo de musealização, bem assim às peças artísticas nele existentes, a serem entregues, em depósito judicial, à Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo.

Revela notar que a decisão proferida em 06/02/2006 decorreu de requerimento formulado pelo Ministério Público Federal, nos autos da multicitada Ação Penal reg. nº 2005.61.81.900396-6, no sentido de extensão da medida cautelar de seqüestro, às obras que, de acordo com banco de dados contendo o acervo da Cid Ferreira Collection Empreendimentos S/A, não se encontravam entre as relacionadas nos laudos periciais.

Em provimento de 11/4/2006, o Juízo da 6º Vara Federal Criminal, com base em confronto realizado entre o Livro Tombo da ‘Cid Collection’ apreendido, as informações dos museus consultados e o Laudo Pericial das obras de arte existentes na Rua Gália, nº 120, concluiu pelo desaparecimento de obras de elevado valor, determinando, dentre outras medidas, a intimação do ora paciente, para apresentar, em 15 (quinze) dias, as obras desaparecidas, ou informar sobre as tratativas para sua internação imediata, bem assim seu paradeiro e descrição completa (doc. nº 5, da inicial).

Segundo narram os impetrantes, em 2/5/2006 as manifestações foram apresentadas (doc. nº 6, da exordial), tendo o paciente questionado o aperfeiçoamento do depósito judicial a que se comprometera em relação ao imóvel que abrigava a maior parte de sua coleção de obras de arte, posto que permanecera lacrado por determinação do Juiz impetrado, que ficou em poder das chaves e cedeu-as a diversas pessoas estranhas à relação processual, entre as quais peritos e museólogos.

Nesse quadro, o Ministério Público Federal, requereu a prisão preventiva do ora paciente, cujos fundamentos, por não ter sido apresentada cópia da respectiva peça, pelos impetrantes, a teor da decisão atacada, assim se resumem (fls. 41/42):

‘Trata-se de representação de prisão preventiva do acusado Edemar Cid Ferreira da lavra do Ministério Público Federal, com fulcro nos artigos 311, 312, primeira e segunda figuras, ambos do Código de Processo Penal, e no artigo 30 da Lei nº 7.492, de 16.06.1986, alegando, em suma, que as obras de arte relacionadas à fi. 2682 da petição juntada pela defesa de Edemar Cid Ferreira constam no Banco de Dados da Cid Collection como tendo sido ‘adquiridas’ e não na condição de ‘doadas’, ’emprestadas’, ’em consignação’ ou qualquer outro estado similar.

A condição registrada no aludido banco de dados é comprovada pelo preço, número de invoices e outros documentos, bem como a indicação da procedência. Salientou que, com exceção de uma pintura de Adriana Varejão, as outras obras constam como localizadas, na ocasião do registro, no imóvel da Rua Gália, nº 120, sendo certo que, em pelo menos três delas, nas datas de aquisição registradas, os valores pagos aos vendedores teriam sido debitados da conta da Alsace Lorraine junto ao Bank of Europe. Em razão disso, conclui que ‘não apenas as obras pertenciam a Edemar Cid Ferreira, como estavam em sua residência e foram pagas pelo correspondente clandestino do Banco Santos S.A no exterior’.

O órgão ministerial aduziu, ainda, que as indigitadas obras de arte, de altíssimo valor, desaparecidas são produto de crime e não pertenceriam a patrimônio licitamente adquirido pelo acusado, razão pela qual reputa estar ele tripudiando sobre o Sistema Judiciário ao afirmar que estava livre para delas dispor como bem entendesse, tendo inclusive, assim agido.

Por tais fundamentos, entende o parquet que a ordem pública, associada à credibilidade que o Poder Judiciário desfruta perante a sociedade, restou seriamente afetada pelas condutas do increpado, mormente considerando-se que os desvios foram da ordem de centenas de milhões de dólares, com lesão a milhares de investidores, centenas de funcionários perderam seus empregos e centenas de milhões de reais em dinheiro público destinados ao desenvolvimento social foram indevidamente utilizados.

Finalmente, salientou que as autoridades não podem se calar, tal qual teria se dado com as autoridades de Antigua relativamente às informações sobre o Bank of Europe, conforme se pôde inferir dos e-mails apreendidos nos autos. A documentação encaminhada pelo DRCI permitiria, ainda, supor a existência de ‘alguma espécie de acordo entabulado pelas partes’ em prejuízo à instrução da Ação Penal, isto diante da interrupção dos contatos daquelas autoridades com aquele órgão (fls. 2907/2909).’


Acatando o pedido ministerial, no bojo de decisão de 35 (trinta e cinco) laudas, em que restou decretada a prisão preventiva do paciente, o Juízo impetrado narra fatos e avalia documentos, manifestações e circunstâncias, atinentes à medida requerida.

São apontados com destaque, a existência de diversos e-mails , objeto de apreensão, trocados pelo paciente, advogados e outras pessoas de alguma forma ao primeiro ligadas, tendentes, no sentir do magistrado, à obstrução da Justiça.

Assim, mencionando ter tomado conhecimento dos fatos apenas recentemente (12/05/2006), assevera, no específico, a autoridade impetrada:

‘(…) Dentro desse espírito, cabe aduzir que somente pode haver apreensão de documentos e objetos no escritório de advocacia ou de conversas entre o defensor e réu (conforme consta, em parte, dos autos principais), na esteira do estatuto da OAB (artigo 7º, II) quando constituírem corpo de delito ou quando houver suspeita de que o defensor participa do delito.

Note-se que corpo de delito não significa objeto material do crime, mas tudo o que puder servir de elemento de prova. (…) Ora, os e-mails citados revelam, no mínimo, intensa tratativa com autoridades de Antigua, visando subtrair das autoridades brasileiras informações solicitadas pelo próprio acusado, tumultuando sensivelmente o percurso normal da Demanda Principal, fato que mereceria uma apuração mais detida, merecedor, aliás, de atenção do CFATF (Caribbean Financial Action Task Force).’

De outra parte, em seus fundamentos, a autoridade acoimada coatora remarca que a recusa do acusado em informar o paradeiro de obras de arte seqüestradas ‘há de ser tida como mais uma tentativa de obstaculizar os trabalhos da Justiça’, não podendo ser interpretada, segundo o magistrado, como aplicação do princípio da presunção da inocência ou do direito ao silêncio, ‘porquanto a informação pretendida não diz respeito ao mérito da causa, mas sim com o dever de fornecer os elementos necessários para a concretização de medida judicial, evitando atuação tumultuária de toda ordem, com prejuízo à União’.

À guisa de arremate, quanto à necessidade da segregação cautelar do paciente, assim justificou a adoção da medida extrema:

‘Por tudo isso, conclui-se que a prisão preventiva de Edemar Cid Ferreira afigura-se, pois, necessária, porquanto a análise valorativa dos elementos fáticos existentes nos autos da Ação Penal nº 2004.61.81.008954-9 e neste Procedimento Criminal Diverso de Seqüestro e Busca e Apreensão nº 2004.61.81.008954-9, permitem a aferição da presença dos requisitos do fumus boni juris e do periculum in mora, circunstância que impõe, excepcionalmente, a restrição à liberdade do acusado e assim o faço pelos fundamentos a seguir elencados:

A garantia da ordem pública, in casu, não há de se ser entendida tão somente como forma de evitar a perpetração de outros delitos, mas como forma de resguardar a credibilidade e respeitabilidade das instituições públicas, que se vêem seriamente ameaçadas pela atuação do acusado que, como se observou, tentou, independentemente do mérito da ação penal:

a) influir no conceito social ao difundir informações sigilosas que atendam a sua defesa, na eventual tentativa de suprimir o desvalor de suposta conduta ilícita;

b) dirigir Solicitação de Assistência Judiciária em Matéria Penal sabidamente a autoridade não competente para tal;

c) constar endereço inexistente de testemunha por ele arrolada, quando nos autos já se sabia residir em país diverso;

d) atribuir ao Juízo divulgação indevida quando há nos autos farta documentação, e-mails trocados entre diversas pessoas, parte advogados, reveladora de que, de fato, tem interesse na divulgação;

e) tentativa de obstrução da apuração da Justiça brasileira a pretexto de influir nas autoridades de Antigua;

f) atribuir o desaparecimento das obras a ‘estranhos’, que admite serem técnicos ou museólogos, Oficiais de Justiça, e, eventualmente, demais pessoas, sem qualquer fundamento para tal;

g) não apresentar, não revelar e fornecer elementos que possam concretizar medida judicial de seqüestro, obrigando o Juízo a acionar autoridades estrangeiras (nem mesmo das obras de arte que ele próprio revelou possuir em seu interrogatório, confirmada pela sua própria testemunha Emílio Richa Bechara Kalil), com alto

custo financeiro; e

h) ocultar dos Oficiais de Justiça e da perícia diversas obras por ocasião da medida de seqüestro de bens, apresentando, parte, nesta oportunidade e sonegando, outra parte, informação notadamente das mais valiosas’.

Alfim, a autoridade assevera estar evidenciada a obstrução sistemática da Justiça Federal Penal, de molde a exigir resposta séria a evitar a sua continuidade, expressando-se, conclusivamente, nos seguintes termos:


‘O juízo de valor sobre a conduta do acusado esteve, como se viu, vinculado aos fatos concretos acima deduzidos e que impõe, neste momento, sua constrição cautelar. Com fundamento nos artigos 311 e 312, ambos do Código de Processo Penal, para garantia da ordem pública, ou seja, evitar que pratique novos crimes, assegurar a credibilidade e respeitabilidade das instituições públicas, que restaram seriamente abaladas em face das condutas do increpado, e a segurança da atividade jurisdicional, a salvo de intimidações de qualquer natureza e manobras que gerem atraso e custo financeiro desnecessários à ação penal, e para a aplicação da lei penal, isto é, efetividade do seqüestro das obras desaparecidas e não apresentadas, notadamente da incidência da legislação criminal que prevê a perda de bens seqüestrados no caso de condenação, artigo 2º, II, ‘b’, c.c. o artigo 7º, I, da Lei nº 9.613, de 03.03.1998, que textualmente prevê a ‘perda, em favor da União…’, decreto a prisão preventiva de Edemar Cid Ferreira.’

Apontam, os impetrantes, que o decreto de prisão preventiva constitui enorme agressão ao direito de defesa, denotando ‘que o paciente foi preso porque, no curso de ação penal, ousou se defender, ou apresentou defesas contraditórias, ou defesas deficientes, ou se recusou ‘a cooperar com a Justiça’, no sentido de facilitar sua condenação e a perda de alguns de seus bens’, sustentando, outrossim, não ter sido apontado ‘qualquer ato seu, a atitude ou o comportamento que pudesse comprometer algum dos bens tutelados pelo art. 312 do CPP’, refutando os motivos apresentados como justificadores do encarceramento cautelar, tido por ilegal.

Remarcaram, também, que as condutas atribuídas ao paciente remontam a momento anterior à instauração da ação penal e todas de há muito conhecidas pelo impetrado, e que não existe conduta superveniente praticada de fato, pelo paciente, a justificar a constrição de sua liberdade.

Asseveraram o descabimento da prisão preventiva, apontando o envolvimento emocional do impetrado com os feitos relacionados à intervenção do Banco Santos S/A, que o impedem de julgar com a necessária imparcialidade o paciente, situação objeto de exceção de suspeição oposta em 09/01/2006 (doc. nº 12, da inicial).

Apoiados em respeitáveis ensinamentos doutrinários e seleta jurisprudência, sustentaram que: a) fatos pretéritos não podem ensejar a decretação de prisão preventiva; b) a proibição de decretação de prisão com base em prova ilícita c) o paciente não pode ser responsabilizado por atos de seus defensores; d) a inexistência de atentado à aplicação da lei penal; e e) a ausência de atentado à ordem pública.

Pontuaram ser o paciente primário e possuidor de bons antecedentes, submetendo-se à ação penal sem causar qualquer tumulto, não raro antecipando-se às determinações judiciais, na medida em que o permite a defesa de seus direitos, encontrando-se, agora, submetido à medida extrema e grave, de conseqüências irreparáveis, consistente em seu encarceramento.

Entendendo demonstrada, com documentação à farta nos próprios autos, a desnecessidade, inviabilidade e a injustiça do constrangimento ilegal imposto ao paciente, realçando a ausência, na espécie, de qualquer dos requisitos autorizadores da prisão preventiva, requereram, ante a demonstração do fumus boni juris e do periculum in mora, a concessão de liminar para o fim único de aguardar o paciente em liberdade o julgamento deste pedido, mediante a pronta expedição de alvará de soltura.

Nesta apropriação perfunctória, a exposição efetuada denota que o pleito apresentado não comporta, por ora, acolhimento, ante a ausência de fumus boni juris a ensejar a concessão da liminar, em face da prevalência das razões constantes da decisão atacada, que decretou a prisão preventiva do paciente requerida pelo Ministério Público Federal.

Com efeito, nessa apreciação, há que se ter em conta as dificuldades da instrução e persecução criminal dos delitos de natureza e características tais como a dos imputados ao paciente, os quais não raro, incrementam a lista da impunidade, com repercussão negativa na credibilidade das instituições públicas envolvidas na atividade de efetivação da justiça, pacificação e segurança sociais.

Não é sem razão a especialização de Varas Criminais em delitos como de Lavagem de Dinheiro, com aperfeiçoamento dos operadores jurídicos que nelas atuam, impondo-se maior participação do Juiz na busca da verdade real, bem como na interação e cooperação com diversos órgãos também especializados, ou não.

Nesse sentido, com os olhos na realidade, tem-se por suficientemente lançadas as razões que fundamentaram a prisão processual, posto que vislumbrada a sua necessidade para garantir a ordem pública e a aplicação da lei penal, amoldadas concretamente às hipóteses previstas nos artigos 311 e 312, do CPP.


Há que se remarcar que, como assaz assinalado, objetiva-se evitar a dissipação dos bens produtos de crime, no transcurso da ação penal, frustrando, em caso de condenação, a eficácia de futura decisão, especialmente quanto à perda em favor da União, do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente, com a prática do fato criminoso (artigo 91, II, ‘b’, do CP).

No que pertine aos contornos da garantia da ordem pública, confira-se o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, no seguinte trecho da ementa integrante da decisão aqui arrostada:

‘(…) O plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC nº 80.717, fixou a tese de que o sério agravo à credibilidade das instituições públicas pode servir de fundamento idôneo para fins de decretação de prisão cautelar, considerando, sobretudo, a repercussão do caso concreto na ordem pública.

O poder econômico do réu, por si só, não serve para justificar a segregação cautelar, até mesmo para não se conferir tratamento penal diferenciado, no ponto, às pessoas humildes em relação às mais abastadas (caput do art. 52 da CF). Hipótese, contudo, que não se confunde com os casos em que se comprova a intenção do acusado de fazer uso de suas posses para quebrantar a ordem pública, comprometer a eficácia do processo, dificultar a instrução criminal ou voltar a delinqüir.

No caso, não se está diante de prisão derivada da privilegiada situação econômica do acusado. Trata-se, tão-somente, de impor a segregação ante o fundado receio de que o referido poder econômico se transforme em um poderoso meio de prossecução de práticas ilícitas. (…)’ – (Questão de Ordem no HC nº 85.298/SP, STF, 1ª Turma, Relator Min. Marco Aurélio, Relator para Acórdão Min. Carlos Britto, DJU de 04/11/2005, pg. 26)

Por seu turno, não se avista também na preventiva decretada, ofensa ao princípio da presunção de inocência, sendo que, presentes os requisitos legais autorizadores, o fato de o paciente/acusado, ter residência fixa, ser primário, possuir bons antecedentes e mostrar-se assíduo no comparecimento aos atos processuais para os quais é intimado, não tem, por si só, o condão de afastar a incidência da prisão cautelar, especialmente quando possa manipular outros meios ou artifícios inidôneos, eficazes ao embaraçamento ou obstrução da instrução criminal tempestivamente útil à efetiva pretensão punitiva do Estado.

Ante o exposto, à míngua dos requisitos autorizadores, indefiro a ordem liminar vindicada. “ (fls. 540/550) Como se vê do inteiro teor da decisão da Desembargadora Federal Anna Maria Pimentel, que transcreve os principais trechos do longo despacho do Juiz Federal Fausto Martin de Sanctis, fls. 159/195, não há como afirmar, nesta sede, que a prisão do paciente se reveste de manifesta ilegalidade.

Aliás, a também longa petição inicial, elaborada com a habitual maestria, procura espancar, um a um, os fundamentos invocados para determinar a prisão antecipada, concluindo que não está presente nenhum dos motivos que justificam a adoção da medida extrema.

Ora, esse desenrolar de idéias e argumentos é próprio da pretensão de mérito, não se mostrando razoável que, no juízo de liminar, tenha o magistrado que ir além da constatação do evidente constrangimento ilegal, este a saltar aos olhos, prescindindo de uma verificação maior dos elementos de convicção trazidos aos autos.

A não ser assim, a liminar em habeas corpus deixará de ser exceção para constituir providência de verdadeira antecipação do julgamento de mérito que ainda não foi operado na instância anterior.

No caso, repita-se, pretende-se que se reconheça desde já a ilegalidade da constrição, que não tenho como evidente, demandando um exame mais detido dos fundamentos das decisões impugnadas e dos argumentos da defesa.

Confira-se precedente desta Corte:

“PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ART. 157, § 2º, INCISO I E II, § 3º, IN FINE, C.C ART. 14, II, DO CP. PRISÃO EM FLAGRANTE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. DENEGAÇÃO DE LIMINAR.

Em princípio, ressalvando manifesta ilegalidade, descabe o uso de habeas corpus para cassar indeferimento de liminar (Precedentes do Pretório Excelso e do STJ).

Habeas corpus não conhecido.”

(HC nº 55.134/PR, Relator o Ministro FELIX FISCHER , DJU de 22/5/2006) Do Supremo Tribunal Federal, que inclusive sumulou a matéria:

“CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS : LIMINAR INDEFERIDA PELO RELATOR, NO STJ. SÚMULA 691- STF.

I – Liminar indeferida pelo Relator, no STJ. A Súmula 691- STF, que não admite habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em HC requerido a Tribunal Superior, indefere liminar, admite, entretanto, abrandamento: diante de flagrante violação à liberdade de locomoção, inocorrente no caso.

II – Negativa de seguimento ao pedido de habeas corpus . Agravo regimental não provido.” (AgRg no HC nº 87.016/RJ, Relator o Ministro CARLOS VELLOSO , DJU de 24/2/2006)

Ante o exposto, sendo manifesta a inviabilidade do writ, com base no artigo 210 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, indefiro liminarmente o pedido.

Publique-se.

Brasília (DF), 06 de junho de 2006.

MINISTRO PAULO GALLOTTI, Relator

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