Ousadia punida

Direito de imagem tem natureza salarial se valor é maior que salário

Autor

24 de junho de 2017, 15h33

Apesar de ter natureza civil, o direito de imagem, quando superar o valor o salário pago ao profissional, também tem natureza salarial. Com esse entendimento, o Conselho Superior de Recursos Fiscais (Carf) condenou o jogador de futebol Neymar Junior por usar uma empresa para receber valores pagos por suas aparições em campo e fora dele.

A Receita Federal autuou o jogador e suas empresas alegando que houve simulação na criação das pessoas jurídicas para que os valores recebidos por Neymar entre 2011 e 2013 não fossem tributados como salário. Disse ainda que os indícios foram encontrados porque os objetivos principais das empresas não estariam sendo devidamente cumpridos.

A decisão, por maioria, considerou que “a parcela decorrente da cessão de seu uso é ajustada em montante que em muito supera o salário nominal do empregado, e paga em valores pré-fixados independentes da efetiva exploração da imagem”. A ação julgada foi um recurso movido pelo atleta.

Reprodução
Neymar Júnior foi condenado por simular o uso de empresas para reduzir a carta tributária sobre seu salário.
Reprodução

Votaram contra o provimento Túlio Teotônio de Melo Pereira e Ronnie Soares Anderson, e a favor a relatora do caso, Bianca Felícia Rothschild. No recurso, Neymar argumentou que criou a empresa para administrar tarefas para que ele pudesse se dedicar exclusivamente ao futebol.

Detalhou que a companhia, a Neymar Sport, foi criada quando ele tinha 14 anos, a pedido do Santos Futebol Clube, equipe pela qual o camisa 10 do Brasil atuou antes de ser vendido ao Barcelona.

Outra empresa, a N&N, também foi investigada na ação. Segundo o atleta, essa pessoa jurídica foi criada em 2011 para assessorar sua carreira. Complementou contando que, em 2012, abriu a N&N Administração de Imóveis para cuidar de seus bens.

Essa desproporcionalidade entre o valor do direito de imagem e o salário de Neymar Júnior, continuam os conselheiros, somada à falta de comprovação da exploração da imagem configura fraude na contratação da companhia usada pelo jogador. “Artifício usado para evitar o pagamento integral dos tributos e demais encargos envolvidos, inclusive com a utilização de pessoa jurídica interposta”, disseram os conselheiros vencedores.

O colegiado chegou a destacar que há permissão em lei para explorar “serviços de caráter personalíssimo por pessoa jurídica” e explicar que, no caso de atletas, o que rege essa permissão é o artigo 87-A da Lei Pelé (Lei 9.615/98). Complementaram que a inclusão de obrigações personalíssimas além de ser adequada, não descaracteriza o contrato de exploração de direito de uso de imagem.

Especificamente sobre a relação com Barcelona, que firmou um pré-contrato com o jogador tempos antes de sua ida à Catalunha, na Espanha, os conselheiros entenderam que “os valores recebidos como retribuição por cessão de direito de imagem à clube estrangeiro, ainda que por intermédio de sucessivas interpostas pessoas, revestem-se de caráter salarial, quando correspondem a percentuais pré-estabelecidos incidentes sobre verbas remuneratórias, e não restar comprovado estarem associados à efetiva exploração daquele direito”.

Citaram ainda que por ter sido confirmada a atuação de Neymar nos atos empresariais, mesmo como sujeito passivo, a multa imposta ao jogador e às empresas deveriam ser mantidas. Também definiram responsabilidade solidária no caso com base no artigo 124, inciso I do Código Tributário Nacional e no interesse comum na situação constituidora do fato gerador.

“Inconsistências” encontradas
No voto vencedor, do conselheiro Ronnie Soares Anderson, é citado que há “sucessivos ‘enganos’ verificados” nas operações com as empresas, desde as criações das companhias, por exemplo, “antedatamento de CNPJ em contratos, e distrato efetuado em 25/3/2014, tão somente após o início da ação fiscal”.

Para Anderson, a regularização foi feita com o objetivo de suprir inconsistências no contrato de prestação de serviços firmado entre a empresa e o atleta, em 27 de abril de 2011, tendo em vista que então a empresa sequer existia. Ele também citou como prova de simulação que, nos anos-calendário analisados na causa, não há nos livros contábeis nenhuma operação ligada ao objeto social das empresas.

“Também há claros sinais de simulação tais como sua constituição às vésperas do acordo com o Barcelona (18/10/2011), ausência de estrutura operacional e de funcionários (só contratado um funcionário em 2013), bem como de falta de capacidade econômica para a consecução dos objetivos sociais consultoria esportiva e empresarial, representação, assessoria e participações empresarial e esportiva”, complementou.

Em relação aos documentos trazidos por Neymar Júnior aos autos, o conselheiro afirma que não servem para justificar nada, pois tratam de um período posterior ao analisado. “Por mais que a D. Relatora se esmere ao defender não ser necessário expressivo número de funcionários para dar conta do desenvolvimento das atividades objeto social da empresa, tal linha de raciocínio surge com verdadeiro eufemismo, quando se está, em apertada síntese, perante sociedade constituída às pressas, de forma até mesmo atabalhoada, que não possui quaisquer funcionários, não possui capital integralizado e que não registra na contabilidade qualquer atividade relacionada com o objeto social”, opinou.

Clique aqui para ler o acórdão do Carf.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!