Campo minado

Troca no comando da AGU expõe disputas entre carreiras do órgão

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2 de março de 2016, 11h13

A troca no comando da Advocacia-Geral da União expôs os ânimos exaltados com que as diferentes carreiras da instituição têm se enfrentado nos últimos anos. Entre notas públicas, mensagens em grupos de redes sociais e abaixo-assinados, as movimentações mostram a dificuldade que o novo ministro, José Eduardo Cardozo, que deixa o Ministério da Justiça, encontrará pela frente.

Dois dias depois do anúncio da troca na AGU, já há uma nota de repúdio, uma nota de boas vindas e um abaixo assinado, encabeçado por alguns advogados da União, felicitando Cardozo pelo novo cargo, mas expondo a situação em que se encontra a carreira. “A missão de V. Exa. é a de retomar a combalida autoestima dos membros da AGU, com vistas a estancar a sangria dos quadros da carreira”, diz a petição.

O anúncio de que Cardozo deixaria a pasta em que está desde o início do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, em 2011, aconteceu na segunda-feira (29/2). No dia seguinte, a Associação Nacional de Procuradores Federais (Anpaf) publicou uma nota de repúdio ao nome de Cardozo à frente da AGU. Também assinaram a nota o Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), a Associação dos Procuradores do Banco Central (APBC) e a Associação dos Membros das Carreiras da AGU (Anajur).

A reclamação é porque, semanas antes do anúncio de Cardozo, as entidades promoveram a eleição de uma lista tríplice com a intenção de que a presidente Dilma se ativesse a ela. Mas o chefe da AGU tem um cargo equivalente ao de um ministro de Estado, e por isso é de livre nomeação da Presidência da República.

Entre carreiras
A lista foi devidamente ignorada pelo governo. As direções das entidades pediam que Dilma indicasse para o cargo alguém da carreira, especialmente um procurador federal, os responsáveis pela defesa das autarquias e fundações. Mas o que os membros da PGF têm dito que a adesão à tal lista, numa conta otimista, mobilizou 20% da carreira, contando os inativos.

Tem circulado entre os membros da AGU que a insatisfação dos procuradores federais é por medo de perder certas prerrogativas. Hoje, a PGF é parte da AGU, mas, ao contrário da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Advocacia da União e da Procuradoria-Geral do Banco Central, ela foi incluída no órgão por lei. Não está nem na Constituição, como a PGFN e a AGU, e nem na lei orgânica da categoria, como a PGBC.

Luís Inácio Adams, que deixa o cargo no fim de março, está nele desde outubro de 2009. Nos últimos anos ele vinha enfrentando resistência da carreira, e chegou-se a instalar um movimento “fora Adams”. Depois de reuniões e negociação com o governo, a AGU, o Planejamento e a Casa Civil propuseram a unificação das carreiras, transformando todas em advogados da União, só com atribuições diferentes.

A ideia agradou os procuradores federais, mas desagradou os demais. Reclamaram que isso inflaria a carreira, de cerca de 4 mil advogados da União e procuradores da Fazenda para 8 mil ativos e quase 7 mil inativos.

Boas vindas
Mas enquanto os sindicatos criticam a nomeação de Cardozo, a grande maioria dos membros da carreira decidiu não adotar qualquer postura hostil. A Anauni, dos advogados da União, publicou uma nota de boas vindas ao novo ministro. “A Anauni deseja ao Sr. Advogado-Geral da União uma gestão exitosa e comprometida com os interesses do cidadão e do país”, diz a nota.

A preocupação da Anauni é em estabelecer um diálogo das bases com Cardozo para que ele entenda os problemas por que passa a carreira e, como “parlamentar de larga experiência legislativa”, “sensibilize o Parlamento acerca dos pleitos que estejam relacionados ao desenvolvimento institucional da AGU”.

São citadas as PECs 82/2007 e 443/2009, uma para vincular o salário da carreira ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal e outra para dar autonomia administrativa ao órgão. Também são citados os projetos de lei 4.253/2015 e 4.254/2014, que reestruturam o órgão administrativamente, inclusive permitindo que os membros da AGU advoguem na iniciativa privada e regulamentam os honorários de sucumbência, já previstos no novo Código de Processo Civil.

Pela frente
Já a petição, publicada por volta das 16h da terça-feira (1º/3), pede que Cardozo trabalhe para melhorar a vida dos membros da AGU. O texto afirma que, nos últimos quatro anos, a atuação da AGU “se traduziu em uma economia de R$ 3 trilhões aos cofres públicos”.

Um dia depois de ter sido posta no ar, a nota já conta com quase duzentas assinaturas — para desgosto dos que votaram na lista tríplice. Já tem circulado em grupos de Whatsapp e no Facebook mensagens críticas à petição por ela contribuir para uma suposta desmobilização do movimento.

Mas o fato é que a petição é uma cobrança. “O advogado público deve ter garantias, prerrogativas e condições adequadas para defender a entidade, seus servidores, gestores e os interesses do povo e da nação”, diz o texto. “Estamos convictos que sua atuação na qualidade de ministro da AGU ratificará seu histórico de comprometimento com a valorização da advocacia pública.”

*Texto editado às 12h40 do dia 2 de março de 2016 para correção de informação.

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