Freio de voz

Itália quer punir jornalista que divulgar grampo

Autor

22 de maio de 2010, 9h08

Jornalistas que trabalham na Itália estão com seus olhos voltados para um projeto de lei que, se aprovado, vai permitir que o vazamento de interceptações telefônicas seja punido com cadeia. A proposta, que partiu do governo italiano atual, prevê multa e prisão para jornalistas que tiverem acesso e divulgarem conversas gravadas.

O projeto de lei foi apresentado em 30 de junho de 2008 pelo ministro da Justiça, Angelino Alfano, que é do PDL, partido do primeiro ministro italiano Silvio Berlusconi. Um ano depois, foi aprovado na Câmara e agora aguarda votação no Senado. A emissora de televisão por assinatura Sky Itália já prometeu levar o caso para a Corte Europeia dos Direitos Humanos. Em nota, a empresa lembra que o direito ao acesso à informação é um direito irrenunciável do cidadão e um dever dos jornalistas.

A proposta de Alfano é enrijecer as regras para as escutas telefônicas e interceptações de e-mails e, assim, proteger os direitos à intimidade e à privacidade dos investigados. A ideia, de acordo com o texto enviado pelo ministro à Câmara, é equilibrar o respeito ao acusado com a eficácia de investigações contra terrorismo e organizações criminosas no país. Para estes dois casos, as regras sugeridas para escutas são mais flexíveis.

Caneta controlada
A pretexto de proteger da exposição pública os investigados, o governo italiano comprou uma briga com a classe dos jornalistas. Seu projeto proíbe a divulgação de atos preliminares de investigações e prevê multa para quem descumprir isso. Já as escutas não podem ser divulgadas, mesmo depois de concluída a investigação. Pela proposta, o jornalista que descumprir a lei pode ficar até três anos na cadeia e ter de pagar uma multa de pouco mais de mil euros (aproximadamente R$ 2,3 mil).

Na Câmara, os jornalistas italianos foram premiados com a redução da pena de prisão para até 30 dias, quando o material publicado for resultado de escutas telefônicas. Mas a multa foi aumentada para até 10 mil euros (o equivalente hoje a R$ 23 mil). A divulgação de outros atos da investigação, que não sejam resultados de grampo, deixou de ser punida com prisão, mas apenas com multa de até mil euros.

A Comissão de Justiça do Senado, que agora discute o projeto do governo, tem feito audiências com entidades interessada na proposta, inclusive associações de jornalistas. Na casa, foi apresentada uma emenda para aumentar para dois meses de prisão a punição para a publicação de escutas, e não apenas os 30 dias aprovados pela Câmara.

Soma e produto
Nessa semana, o PDL, que tem maioria no Legislativo, anunciou que pode repensar a proibição e punição previstas para jornalistas. A emenda que aumenta para dois meses a prisão pode ser retirada de votação. O anúncio, no entanto, não acalmou os ânimos dos jornalistas italianos.

Em abril, o Conselho Nacional da União das Cooperativas Italianas havia solicitado ao sindicato dos jornalistas e à Ordem dos Jornalistas que mobilizassem toda a categoria para impedir a aprovação do projeto. Depois do anúncio do PDL, a Ordem dos Jornalistas da Itália divulgou, nesta sexta-feira (21/5), uma nota em que afirma que o anúncio feito pelo PDL não tira a gravidade da proposta em votação no Senado. A categoria defende que os cidadãos têm direito a informação. E, ainda, completa dizendo que um mês na cadeia é pouco para um bandido, mas muito para um jornalista que está apenas exercendo a sua função.

A pena pecuniária, que pode chegar a 10 mil euros, também é rechaçada pela Ordem, que chegou a fazer uma estatística de quanto ganha um jornalista para mostrar quanto teria de trabalhar para poder pagar uma multa como essa. De acordo com a entidade, nem os políticos e nem a maioria dos leitores sabem que centenas de jornalistas ganham pouco mais de dois euros por cada texto e, assim, teriam de escrever 50 mil textos para poder pagar a multa. A Ordem dos Jornalistas informou que, baseada em decisão unânime do seu conselho executivo, já solicitou pareceres de especialistas e vai tomar todas as medidas para garantir o direito de o cidadão ter acesso a toda e qualquer informação. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!