Reflexões Trabalhistas

É preciso diferenciar profissional de comunicação corporativa e jornalista

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8 de abril de 2016, 8h01

O Direito do Trabalho desde sua origem e até os dias e hoje tem como primado a realidade dos fatos sobre a situação formal, isto é, para o correto enquadramento jurídico-trabalhista de uma situação importa, acima de tudo, o que ocorre no mundo real, a despeito da situação formal aparente.

Desse modo, ainda que tomador e prestador de serviço celebrem um contrato de trabalho autônomo, este só será válido se refletir a realidade do trabalho, com autonomia. No momento em que este trabalho passar a ser prestado com subordinação hierárquica, desaparecerá a autonomia e não haverá mais contrato de trabalho autônomo válido, mas sim um contrato de emprego, pois estarão presentes as características dos artigos 2º e 3º da CLT.

E esta afirmação é verdadeira mesmo inexistindo contrato de trabalho formalmente ajustado pelas partes, pois o artigo 442 da CLT afirma que o contrato individual de trabalho corresponde à relação de emprego, o que significa privilegiar o real em relação ao formal.

Isso significa que a qualificação técnica e acadêmica de um profissional é importante somente se este desenvolver as atividades próprias desta sua qualificação. O fator que determina o enquadramento jurídico do empregado é a atividade por ele desenvolvida, e não sua qualificação acadêmica ou profissional, por si só.  Importa, como dito, a realidade.

Um advogado por formação profissional, que presta serviços distintos de sua formação a um  banco, é bancário e não advogado. De igual modo um médico por formação, que trabalha como gerente de uma  empresa prestadora de serviços, é comerciário e não médico.

São muitas as situações de fato em que encontramos pessoas com determinada formação profissional, mas que prestam serviços em atividade diversa daquela em que se especializou originariamente. Insista-se, é a realidade do trabalho que determina o enquadramento jurídico do empregado.

Neste contexto evidencia-se que a atividade profissional do jornalista necessita efetivamente ser exercida, para que seja reconhecida. Se prestar serviços distintos das atribuições de sua formação não será jornalista. Inicialmente o conceito de jornalista requeria o trabalho para empresa jornalística, conforme artigo 302, caput, da CLT. Posteriormente, atendendo à modificações na sociedade e na própria atividade, o Tribunal Superior do Trabalho ampliou a abrangência deste conceito, editando a Orientação Jurisprudencial 407 da SDI 1, afirmando que será jornalista aquele que desempenhar atividades próprias e típicas de jornalismo, independentemente do ramo de atividade desenvolvido pelo empregador. Assim dispõe a OJ 407:

JORNALISTA. EMPRESA NÃO JORNALÍSTICA. JORNADA DE TRABALHO REDUZIDA. ARTS. 302 E 303 DA CLT. (DEJT divulgado em 22, 25 e 26.10.2010). O jornalista que exerce funções típicas de sua profissão, independentemente do ramo de atividade do empregador, tem direito à jornada reduzida prevista no artigo 303 da CLT.

Concluiu deste modo a colenda corte porque o Decreto-Lei 972/1969, que dispõe sobre o exercício da profissão de jornalista, nos artigos 2º e 3º, §1º, equipara às empresas jornalísticas as empresas não jornalísticas, mas desde que o profissional desenvolva atividade própria de jornalista.

Sublinhe-se que o legislador limita esta equiparação ao efetivo exercício da atividade de jornalista, assim entendido “o trabalhador intelectual cuja função se estende desde a busca de informações até a redação de notícias e artigos e a organização, orientação e direção desse trabalho”. A CLT em seu artigo 302 já referido, assim conceitua a atividade profissional:

“Art. 302 – Os dispositivos da presente Seção se aplicam aos que nas empresas jornalísticas prestem serviços como jornalistas, revisores, fotógrafos, ou na ilustração, com as exceções nela previstas.
§ 1º – Entende-se como jornalista o trabalhador intelectual cuja função se estende desde a busca de informações até a redação de notícias e artigos e a organização, orientação e direção desse trabalho.
§ 2º – Consideram-se empresas jornalísticas, para os fins desta Seção, aquelas que têm a seu cargo a edição de jornais, revistas, boletins e periódicos, ou a distribuição de noticiário, e, ainda, a radiodifusão em suas seções destinadas à transmissão de notícias e comentários.

O Decreto 83.284/1979, deu nova redação ao citado Decreto-Lei 972, de 17 de outubro de 1969, em decorrência das alterações introduzidas pela Lei 6.612, de 07 de dezembro de 1978. E em artigo 2º reitera as atividades próprias da profissão de jornalista. Em seu artigo 3º equipara às empresas jornalísticas as agências de publicidade ou qualquer entidade pública ou privada não jornalística sob cuja responsabilidade se editar publicação destinada a circulação externa, mas exclusivamente nos casos em que o profissional desenvolva as atividades típicas de jornalista.

Em síntese, para que um trabalhador seja considerado jornalista é essencial que desenvolva funções típicas de seu mister, assim considerada a definição legal.

No que respeita às empresas de comunicação corporativa, têm estas objetivos distintos e opostos às finalidades que devem presidir a atividade das empresas jornalísticas.

A função primeira do jornalista é informar o público, recolhendo a notícia e divulgando-a. Já o profissional de empresa de comunicação corporativa tem por atribuição veicular assuntos de interesse da empresa cliente, o que é totalmente distinto da função jornalística.

Como já afirmamos, as atividades de comunicação corporativa não são de caráter jornalístico, daí porque não se enquadram no regramento legal para a categoria de jornalistas.

A missão do jornalismo é informar os cidadãos do que ocorre de relevante na sociedade, enquanto os profissionais de comunicação corporativa ocupam-se do fluxo de informações para fins institucionais da empresa ou da entidade que está sendo assessorada.

Assim, uma informação empresarial, não sujeita a um “código deontológico” da profissão da jornalista, não pode ser considerada atuação jornalística, dadas as particularidades desta última, que servem a propósitos empresariais, sobretudo.

Os profissionais de comunicação corporativa, contratualmente submetem-se ao dever de confidencialidade, pois zelam pela boa imagem e reputação da empresa assessorada. Não podem externar opiniões e críticas com a liberdade de expressão intrínseca a função dos jornalistas. Dirigem-se a segmentos e setores sociais específicos, conforme os interesses da entidade assessorada, e não à opinião pública.

Os profissionais de comunicação corporativa trabalham a construção da imagem da empresa assessorada, e não a verdade dos fatos com base em várias fontes ouvidas, como devem fazer os jornalistas. O profissional de comunicação corporativa não produz textos jornalísticos no sentido técnico, embora redijam textos, o que não é tarefa exclusiva de jornalistas, dado que outros profissionais, também o fazem. Têm contatos com jornalistas, levando informações e esclarecimentos sobre fatos. Mas esta função não transforma porta-vozes e assessores de imprensa em jornalistas.

A assessoria de imprensa é apenas um dos vários serviços que podem ser oferecidos por uma agência de comunicação corporativa a um determinado cliente, sempre com objetivo de levar a mensagem do cliente a terceiros e nunca na função de informar o público sobre fatos sociais.

Assim, em síntese, não se confundem em absoluto as atividades do jornalista, cujo compromisso profissional é com o público e com a informação, e a atividade do profissional de comunicação corporativa, cujo compromisso é com o cliente a quem presta serviços.

Entende-se por comunicação corporativa a comunicação de uma corporação, empresa, ou organização, o que significa comunicação empresarial, organizacional, ou relações públicas. Isso revela que o profissional da comunicação corporativa tem compromisso com a empresa para qual trabalha e cumpre a função de passar a imagem desta, mantendo seu conceito junto ao público.

O compromisso do jornalista e sua função são distintos. A propósito de sua atividade e função afirmam Manus e Romar (CLT com Interpretação Jurisprudencial, RT, SP, 2013. P.305): “O jornalismo é uma profissão diferenciada por sua estreita vinculação ao pleno exercício das liberdades de expressão e de informação. O jornalismo é a própria manifestação e difusão do pensamento e da informação de forma contínua, profissional e remunerada. O jornalismo e a liberdade de expressão, portanto, são atividades que estão imbricadas por sua própria natureza e não podem ser pensadas e tratadas de forma separada”. 

É evidente que não se confundem as atividades do profissional de comunicação corporativa, cujo compromisso que mantém é com a empresa que representa, com as atividades do jornalista, cujo compromisso é com o público e a fidelidade da notícia que veicula.

Resulta, afinal, que são claramente distintas as funções de jornalista e profissional de empresa de comunicação corporativa, daí porque o entendimento da Orientação Jurisprudencial 407 da SDI-I do TST não se aplica a estes últimos, pois é clara ao ressalvar sua aplicação somente ao jornalista que exerce funções típicas de sua profissão.

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