Crime no cinema

Empresas terão de indenizar vitima de atirador

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19 de outubro de 2009, 23h47

As modernas instalações comerciais, colocadas à disposição do cliente para que ele opte pelos serviços de determinada empresa no lugar dos oferecidos pela concorrente, são também ferramentas geradoras de responsabilidade civil. Assim como o estabelecimento comercial responde pelo cliente que, dentro da loja, sofre acidente por má conservação de algum equipamento, a mesma empresa é responsável por eventual negligência resultante de serviços colocados à disposição do público.

Com esse fundamento o Tribunal de Justiça de São Paulo reformou sentença de primeiro grau que havia julgado improcedente ação de indenização, por danos morais e psicológicos, movida pela engenheira agrônoma Andrea Cury Lang contra o Grupo Internacional Cinematográfico e o Shopping Center Morumbi. O TJ paulista estabeleceu o valor da indenização em R$ 50 mil. A sentença modificada era do juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível Central da Capital. A nova decisão, por votação unânime, é da 5ª Câmara de Direito Privado com tese lançada pelo desembargador Mathias Coltro.

Andréa foi uma das vítimas do estudante de medicina Mateus da Costa Meira, que na noite de 3 de novembro de 1999, invadiu uma sala de cinema do Morumbi Shopping atirando com uma submetralhadora calibre nove milímetros, de uso privativo das forças armadas. Naquela noite Andréa estava acompanhada do namorado, Júlio, que foi morto com um tiro no rosto.

Andrea foi atingida na região glútea por um tiro disparado pelo estudante, que matou três pessoas e feriu outras quatro, durante a sessão do filme Clube da Luta. Laudo do IML apontou que o estudante, que na época cursava o 6º ano de medicina, estava sob efeito de cocaína.

A engenheira alegou que o fato ocorreu por falha de segurança do shopping e da empresa cinematográfica, proprietária da sala. Segundo ela, os réus não forneceram, no momento, meios adequados para o socorro das vítimas. No caso, Andréa foi encaminhada ao Hospital Albert Einstein. Segundo ela, permaneceu em tratamento por mais de um ano. Andrea reclamou à Justiça indenização correspondente a 1.500 salários mínimos (R$ 697.500)

A empresa de cinema reclamou ilegitimidade passiva, com o argumento de que a responsabilidade pelo ocorrido seria da empresa proprietária do shopping, a quem cabia zelar pela segurança do local. No mérito apresentou a tese de caso fortuito ou força maior, o que a livraria de responder pela reparação. Sustentou que sua responsabilidade só poderia ser reconhecida caso provada a falha de algum de seus funcionários ou representantes, o que, no caso, não teria ocorrido. E negou culpa pelo evento.

O Shopping Morumbi alegou que não foi responsável direto ou indireto pelos atos praticados por Mateus da Costa Meira nem pelos danos morais causados às vítimas do ato criminoso. Argumentou que o fato se caracterizou como um “episódio inédito, imprevisível e inevitável”. Sustentou, por fim, que não tem poder de polícia, porque segurança pública é dever do Estado.

O Tribunal de Justiça entendeu que o fato ocorrido naquela noite no Shopping Morumbi, do ponto de vista civil, se enquadra nas normas estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). Para a turma julgadora, Andréa era consumidora de um serviço oferecido aos clientes e foi vítima de evento que estava sob a responsabilidade de quem oferecia o produto ou serviço.

O relator, Mathias Coltro, descartou a tese de caso fortuito ou de força maior. Para ele, o argumento só se sustentaria se houvesse culpa da vítima, fenômeno natural ou ordem de autoridade. “No caso, não se verificou nenhum acontecimento externo capaz de exonerar a requerida do dever de indenizar a autora, ao passo que o acontecimento interno, proveniente da falta de cautela e precaução do prestador de serviço, também a tanto não se presta”, afirmou o desembargador.

A conclusão da turma julgadora foi a de que o ato praticado por Mateus da Costa Meira não era imprevisível como pretendia provar a defesa do Shopping Morumbi e do Grupo Internacional Cinematográfico. Estava na esteira dos casos possíveis de acontecer e caberia às duas empresas se cercarem de cautelas para impedir que um homem entrasse armado com uma metralhadora dentro de uma sala de cinema, no interior de um shoppping.

Sentença penal
O Ministério Público denunciou Meira em novembro de 1999 por triplo homicídio e 33 tentativas. Em 2002, o Tribunal de Justiça atenuou as acusações da Promotoria e manteve denúncia de três homicídios e cinco tentativas, que depois foram alteradas para quatro lesões corporais graves.

Meira foi condenado a 120 anos e seis meses de reclusão pelos três homicídios, por tentar matar quatro pessoas que ficaram feridas e colocar em risco a vida de outras 15. A sentença foi da juíza Maria Cecília Leone. A defesa recorreu da decisão.

Do total, 110 anos e 6 meses deverão ser cumpridos em regime fechado pelas três mortes e quatro tentativas de homicídio. Os outros 10 anos, por conta do crime de periclitação de vida, deverão ser cumpridos em regime semi-aberto. Porém, no Brasil, o condenado pode permanecer, no máximo, 30 anos na prisão.

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