Roleta da liberdade

Ministro do STJ decide para evitar divergência no STF

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13 de janeiro de 2006, 18h18

Em casos de crime hediondo é preferível dar a progressão de regime do que colocar o réu à mercê de um sorteio no Supremo Tribunal Federal. Como a corte não tem um entendimento consolidado sobre o tema, o condenado dependerá da posição do ministro sorteado para obter ou não a liminar. O entendimento é do ministro do Superior Tribunal de Justiça Paulo Gallotti.

Segundo Gallotti, se o Habeas Corpus for julgado pelos ministros Sepúlveda Pertence, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Eros Grau, Carlos Britto ou Marco Aurélio, a progressão de regime será dada. No entanto, se julgado pelos outros quatro ministros, Carlos Velloso, Celso de Mello, Ellen Gracie ou Joaquim Barbosa, o benefício será negado. “Essa constatação, penso, leva à conclusão de não ser razoável que as coisas assim se passem, principalmente em se cuidando de liberdade”.

A matéria ainda não foi decidida por conta do pedido de vista da ministra Ellen Gracie, que suspendeu o desfecho da decisão há cerca de seis meses.

Segundo o ministro, já que o STF reabriu a discussão acerca da constitucionalidade do artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 8.072/90, sobre crimes hediondos, no HC 82.959, cabe dar a liminar ao condenado até o julgamento do mérito desse Habeas Corpus onde será firmado um entendimento sobre o assunto.

Com esse argumento Gallotti decidiu aceitar o pedido de liminar em Habeas Corpus para Marcelo Pereira Passos condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a 18 anos de prisão em regime fechado.

Passos e mais uma pessoa foram condenados em primeiro grau, a 22 anos de prisão em regime fechado por roubo com violência e latrocínio. Os advogados de defesa de Passos, Julliano Spaziani da Silva e Vagner da Costa, apelaram ao Tribunal de Justiça de São Paulo que absolveu os réus pela receptação e confirmou a condenação por latrocínio e roubo diminuindo a pena para 18 anos de prisão em regime fechado.

A defesa entrou com Habeas Corpus no TJ-SP pedindo a progressão de regime, o qual não foi conhecido. Então, apelou para o STJ onde ganhou o benefício.

Leia a íntegra do habeas Corpus:

HABEAS CORPUS Nº 43.438 – SP (2005/0064590-7)

RELATOR : MINISTRO PAULO GALLOTTI

IMPETRANTE : VAGNER DA COSTA

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE : MARCELO PEREIRA PASSOS (PRESO)

DECISÃO

Cuida-se de habeas corpus impetrado em favor de Marcelo Pereira Passos, apontando-se como autoridade coatora o Tribunal de Justiça de São Paulo.

Colhe-se do processado que o paciente foi condenado, em primeiro

grau, juntamente com outra pessoa, a 22 anos, 1 mês e 26 dias de reclusão, e multa, por infração aos artigos 157, § 2º, incisos I e II, e 157, § 3º, c/c o 14, inciso II, na forma do artigo 70; artigos 157, § 2º, incisos I, II e V, e 180, “caput”, na forma do artigo 69, todos do Código Penal, determinando-se que a pena pelo delito de latrocínio deveria ser cumprida integralmente no regime fechado.

Inconformada, a defesa apelou, tendo o Tribunal dado parcial provimento ao recurso para absolver os réus pela receptação, com base no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal, confirmando a condenação por latrocínio em concurso formal com o primeiro roubo e reconhecendo a continuidade delitiva entre estes e o segundo roubo, estipulada a pena total em 18 anos, 1 mês e 23 dias de reclusão, a ser descontada integralmente no regime fechado.

Atacando a imposição do regime prisional, manejou-se habeas corpus junto ao Tribunal local, que não foi conhecido.

Daí a impetração, na qual se pretende garantir ao paciente o direito à progressão de regime, afirmando-se que a determinação de cumprimento integral em regime fechado das penas por condenação pela prática de crimes hediondos fere o Pacto de São José da Costa Rica.

Dispensadas as informações, o Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem. Muito embora venha proferindo decisões denegando os pedidos de habeas corpus em que se postula, exclusivamente, reconhecer o direito à progressão de regime aos condenados pela prática de delitos hediondos com base no entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal dizendo da constitucionalidade do dispositivo que a veda, tenho que deva rever essa compreensão.

Isto porque, recentemente, vários Ministros da Corte Suprema vêm concedendo medidas liminares para assegurar o direito à progressão de regime àqueles que cumprem pena pela prática de delitos considerados hediondos, determinando-se, ainda, o sobrestamento dos respectivos feitos até o julgamento final, naquela Corte, do HC nº 82.959, no qual se reabriu a discussão acerca da constitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90 (MC no HC nº 85.808/DF, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJU de 4/5/2005; HC nº 84.770/SP, Relator o Ministro Cezar Peluso, DJU de 12/4/2005; MC no HC nº 85.677/SP, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJU de 4/4/2005; MC no HC nº 85.589/DF, Relator o Ministro Eros Grau, DJU de 15/3/2005; MC no HC nº 85.440/SP, Relator o Ministro Carlos Britto, DJU de 16/2/2005; HC nº 85.465/MG, Relator o Ministro Marco Aurélio, DJU de 15/2/2005).

É verdade que outra parte dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, na linha do entendimento de que os crimes hediondos não permitem a progressão de regime, continuam negando pedidos semelhantes levados à sua apreciação (MC no HC nº 85.700/DF, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJU de 13/4/2005; MC no HC nº 85.692/RJ, Relator o Ministro Celso de Mello, DJU de 5/4/2005; HC nº 85.640/DF, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJU de 22/3/2005; MC no HC nº 85.596/RS, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJU de 18/3/2005).

Frente a esse quadro, levando em conta que cabe ao Supremo Tribunal Federal a última palavra em habeas corpus denegado no Superior Tribunal de Justiça, não tenho como razoável admitir que os pacientes condenados pela prática de crimes hediondos, diante de decisões desta Corte recusando a progressão de regime prisional, sejam obrigados a bater às portas da Corte Suprema, e lá participar de um sorteio sobre o reconhecimento de um direito.

Sim, porque, como visto, se o writ que lá se impetrar for distribuído a um daqueles primeiros seis Ministros, a ordem será concedida liminarmente e sobrestado o andamento da ação.

Se distribuído a um dos outros quatro, serão negadas a cautelar e o próprio habeas corpus. Essa constatação, penso, leva à conclusão de não ser razoável que as coisas assim se passem, principalmente em se cuidando de liberdade.

Sendo da alçada do Supremo Tribunal Federal dar a última palavra sobre a constitucionalidade de ato normativo e estando o tema relativo ao artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/1990 em exame no HC nº 82.959, no qual, dos seis votos proferidos, quatro reconhecem o direito à progressão, não tenho como adequado que se possa continuar denegando a ordem postulada nesses pedidos.

Assim, estando o feito pronto para o exame de mérito, tenho por bem conceder liminar de ofício para, afastado o óbice, reconhecer o direito do paciente à progressão de regime, com a verificação, no Juízo de origem ou no da Execução, da presença dos requisitos objetivos e subjetivos exigidos pela legislação de regência.

Dê-se ciência ao Tribunal de Justiça de São Paulo e ao Juízo de Direito da 3ª Vara da Comarca de Suzano, naquele Estado. Após, devem os autos, sobrestados, aguardar o desfecho do julgamento, no Supremo Tribunal Federal, do mencionado HC nº 82.959.

Publique-se.

Brasília (DF), 27 de junho de 2005.

MINISTRO PAULO GALLOTTI, Relator

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