Reparo geral

Segurado que teve carro depenado processa seguradora e oficina

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20 de novembro de 2004, 15h30

André Skowronski, cliente da Porto Seguro, entrou com ação na Justiça paulista contra a seguradora e a concessionária Chevrolet Rumo Norte, no fórum João Mendes. O segurado levou seu carro para a concessionária para reparos depois de um acidente. Quando voltou para buscá-lo, constatou que seu veículo foi “depenado”. Diversas peças que não foram danificadas com a colisão, como direção hidráulica, rádio e ar-condicionado, por exemplo, não estavam mais no veículo.

A defesa do segurado, representada pelo advogado Remo Higashi Battaglia entrou com ação de rito ordinário por inexecução contratual, também com pedido de indenização por danos morais. Segundo ele, nem a Porto Seguro, nem a Rumo Norte deram qualquer explicação sobre o ocorrido, “submetendo o autor a aborrecimentos e perda de tempo na tentativa de reclamar extrajudicialmente a responsabilidade das mesmas pela guarda do veículo”.

De acordo com o advogado, na ocasião foi feito boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia. Também foi apresentada representação perante o Ministério Público Estadual, “a fim de apurar eventual prática de crime, dada a gravidade dos fatos”. Battaglia alegou, ainda, que apesar das reclamações e solicitações, seu cliente não foi atendido pela seguradora e pela concessionária.

Diante dos acontecimentos, o autor entrou com ação pedindo a condenação da Porto Seguro a cumprir o contrato, com pagamento do valor de mercado do veículo segurado ou, subsidiariamente, o conserto integral do automóvel. Também quer a condenação da seguradora o pagamento de indenização de R$ 865,00 por danos materiais. Procurada pela revista Consultor Jurídico, a Porto Seguro afirmou que não vai se manifestar sobre o caso enquanto não houver decisão judicial.

Leia a inicial

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Vara Cível do Fórum Central da Comarca da Capital do Estado de São Paulo.

ANDRÉ NELSON DE MELLO SKOWRONSKI, brasileiro, solteiro, residente e domiciliado nesta Capital, por seu advogado (doc.), vem à presença de V.Exa. propor a presente AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO POR INEXECUÇÃO CONTRATUAL cumulada com INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS em face de PORTO SEGURO CIA DE SEGUROS GERAIS, empresa estabelecida na Capital do Estado de São Paulo, na Avenida Rio Branco, 1489, São Paulo/SP, inscrita no CNPJ sob o nº 61.198.164/001-60; e RUMO NORTE CONGONHAS DISTRIBUIDORA DE VEÍCULOS LTDA. com sede nesta Capital na Av. Washington Luis, 5320, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:

I) DOS FATOS

O autor celebrou contrato de seguro em 29/05/2003, com vigência até 29/05/2004 para cobertura de veículo (Chevrolet Astra Sedam, 1.8 ano 2000/ modelo 2000, placas DAK 2837) de sua propriedade nos termos da apólice n. 31.01.6868620-6, conforme documento anexo.

O preço do seguro foi de devidamente quitado por meio de débito em conta do autor das parcelas previstas na página 12 da referida apólice.

Em 12/02/2004 houve um acidente envolvendo este automóvel, que em virtude da colisão frontal, a primeira ré foi acionada para prestar atendimento de guincho, momento em que foi lavrado o laudo de inspeção pelo representante da primeira ré e encaminhado o veículo por conta e ordem da seguradora à concessionária Chevrolet Rumo Norte, segunda ré. (doc……………..) Foi lavrado, também, boletim de ocorrência, cuja cópia está anexada.

Segundo informações prestadas pela primeira ré, após avaliação dos danos, foi dado perda total no automóvel, haja vista que o valor do conserto superaria o determinado percentual calculado sobre o valor de mercado do bem para justificar a reparação.

Não obstante, para total surpresa do autor, o mesmo recebeu a notificação datada de 29.03.2004 da seguradora, cientificando-o que “Na auditoria levada a efeito para o sinistro em epígrafe, apuramos irregularidades por ocasião do acidente. O fato documentado permite-nos o encerramento do processo sem indenização e o cancelamento da apólice. Outrossim, informamos que o veículo está sua disposição para ser retirado pelo segurado, no endereço abaixo informado (pátio dos salvados): Av. Manoel Monteito de Araújo, 50 – Vila Jaguará – SP”.

Diante, desta posição, deu-se início a uma tortuosa “via sacra” ao autor, pois ao retirar o veículo do endereço mencionado, constatou que seu veículo havia sido “depenado”, ou seja, havia sumido diversas peças que não foram danificadas com a colisão, como direção hidráulica, rádio-CD, ar-condicionado, etc….

A inclusão da segunda ré no pólo passivo decorre justamente desta situação, pois ao deter a posse direita do bem, não zelou pela sua integridade, assim como, sem autorização do autor enviou o veículo à outra empresa de funilaria e mecânica, talvez para terceirizar o serviço.


Ambas as rés sequer deram quaisquer explicações sobre o ocorrido, submetendo o autor a aborrecimentos e perda de tempo na tentativa de reclamar extrajudicialmente a responsabilidade das mesmas pela guarda do veículo.

Tanto foi o desprezo dispensado ao autor, que o mesmo chegou a lavrar um boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia, a fim de exigir o cumprimento de seus direitos contratuais, dada a sua revolta ante o ocorrido. Posteriormente, foi apresentada representação perante o Ministério Público Estadual, a fim de apurar eventual prática de crime, dada a gravidade dos fatos.

Apesar dos reclamos e solicitações, o autor não foi atendido pela seguradora e pela concessionária que preferiram dar às costas ao seu cliente, sem qualquer justificativa.

Diante disto, restou ao autor ajuizar a presente demanda, cujo objetivo é exigir o cumprimento da obrigação contratual de receber quantia pecuniária equivalente ao valor de mercado do automóvel da primeira ré, ou o conserto integral do veículo, como reza o contrato de seguro.

Além desta pretensão, o autor busca a indenização pelos danos morais em face de AMBAS AS RÉS decorrentes do estado em que o veículo foi devolvido, causando assim sofrimento, revolta e aborrecimentos ao autor, em desrespeito à legislação.

II) DA INFRAÇÃO DE CLÁUSULA DO CONTRATO – (responsabilidade da primeira ré)

O autor possui cobertura em caso de colisão, cuja apólice reza o seguinte (página 7 – Apólice de Seguro):

“São riscos cobertos por esta apólice – Cobertura 01 – Colisão, Incêncidio e Roubo.

……

Este seguro foi contratado com base em um percentual escolhido pelo Segurado aplicado sobre o valor do veículo Astra Sedan GL 1.8 8V MPFI 2000/4 porta Gasolina que constava na tabela de Maio de 2003 relativa a grande São Paulo. Esse percentual é o seguinte:

Veículo casco 100% do valor do veículo referência”

O orçamento apresentado pela Radical Veículos e Serviços Ltda, lista as peças a serem repostas e serviço a ser executado, cujo documento corrobora a posição informada pela seguradora, a qual considerou a perda total do bem em caso de indenização do autor.

Partindo dessa premissa, o autor faz jus ao recebimento do valor de mercado do automóvel, conforme contrato, uma vez que o conserto seria inviável financeiramente.

A ausência de justificativa para o cancelamento da apólice sem indenização reforça o direito do autor em exigir o cumprimento do contrato de seguro, quanto à obrigação de pagar o valor o automóvel.

A inadimplemento da ré viola não só o contrato celebrado como também o art. 757 do Novo Código Civil, a saber:

“Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

A posição adotada pela primeira ré afrontou, ainda, o direito do autor à informação sobre o serviço prestado, segundo regula o Código do Consumidor em seu art. 6º, pela falta de justificativa de seu ato.

Em suma, o fato se subsume a norma legal e ao dever contratual da primeira ré de indenizar o autor pelo valor do mercado veículo, no valor de R$ 23.800,00 (vinte e três mil e oitocentos reais), conforme tabela anexa, ou em último caso, o conserto integral do veículo em outra concessionária.

A razão porque a indenização não foi paga deveria ter sido fundamentada ao segurado até para o exercício do seu direito de resposta. O que não se admite é a arbitrariedade cometida pela primeira ré que se aproveita da hipossuficiência do consumidor ao adotar medidas arbitrárias e ilegais, no afã de que a demora do processo judicial repercutirá em maiores lucros, dada a desnecessidade de desembolso da indenização neste momento.

III) DA RESPONSABILIDADE PELA GUARDA DO AUTOMÓVEL (responsabilidade da primeira e segunda ré).

Não obstante, o dever da primeira ré em indenizar o valor total do automóvel conta do contrato de seguro, o fato do autor ter tido suas peças “furtadas” enquanto esteve sob guarda das rés, denota a negligência destas empresas.

A primeira ré obteve a guarda do bem ao retirar o veículo do local do acidente para os procedimentos padrões nestes casos como o conserto ou indenização do valor total (perda total). Já a segunda ré, também passou a deter a posse direita e respectiva responsabilidade sobre o bem quando o recebeu em seu pátio.

Agrava-se a falta de cuidado das rés com o bem alheio, ao se ter descoberto que o veículo foi também enviado à terceira empresa (SCATTINI FUNILARIA E PINTURA DE AUTOS), pela segunda-ré, sem autorização do autor.(vide orçamento anexo esquecido no interior do veículo).

O resultado deste vai e vem do automóvel foi o que se vê das fotografias tiradas no momento em que o autor o recebeu, isto é, com peças faltantes como: jogo completo de limpador de pára-brisas, lanternas e faróis, distribuidor, frente removível do rádio-cd, compressor do ar condicionado, molduras/estribos laterais, calota, roda e pneu trocado, sistema de ar quente (mangueiras) e correias, além de tantas outras desmontadas QUE NÃO TINHAM QUALQUER RELAÇÃO COM O LOCAL AFETADO PELA COLISÃO.


A comprovação documental do “furto” decorre da análise do laudo de inspeção preenchido pelo preposto da primeira ré no momento em que recolheu o automóvel do local da colisão (12/02/2004) com o segundo laudo, também, da primeira ré, datado de 19/04/2004, dentre os quais já se pode aferir que a frente removível do rádio estava no veículo e posteriormente, no segundo laudo que este item estava com o segurado!!!!!

O art. 629 do Novo Código Civil, combinado com os art. 186 e 927 fixa a responsabilidade da ré sobre os danos causados ao veículo, “in verbis”:

“Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante.”

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo.”

Como dito, a negligência ora verificada redunda no dever das rés de ressarcir estes danos materiais, os quais estão absorvidos pelo dever precedente de indenizar o valor do veículo nos termos do contrato de seguro.

Entretanto, os desdobramentos do ocorrido geraram graves aborrecimentos e tensão ao autor, conforme laudo médico anexo, que repercutiram do direito do autor de ser ressarcidos por estes danos morais experimentados injustamente.

Sem dúvida, as atitudes desidiosas e negligentes das rés reforçaram a culpa pelos fatos apresentados, agravando suas responsabilidades.

IV) DOS DANOS MORAIS (responsabilidade da primeira e segunda ré).

A postura e o tratamento adotado pelas rés durante todo o desenrolar dos acontecimentos provocaram ao autor inúmeros aborrecimentos.

A seguradora deixou de fornecer informações relevantes sobre o motivo do cancelamento da apólice, que além de caracterizar total desrespeito ao cliente, fez com que durante todo o período de espera de uma resposta, o autor fosse consumido pela angústia e ansiedade de ver o problema resolvido.

A irresponsabilidade também foi constatada, agora por ambas as rés, quando o autor recebeu seu automóvel no estado já mencionado, sem qualquer justificativa destas empresas.

Obviamente, os sentimentos de revolta e tristeza tomaram a vida do autor, que sofreu por se sentir desrespeitado, ter seus direitos violados, por ter perdido inúmeras horas de trabalho para tentar resolver o impasse, e por ter sido enganado pela empresa que assumiu o compromisso mediante remuneração de garantir o único patrimônio que o mesmo possuía em caso de sinistro.

As rés não possuíam alicerce legal para tomar as medidas verificadas muito menos de negarem-se a dar explicações sobre as faltas cometidas.

O desgaste emocional é inerente dos eventos que se sucederam, na qual qualquer pessoa nesta condição passaria pelos aborrecimentos indesejados.

Aliás, se visualiza não só a má-fé nas atitudes, mas ainda a intenção de enriquecimento ilícito.

PONTES DE MIRANDA, citado na obra “O dano moral e sua reparação” de Wilsom Melo da Silva, Ed. Forense, p. 421, esclarece, a saber:

“Não compreendemos como se possa sustentar a absoluta irreparabilidade do dano moral. Nos próprios danos à propriedade, a elemento imaterial, que se não confunde com o valor material do dano. Que mal entendida justiça é esta que dá valor ao dano imaterial ligado ao material e não dá ao dano imaterial sozinho? Demais, o mais vulgarizado fundamento para se não conceder a reparação do dano imaterial é de que não seria completo o ressarcimento. Mas não é justo, como bem pondera KOHLER, que nada se dê, somente por não se poder dar o exato.”

Segundo LUIZ RODRIGUES WAMBIER, citado na obra “Dano Moral”, ed. Saraiva, p.17, “in verbis”:

“O dano é situação resultante de ato ou omissão, ilícitos ou não, em que alguém, de forma culposa ou em razão do exercício de dada atividade, cujos riscos deva suportar, cause menos valia no patrimônio da vítima, mesmo que relativa a interesses não apreciáveis economicamente, possibilitando, via de conseqüência, o nascimento da pretensão ressarcitória”.

Logo, resta patente o dever SOLIDÁRIO das rés de reparar os danos morais causados ao autor em valor justo a ser arbitrado por V. Exa. considerando um montante capaz de representar uma penalidade significativa a fim de reprimir o mal injusto e ilegal praticado.

Neste sentido, sugere-se, à título de indenização POR DANOS MORAIS o valor de mercado do automóvel sinistrado, como forma de guardar relação de pertinencialidade com o objeto principal da ação.

V) DOS DANOS MATERIAIS (responsabilidade da primeira ré)

Seguindo o mesmo fundamento legal e jurídico, o autor deve ser ressarcido de todas as despesas incorridas face ao cancelamento da apólice, como as despesas de locomoção incorridas até a presente data em virtude da falta de atitude da seguradora de lhe fornecer um veículo reserva ou indenizá-lo conforme o contrato.

Os recibos de táxi anexos totalizam R$ 865,00, cujo valor foi despendido em locomoção após o acidente, e assim representam os danos matérias – despesas periféricas e geradas por culpa exclusiva da primeira ré.

IV) DO PEDIDO

Diante do exposto, requer-se:

1. citação das rés, para responder a presente ação sob pena de revelia;

2. inversão do ônus da prova, nos termos do Código do Consumidor;

3. intimação da Porto Seguro para apresentar/exibir todos os documentos atinentes a este sinistro, nos termos do art. 359 do CPC;

4. julgamento procedente desta ação, a fim de condenar a primeira ré á cumprir o contrato de seguro, com pagamento do valor de mercado do veículo segurado ou, subsidiariamente, o conserto integral do automóvel em concessionária a ser indicada pelo autor;

5. condenar ambas as rés, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais, cujo montante deve ser baseado no valor de mercado do veículo;

6. condenar a primeira ré ao ressarcimento dos danos materiais no valor de R$ 865,00;

7. aplicação de correção monetária e incidência de juros legais até a data do efetivo pagamento;

8. condenação das rés ao pagamento dos honorários advocatícios à base de 20% sobre o valor da condenação, além das despesas judiciais e processuais; e

9. provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente pela produção de prova oral, depoimento pessoal do representante da ré, sob pena de confissão, juntada de documentos, perícia e por tudo o mais que se fizer necessário à cabal demonstração dos fatos articulados na presente inicial.

Dá-se à causa o valor de R$ 23.800,00 (vinte e três mil e oitocentos reais).

Nestes termos,

Pede deferimento.

São Paulo, 14 de maio de 2004.

Remo Higashi Battaglia

OAB/SP 157.500

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