Matemática mágica

Juiz gaúcho proíbe “cobrança por dentro” de ICMS na conta de luz

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30 de dezembro de 2005, 6h00

Pela lei da matemática, 25% de R$ 100 é R$ 25, certo? Pela Constituição, não. Ao ser calculado o ICMS na conta de luz, 25% de R$ 100 vira R$ 33. Isso porque o valor do tributo é adicionado na base de cálculo para que seja calculado o valor a ser pago de ICMS. É a chamada “cobrança por dentro”: os 25% são cobrados em cima de R$ 125. A partir do dia 20 de dezembro, esta cobrança está proibida no estado no Rio Grande do Sul.

A decisão foi tomada pelo juiz Vanderlei Deolindo, da 2ª Vara Cível de Santa Maria (RS). Em sua sentença, ele usa da lógica matemática para demonstrar a ilegalidade da cobrança. “Não se pode, por meio de interpretações nebulosas, procurar justificar que 25% sobre R$ 100 não é R$ 25 e sim R$ 33. Constitui-se uma afronta à matemática, ciência exata que não permite esse tipo de raciocínio.”

Quem faz essa “afronta à matemática” é a própria Constituição Federal. “Cabe à lei complementar fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço”, afirma o artigo 155, parágrafo 2º, inciso XII, alínea i.

Para Deolindo, mesmo que a própria CF permita a “cobrança por dentro” e o entendimento sobre a sua legalidade venha sendo pacificado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e pelo Supremo Tribunal Federal, a cobrança é uma “afronta ao Direito do Consumidor”. O juiz entendeu que o dispositivo da Constituição, que foi inserido pela Emenda Constitucional 33 de 2001, permitiu que “o legislador majorasse as alíquotas do ICMS, sendo que as alíquotas máximas deste tributo devem ser fixadas por resolução do Senado”.

“A sistemática do cálculo pertinente à base de cálculo do ICMS confere a este tributo o ‘efeito cascata’, ferindo o princípio da não-cumulatividade, tornando-o inconstitucional”, escreveu Deolindo.

Vários estados adotam o “cálculo por dentro” na cobrança do ICMS e a questão tem sido levada aos tribunais com freqüência e com freqüência tem sido favorável à formula. Com isso, ganham os fiscos estaduais e perdem os contribuintes, que pagam na verdade uma alíquota real maior do que a nominal. Há dois anos, a ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça, lembrou que o Supremo Tribunal Federal consolidou, definitivamente, sua jurisprudência sobre o tema decidindo pela constitucionalidade do cálculo por dentro na apuração do ICMS

Trâmite

A Ação Civil Pública foi impetrada pela Associação de Proteção e Defesa do Consumidor de Santa Maria, representada pelo advogado Itaúba Siqueira de Souza Junior, contra a distribuidora de energia elétrica do Rio Grande do Sul, AES Sul. O Ministério Público opinou pela inclusão no estado gaúcho no pólo passivo da ação, o que foi solicitado pela associação.

A liminar requerida para suspender a cobrança foi negada em primeira e segunda instâncias. Na decisão do juiz Deolindo, ele acatou os argumentos da AES Sul de que ela apenas recolhia o imposto e repassava para o governo estadual. Quem figura como ré na ação, então, é o governo gaúcho.

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