Benefício fiscal

Conheça o voto do ministro Peluso sobre o crédito-prêmio do IPI

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8 de novembro de 2004, 15h53

O benefício fiscal do IPI, previsto em ato normativo primário, não pode ser extinto por ato normativo secundário. Isto significaria a “subversão da estrutura hierárquica das normas do ordenamento jurídico” e a “ofensa direta aos princípios da legalidade”.

Este é o entendimento do ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal, ao apresentar seu voto sobre a constitucionalidade do decreto-lei nº 1.724/79, em relação à Carta de 1967, cujo julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, em outubro. A votação estava em seis votos pela inconstitucionalidade contra um, do ex-ministro Maurício Correa.

O decreto-lei, editado em dezembro de 1979, deu poderes ao ministro da Fazenda para editar portarias que definiram, para junho de 1985, a extinção do crédito-prêmio, benefício fiscal a que faziam jus as empresas exportadoras de manufaturados. Para o ministro, isto só poderia ser feito por instrumento hierarquicamente semelhante ou superior.

Peluso seguiu jurisprudência cristalizada da Corte que, em diversos outros recursos especiais sobre o mesmo assunto, considerou inconstitucional o decreto-lei nº 1.724/79. Esse instrumento havia revogado o decreto-lei anterior (nº 1.658/79), editado em janeiro do mesmo ano, que definia a extinção do benefício fiscal, paulatinamente, até junho de 1983.

Trata-se, na realidade, de um emaranhado de decretos-leis, leis e portarias sobre o mesmo assunto. Tanto é que, em seu voto, Peluso considera: “Não desconheço as sucessivas modificações legislativas sobre o chamado crédito-prêmio do IPI e, tampouco, a controvérsia acerca de sua recepção e manutenção pela Carta de 1988, mas devo ater-me à matéria devolvida pelo recurso extraordinário”. Ou seja, a constitucionalidade do decreto-lei 1.724/79.

Leia a íntegra do voto do ministro Cezar Peluso

V O T O

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO:

1. Trata-se de recurso extraordinário tirado contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e cuja ementa dispõe:

“CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO. ESTÍMULOS FISCAIS. DL 491. DL 1.724/79. DL 1.894/81.

1. A autorização para suspender, aumentar, reduzir ou extinguir, temporária ou definitivamente, os incentivos fiscais concedidos pelo DL 491/69 é inconstitucional por invadir esfera reservada à lei (CTN, art. 97, VI).

2. Autorizado o recebimento, em espécie, do excedente do estímulo fiscal, depois de compensado com os débitos do IPI e outros impostos federais.

3. Descabida a pretensão de juros compensatórios, porque inassimilável a hipótese ao instituto da desapropriação.”

A recorrente aduz que o crédito-prêmio de IPI veiculado pelo “Decreto lei 491/69 e, por extensão, pelo Decreto-lei 1724/79, nada tem de tributário. Quando ali se fala de “crédito tributário”, o que se quer significar é a possibilidade de utilização de um subsídio financeiro para pagamento de débitos tributários. Não sendo matéria tributária, não há razoabilidade em exigir tratamento de regime tributário à sua regulação jurídica” (fls. 184).

Alega, também, que a delegação ao Ministro da Fazenda é legítima por se tratar de condução da política econômica e, “especialmente no delicado setor do comércio exterior, o Estado ficaria imobilizado se não dispusesse de instrumentos regulamentares capazes de captar as grandes diretrizes fixadas em lei às cambiantes circunstâncias conjunturais, mormente ao se tratar de estímulos que permitam ao produtor nacional maior competitividade no mercado internacional” (fls. 184).

Por fim, argúi contradição que envolveria o argumento da recorrida que aceita a concessão/regulamentação dos créditos por portaria ministerial, quando lhe são benéficas, e as refuta quando desfavoráveis, como no caso de suspensão ou extinção.

2. Iniciado o julgamento, o Relator, Min. MAURÍCIO CORREA, deu provimento ao recurso, e nisso foi acompanhado pelo Min. NELSON JOBIM:

“Ora, o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República auxiliado pelo Ministros de Estado (art. 73, EC – 01/69), e a este Poder foi conferida autorização para alterar os incentivos fiscais instituídos pelo DL 491/69. Assim sendo, e diante da regra do art. 81, V da EC 01/69, e da faculdade prevista no parágrafo único deste artigo, o Presidente da República delegou atribuições ao Ministro de Estado da Fazenda para alterar o crédito-prêmio do IPI, tendo em vista a política econômica gerenciada pelo Governo, podendo a referida autoridade estabelecer prazo, forma e condições para sua fruição, bem como reduzi-lo, majorá-lo, suspendê-lo ou extingui-lo, em caráter geral ou setorial.

Portanto, não vislumbro nos atos ministeriais nenhuma inconstitucionalidade, visto que a delegação de atribuição se encontrava consentânea com a Carta Federal então vigente; nem mesmo ilegalidade teria ocorrido, dado que não houve delegação de competência e, sim, transferência de atribuição, como permitido pelo art. 7º do Código Tributário Nacional. Alias, a esse respeito, o Plenário desta Corte, ao examinar o caso IAA – delegação de atribuição ao Conselho Monetário Nacional – por ocasião do julgamento do RE nº 178.144-1-AL, Sessão de 27.11.96, de que fui designado relator para o acórdão, resolveu pela constitucionalidade do princípio, ou seja, a possibilidade de delegação da referida atribuição.”


O Min. MARCO AURÉLIO, em voto vista, negou provimento ao recurso, por entender que a delegação não encontraria respaldo na Constituição de 1967/69 e que as portarias ministeriais transporiam o limite da legalidade, ao revogar dispositivo editado por ato normativo primário (Decreto-lei):

“Relativamente à atuação de Sua Excelência o Presidente da República, dispôs-se, no parágrafo único do art. 81 da Carta pretérita, sobre a possibilidade de outorga ou delegação de atribuições ao Ministro de Estado.

Sem dúvida, tal possibilidade, balizada em preceito exaustivo, fez-se, sob o ângulo da competência privativa do Presidente da Republica, no tocante ao que previsto no citado art. 81, não englobando, a toda evidência matéria submetida ao princípio da legalidade, muito menos a ponto de alcançar mediante portaria, a suspensão de eficácia de decreto-lei, contrariando-se a premissa segundo a qual a revogação de diploma legal dá-se por outro de idêntica envergadura ou de idoneidade superior.

De acordo com o parágrafo único do art. 81, a possibilidade de delegação ficou restrita ao inciso V – dispor sobre a estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos da Administração Federal; à primeira parte do inciso VIII – provimento de cargos públicos federais, não se chegando, sequer, à possibilidade de extinção dos cargos; ao inciso XVIII – autorização a brasileiros de aceitar pensão, emprego ou comissão de governo estrangeiro; e, por último, ao inciso XXII – concessão de indulto e comutação de penas com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei.

De qualquer forma, a possibilidade de outorga ou delegação das citadas atribuições ficou submetida à observância dos limites traçados nas outorgas e delegações. Ora, o preceito alvejado pela Corte de origem nem previa limites. Tanto assim ocorreu que a portaria em comento veio não a mitigar o benefício fiscal de que cuida o Decreto lei nº 491/69, mas a suspendê-lo, permanecendo tal estado de coisas por cerca de dois anos. Iniludivelmente, está-se diante de uma hipótese reveladora de delegação contrária ao texto constitucional.”

Em seguida, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do Min. CARLOS VELLOSO.

3. Antes de analisar o mérito, observo que a questão objeto deste extraordinário se adscreve a juízo de compatibilidade, ou não, do Decreto.-lei nº 1.724/79 com a Constituição de 1967/69.

Não desconheço as sucessivas modificações legislativas sobre o chamado crédito-prêmio do IPI e, tampouco, a controvérsia acerca de sua recepção e manutenção pela Carta de 1988, mas devo ater-me à matéria devolvida pelo recurso extraordinário.

4. O “crédito-prêmio” do IPI foi instituído pelo Decreto-lei nº 491/1969:

“Art. 1º. As empresas fabricantes e exportadoras de produtos manufaturados gozarão a título de estímulo fiscal, créditos tributários sobre suas vendas para o exterior, como ressarcimento de tributos pagos internamente.

§ 1º. Os créditos tributários acima mencionados serão deduzidos do valor do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre as operações no mercado interno.

§ 2º Feita a dedução, e havendo excedente de crédito, poderá o mesmo ser compensado no pagamento de outros impostos federais, ou aproveitado nas formas indicadas por regulamento.”

O Decreto-lei nº 1.658/1979 estipulou termo de vigência ao benefício, em dispondo no art. 1º:

“Art 1º – O estímulo fiscal de que trata o artigo 1º do Decreto-lei nº 491, de 5 de março de 1969, será reduzido gradualmente, até sua definitiva extinção.

§ 1º – Durante o exercício financeiro de 1979, o estímulo será reduzido:

a) a 24 de janeiro, em 10% (dez por cento);

b) a 31 de março, em 5% (cinco por cento);

c) a 30 de junho, em 5% (cinco por cento);

d) a 30 de setembro, em 5% (cinco por cento);

e) a 31 de dezembro, em 5% (cinco por cento).

§ 2º – A partir de 1980, o estímulo será reduzido em 5% (cinco por cento) a 31 de março, a 30 de junho, a 30 de setembro e a 31 de dezembro, de cada exercício financeiro, até sua total extinção a 30 de junho de 1983.”

Em 3 de dezembro de 1979, foi editado o Decreto-lei nº 1.722/1979, o qual alterou a forma de extinção do benefício (mantendo-lhe os prazos):

“Art 3º – O parágrafo 2º do artigo 1º do Decreto-lei nº 1.658, de 24 de janeiro de 1979, passa a vigorar com a seguinte redação:

“2º O estímulo será reduzido de vinte por cento em 1980, vinte por cento em 1981, vinte por cento em 1982 e de dez por cento até 30 de junho de 1983, de acordo com ato do Ministro de Estado da Fazenda.”

No dia 7 de dezembro do mesmo ano, veio a lume o Decreto-lei nº 1.724/1979, objeto do presente recurso e cujo art. 1º preceitua:


“Art 1º O Ministro de Estado da Fazenda fica autorizado a aumentar ou reduzir, temporária ou definitivamente, ou extinguir os estímulos fiscais de que tratam os artigos 1º e 5º do Decreto-lei nº 491, de 5 de março de 1969.”

Examino agora o mérito.

5. O Decreto-lei nº 491/1969, no conceder ao exportador, crédito compensável com o imposto sobre produtos industrializados devido nas operações internas, bem como no pagamento de outros impostos federais (art. 1º), instituiu benefício fiscal de natureza tributária.

Ao propósito, transcrevo parte do voto que proferi na ADI nº 2777/SP:

“O benefício fiscal, ou incentivo fiscal, tem por finalidade estimular ou desestimular comportamentos, mediante desoneração ou redução de carga tributária, ou, ainda, concessão de condições mais favoráveis para o pagamento de tributo devido, o que, não precisaria dizê-lo, não se confunde em nenhum aspecto com o instituto da repetição do indébito.

GERALDO ATALIBA e JOSÉ ARTUR LIMA GONÇALVES não deixam dúvidas acerca da tipologia do incentivo fiscal:

“A expressão “incentivo fiscal’ comporta diversas valorações, tendo sido utilizada, ao longo do tempo, para referir as mais diversas modalidades de normas fiscais, algumas exonerativas, outras agravadoras de carga tributária. Todas, porém, tendentes a estimular, incentivar, animar o contribuinte a adotar determinados comportamentos.

Trata-se de regras jurídicas de motivação dos particulares na adoção de tal ou qual espécie de comportamento, que coincide com os interesses e objetivos considerados imprescindíveis ou desejáveis à obtenção do bem-estar social e/ou do desenvolvimento nacional, na estimação estatal, traduzida em normas legais (v. A.R. Sampaio Dória).

(…)

Esses mecanismos de direcionamento de comportamentos traduzem-se em atos normativos que consistem, geralmente, no abrandamento ou na supressão da imposição tributária geral. Reduzem-se ou eliminam-se certas cargas tributárias para, a partir dessa desoneração, atrair o particular para a prática daquela atividade eleita pelo Estado como sendo de importância especial ou estratégica, em determinadas situações ou momentos.

Os incentivos fiscais manifestam-se, assim, sob várias formas jurídicas, desde a forma imunitória até a de investimentos privilegiados, passando pelas isenções, alíquotas reduzidas, suspensão de impostos, manutenção de créditos, bonificações, créditos especiais – dentre eles os chamados créditos-prêmio – e outros tantos mecanismos, cujo fim último é, sempre, o de impulsionar ou atrair, os particulares para a prática das atividades que o Estado elege como prioritárias, tornando, por assim dizer, os particulares em participantes e colaboradores da concretização das metas postas como desejáveis ao desenvolvimento econômico e social, por meio da adoção do comportamento ao qual são condicionados.” (“Crédito-Prêmio de IPI – Direito adquirido – Recebimento em dinheiro”, in Revista de Direito Tributário, ano 15, janeiro/março de 1991, nº 55, p. 166-167).”

São aplicáveis, portanto, ao crédito-prêmio do IPI as restrições inerentes à disciplina das relações jurídico-tributárias, notadamente o princípio da legalidade, posto como limite objetivo à atuação do legislador (e do Poder Executivo) e como direito e garantia individual do cidadão (art. 153, § 2º, da CF de 1967/69).

Neste sentido, já se pronunciou, não poucas vezes, o Plenário:

“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. INCENTIVOS FISCAIS: CRÉDITO PRÊMIO: SUSPENSÃO MEDIANTE PORTARIA. DELEGAÇÃO INCONSTITUCIONAL. D.L. 491, de 1969, arts. 1º e 5º; D.L. 1.724, de 1979, art. 1º; D.L. 1894, de 1981, art. 3º, inc. I. C.F./1967.

I – é inconstitucional o artigo 1º do D.L. 1.724, de 7.12.79, bem assim o inc. I do art. 3º do D.L. 1.894, de 16.12.81, que autorizaram o Ministro de Estado da Fazenda a aumentar ou reduzir, temporária ou definitivamente, ou restringir os estímulos fiscais concedidos pelos artigos 1º e 5º do D.L. nº 491, de 05.03.69. Caso em que tem-se delegação proibida: CF/67, art. 6º. Ademais, matérias reservadas à lei não podem ser revogadas por ato normativo secundário.

II – RE conhecido, porém não provido.” (RE nº 186.623-3/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, maioria de votos)

“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. INCENTIVOS FISCAIS: CRÉDITO-PRÊMIO: SUSPENSÃO MEDIANTE PORTARIA. DELEGAÇÃO INCONSTITUCIONAL. D.L. 491, de 1969, arts. 1º e 5º; D.L. 1.724, de 1979, art. 1º; D.L. 1.894, de 1981, art. 3º, inc. I. C.F./1967.

I. – Inconstitucionalidade, no art. 1º do D.L. 1.724/79, da expressão “ou reduzir, temporária ou definitivamente, ou extinguir”, e, no inciso I do art. 3º do D.L. 1.894/81, inconstitucionalidade das expressões “reduzi-los” e “suspendê-los ou extingui-los”. Caso em que se tem delegação proibida: C.F./67, art. 6º. Ademais, matérias reservadas à lei não podem ser revogadas por ato normativo secundário.


II. – R.E. conhecido, porém não provido (letra b).” (RE nº 180.828-4/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, maioria de votos)

“TRIBUTO – BENEFÍCIO – PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA. Surgem inconstitucionais o artigo 1º do Decreto-lei nº 1.724, de 7 de dezembro de 1979, e o inciso I do artigo 3º do Decreto-lei nº 1.894, de 16 de dezembro de 1981, no que implicaram a autorização ao Ministro de Estado da Fazenda para suspender, aumentar, reduzir, temporária ou definitivamente, ou extinguir os incentivos fiscais previstos nos artigos 1º e 5º do Decreto-lei nº 491, de 5 de março de 1969.” (RE nº 186.359-5/RS, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, maioria de votos).

5. A Constituição de 1967/69 também hospedava o princípio da estrita legalidade em matéria tributária (art. 19), excepcionando-o, como a atual, em relação ao IPI (art. 21, V):

“Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – instituir ou aumentar tributo sem que a lei o estabeleça, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;”

Art. 21. Compete à União instituir imposto sobre:

I – importação de produtos estrangeiros, facultado ao Poder Executivo, nas condições e nos limites estabelecidos em lei, alterar-lhe as alíquotas ou as bases de cálculo;

II – exportação, para o estrangeiro, de produtos nacionais ou nacionalizados, observado o disposto no final do item anterior;

III – propriedade territorial rural;

IV – renda e proventos de qualquer natureza, salvo ajuda de custo e diárias pagas pelos cofres públicos na forma da lei;

V – produtos industrializados, também observado o disposto no final do item I;” (grifei)

Não se alegue que estes dispositivos exigiriam lei apenas para fim de instituição ou majoração de tributos, nem que a concessão de benefícios fiscais estaria alforriada a tal exigência.

Em primeiro lugar, o princípio da legalidade da administração pública no trato do patrimônio público e da indisponibilidade de seus interesses impõe uso de veículo normativo primário para reduzir ou suprimir arrecadação prevista em lei.

Por outro lado, lei que institui ou majora tributo somente pode ser modificada por produto legislativo de igual (ou superior) envergadura nomológica, o que desde logo impede concessão de benefícios fiscais com mudança legislativa, mediante instrumento de nível subalterno.

6. O benefício fiscal em causa foi introduzido por Decreto-lei, instrumento normativo primário, então da competência do Presidente da República. De modo que só poderia derrogado ou revogado mediante ato normativo de igual ou superior escalão, como ocorreu, em 1979, com a edição dos Decretos-leis nº 1.658 e nº 1.722, que lhe fixaram termo de vigência (até 1983).

A delegação operada pelo Decreto-lei nº 1.724/1979, na medida em que desrespeitou tais limites, é inconstitucional.

Como observou o Min. MARCO AURÉLIO, no voto-vista já citado, o § único do art. 81 da Constituição de 1967/69 somente permitia delegação das atribuições privativas do Presidente da República em relação às matérias especificadas nos incs. V, VIII, XVIII e XXII, entre as quais não consta a concessão nem o cancelamento de benefícios fiscais .

O aumento ou redução, temporária ou definitiva, ou a extinção de benefício fiscal, previsto em ato normativo primário, não podem dar-se por via de ato normativo secundário, sob pena de subversão da estrutura hierárquica das normas do ordenamento jurídico e de ofensa direta ao princípio da legalidade.

7. Nestes termos, acompanho o Min. MARCO AURÉLIO, para conhecer do recurso e negar-lhe provimento, declarando inconstitucional o art. 1º do Decreto-lei nº 1.727/1979, por conter delegação de competência privativa em desconformidade com a Carta de 1967/69.

“Art. 81. Compete privativamente ao Presidente da República:

I – exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal;

II – iniciar o processo legislativo, na fôrma e nos casos previstos nesta Constituição;

III – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, expedir decretos e regulamentos para a sua fiel execução;

IV – vetar projetos de lei;

V – dispor sôbre a estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos da administração federal;

VI – nomear e exonerar os Ministros de Estado, o Governador do Distrito Federal e os dos Territórios;

VII – aprovar a nomeação dos prefeitos dos municípios declarados de interêsse da segurança nacional;

VIII – prover e extinguir os cargos públicos federais;

IX – manter relações com os Estados estrangeiros;

X – celebrar tratados, convenções e atos internacionais, ad referendum do Congresso Nacional;

XI – declarar guerra, depois de autorizado pelo Congresso Nacional, ou, sem prévia autorização, no caso de agressão estrangeira ocorrida no intervalo das sessões legislativas;

XII – fazer a paz, com autorização ou ad referendum do Congresso Nacional;

XIII – permitir, nos casos previstos em lei complementar, que fôrças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nêle permaneçam temporariamente;

XIV – exercer o comando supremo das fôrças armadas;

XV – decretar a mobilização nacional, total ou parcialmente;

XVI – decretar o estado de sítio;

XVII – decretar e executar a intervenção federal;

XVIII – autorizar brasileiros a aceitar pensão, emprego ou comissão de governo estrangeiro;

XIX – enviar proposta de orçamento ao Congresso Nacional;

XX – prestar anualmente ao Congresso Nacional, dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa, as contas relativas ao ano anterior.

XXI – remeter mensagem ao Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País e solicitando as providências que julgar necessário; e

XXII – conceder indulto e comutar penas com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei.

Parágrafo único. O Presidente da República poderá outorgar ou delegar as atribuições mencionadas nos itens V, VIII, primeira parte, XVIII e XXII dêste artigo aos Ministros de Estado ou a outras autoridades, que observarão os limites traçados nas outorgas e delegações.”

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