Interesse próprio

Juiz responde por mandar prender empregada de namorada

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9 de novembro de 2006, 6h00

O juiz Gilberto Ferreira da Cruz, titular da Vara do Júri e Execuções Criminais da Comarca de Santos, vai responder processo administrativo por ter decretado a prisão temporária da empregada de sua namorada. A decisão unânime é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Em maio deste ano, o Órgão Especial já tinha recebido a denúncia da Procuradoria-Geral de Justiça contra o juiz. Ele responde pelo crime de prevaricação.

De acordo com a denúncia, a namorada disse ao juiz que sua empregada tinha maltratado seu avô, de quem cuidava. O juiz, então, pediu para ela fazer um boletim de ocorrência sobre o caso. Segundo a denúncia, ele usou a sua função para influenciar o delegado seccional da cidade a requerer a prisão temporária da acusada. Foi aberto inquérito policial e, segundo o Ministério Público, o próprio juiz decretou a prisão temporária de Maria do Carmo pelo prazo de 10 dias.

Segundo a Procuradoria-Geral de Justiça, o juiz pré-julgou a empregada com a intenção de puni-la. Em 27 de maio de 2004, ele ordenou a prisão de Maria do Carmo e não observou o seu próprio impedimento em atuar como juiz em causa com nítido interesse próprio, de acordo com o MP.

A defesa do juiz alegou que o artigo 48 da Lei Orgânica da Magistratura prevê o poder discricionário do juiz e que a independência é inerente a condição de magistrado.

O relator, Gilberto Passos de Freitas, votou pela instauração do procedimento disciplinar. O desembargador Laerte Nordi disse que é evidente o impedimento do juiz e que ele jamais poderia ter decretado a prisão temporária da empregada de sua namorada. Ele aproveitou a ocasião para fazer um desabafo: “Todas as quartas-feiras, na sessão do Órgão Especial, a defesa das autoridades alegam que deve haver independência do juiz como argumento para que não seja instaurado processo administrativo. A independência tem limite.”

Laerte Nordi sugeriu ao desembargador Marcus Andrade, que também é diretor da Escola Superior de Magistratura, que se ensinasse aos alunos desde o início o que se pode fazer e o que não se deve fazer na carreira. Andrade disse que essa tem sido uma preocupação permanente da escola.

O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Celso Limongi, ressaltou que não são só juízes iniciantes que estão envolvidos em processos administrativos. Alguns já têm muitos anos de carreira.

O crime de prevaricação se caracteriza por retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa em lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

Tentativa da defesa

A defesa tentou impedir que o julgamento ocorresse com a alegação de que o tema está sub júdice no Conselho Nacional de Justiça. Mas o relator, Gilberto Passos de Freitas, esclareceu que o que está sendo discutido no CNJ nada tem a ver com a acusação no processo administrativo. Todos os desembargadores concordaram e prosseguiram com o julgamento.

O CNJ está analisando se o juiz pode ou não ser efetivado na Comarca de Santos onde é titular. O Órgão Especial havia vetado a sua transferência. O juiz, então, entrou com representação no CNJ. Alguns magistrados do Órgão Especial figuram como parte e, por isso, de acordo com a defesa, estariam impedidos de julgar.

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