Procedimentos normais

Esconder de auditores quem aderiu à regularização é "comum", diz Receita

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7 de maio de 2017, 14h29

A Receita Federal não vê problema em esconder de seus auditores fiscais quem aderiu ao programa de regularização de ativos mantidos no exterior, conhecido como “repatriação de divisas”. Em nota enviada à ConJur neste sábado (6/5), a Secretaria da Receita disse que “orientações internas sobre novas rotinas de trabalho são comuns”.

O pronunciamento foi feito depois que reportagem da ConJur revelou que, por orientação da cúpula da Receita, os CPFs e CNPJs de quem aderiu ao programa de repatriação foram substituídos pelo CNPJ da própria Secretaria da Receita Federal. E por isso os auditores não têm como saber quem aderiu ou não ao programa, que envolve desconto no imposto devido e na multa decorrente da não informação sobre manter bens e dinheiro no exterior sem avisar o Fisco.

Segundo a Receita, o procedimento foi adotado porque as informações do programa de regularização “compõem obrigações específicas”. “Por serem obrigações novas e peculiares”, diz a nota, “houve a necessidade de construção e adequação de sistemas e procedimentos que atendam aos preceitos legais quanto ao acesso às informações no interesse da administração tributária”.

A orientação da coordenadoria de arrecadação da Receita (Codac) e da coordenação do programa de regularização de ativos (Corec) é a de que os auditores enviem os Darf relacionados ao programa a Brasília, para que as chefias deem andamento ao processo. Darf é o Documento de Arrecadação da Receita Federal. O registro do pagamento de impostos é feito ao Fisco por meio dele.

De acordo com o auditor fiscal Kleber Cabral, presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Unafisco), a substituição do CPF é inédita na Receita. O normal é que todos os auditores tenham acesso a todas as informações de todos os contribuintes, justamente para que possam cruzar dados e saber se todos os tributos estão sendo pagos normalmente.

Com a substituição do CPF dos aderentes ao programa de repatriação, os auditores não conseguem saber se os impostos foram pagos como deveriam, ou não conseguem, por exemplo, cruzar informações de renda com as de consumo. O resultado, diz Cabral, foi a última fase da operação “lava jato”, deflagrada na quinta-feira (4/5), em que se descobriu um executivo da Petrobras usando a repatriação para lavar dinheiro mantido nas Bahamas justamente porque tinha origem num esquema de superfaturamento de contratos e pagamento de suborno.

Mas a Receita justifica a prática com os parágrafos 1º e 2º do artigo 7º da lei que criou o programa. O primeiro dispositivo pune com demissão o funcionário público que violar o sigilo fiscal. O segundo proíbe a Receita de compartilhar as informações relacionadas ao programa de regularização com os estados e municípios, nem mesmo para constituição de crédito fiscal.

“Assim”, diz a nota, “orientações internas sobre novas rotinas de trabalho, com vistas a orientar as unidades da Receita Federal quanto ao recebimento e as providências referentes às solicitações de retificação de Darf e aos pedidos de restituição de eventuais pagamentos indevidos ou a maior, são comuns”.

Leia a nota da Receita:

Todos os Auditores-Fiscais encarregados pela fiscalização  da Receita Federal têm acesso ao conjunto de informações obtidas pela Receita Federal, inclusive  sobre as declarações e aos pagamentos feitos no âmbito do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária – RERCT.

O sigilo fiscal sobre as informações contidas nas bases de dados da Receita Federal  obedece, de forma rigorosa, o que dispõe o art. 198 do CTN. Assim, toda informação obtida pela Receita Federal, por informação do contribuinte ou  de  terceiros, é submetida a uma classificação quanto ao grau de sigilo
exigido legalmente.

No  caso  das  informações  do  Regime  Especial de Regularização Cambial e Tributária  (RERCT), decorrentes das Declarações de Regularização Cambial e Tributária  (Dercat) e dos documentos de arrecadação compõem bases de dados específicas,  por  serem  obrigações  novas e peculiares, nos termos do que dispõe  o  art.  7º,  §§1º e 2º da Lei nº 13.254, de 13 de janeiro de 2016, houve necessidade de construção e adequação de sistemas e procedimentos que atendam os preceitos legais quanto ao acesso às informações no interesse da Administração Tributária.

Assim, orientações internas sobre novas rotinas de trabalho, com vistas a orientar as unidades da Receita Federal quanto ao recebimento e as providências referentes às solicitações de retificação de Darf e aos pedidos de restituição de eventuais pagamentos indevidos ou a maior, são comuns.

Em complemento, a Receita Federal informa que a DERCAT, nos termos da Lei, não poderá ser, por qualquer modo, utilizada (i) como único indício ou elemento para efeitos de expediente investigatório ou procedimento criminal; ou (ii) para fundamentar, direta ou indiretamente, qualquer procedimento administrativo de natureza tributária ou cambial em relação aos recursos dela constantes".

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