Produtividade do Supremo

Veja importantes decisões do ministro Celso de Mello em 2006

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14 de julho de 2006, 11h58

Em 2006, o ministro Celso de Mello reforçou em sua biografia o perfil de defensor dos direitos fundamentais. A constatação vem da leitura de alguns de seus mais importantes votos e julgamentos deste primeiro semestre. Junto com seus colegas de Supremo Tribunal Federal, o ministro empunhou firmemente a bandeira contra os abusos perpetrados pelas diversas CPIs instauradas nestes tempos de crise e se destacou nesta questão.

“A função de investigar não pode resumir-se a uma sucessão de abusos nem deve reduzir-se a atos que importem em violação de direitos ou que impliquem desrespeito a garantias estabelecidas na Constituição e nas leis. O inquérito parlamentar, por isso mesmo, não pode transformar-se em instrumento de prepotência nem converter-se em meio de transgressão ao regime da lei.”

Com esse argumento, o ministro impediu a quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico da empresa Alexander Forbes Brasil Corretora de Seguros pela CPMI dos Correios e deixou claro que o Legislativo não está livre das regras impostas pela Constituição. Em uma investigação, seja ela legislativa ou criminal, o devido processo legal tem sempre de ser respeitado.

O recorrente argumento de interferência na autonomia de outro poder não resistiu aos fatos. O Judiciário só resolveu enfrentar o Legislativo em casos onde houve afronta à Constituição. Em outro voto, Celso de Mello defendeu a liberdade de atuação das comissões parlamentares de inquérito. O ministro entendeu que não cabe ao Judiciário interferir nos relatórios das CPIs. Para ele, a produção de relatório parcial não é ato abusivo, mas uma forma legítima de apresentar os resultados obtidos ao longo do inquérito legislativo.

Durante o primeiro semestre do ano, Celso de Mello proferiu 5.573 decisões, entre votos e despachos interlocutórios, todos criteriosamente fundamentados. Aliás, é uma das características do ministro proferir decisões liminares fundamentadas como se o que estivesse em julgamento fosse o mérito da questão.

Celso de Mello decidiu também que quando não há sala de Estado Maior disponível para que o advogado fique preso, ele deve ficar em prisão domiciliar. Num extenso voto, o ministro afirmou que a prerrogativa profissional não pode ser violada em hipótese alguma. A decisão, em caráter liminar, garantiu o direito do advogado Ezio Rahal Melillo, preso por fraude ao INSS.

Gaveta

Entendimento do ministro levou o Supremo Tribunal Federal a trancar ação penal por meio de Habeas Corpus. Celso de Mello foi o relator do pedido e explicou que, embora a instauração criminal por si só não caracterize constrangimento ilegal, é possível que o tribunal entenda que não há justa causa para o procedimento penal e determine o trancamento da ação. Tudo isso, disse ele, pode ser feito por meio da via sumaríssima, o Habeas Corpus.

Ainda em matéria criminal, o ministro defendeu o princípio da indivisibilidade da queixa-crime. Ou seja, a queixa-crime tem de ser proposta contra todos os supostos autores do crime. Com esse argumento, Celso de Mello concedeu liminar para suspender audiência no processo criminal em que o advogado Sérgio Bermudes move contra o jornalista Ricardo Boechat. Bermudes se sentiu ofendido com notas publicadas na coluna que o jornalista tinha no Jornal do Brasil.

O ministro Celso de Mello considerou relevante o argumento de que o fato de a ação penal privada ter sido proposta apenas contra Boechat — apesar de outros dois jornalistas assinarem a coluna como colaboradores — configura renúncia tácita e gera a extinção da punibilidade.

Entidade familiar

Em fevereiro, o ministro Celso de Mello trancou Ação Direta de Inconstitucionalidade que discutia a limitação imposta pela Lei 9.278/96 ao conceito de entidade familiar. Pela norma, só é considerada entidade familiar a união estável entre um homem e uma mulher. Entidades de defesa dos homossexuais contestavam o dispositivo, mas o ministro arquivou a ação por questões técnicas: a lei foi suspensa pelo novo Código Civil e, por isso, não cabe ADI contra ela.

Mesmo assim, Celso de Mello mostrou o caminho das pedras para as entidades: a questão deve ser discutida por meio de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Ou seja, deu a dica para que a sociedade provoque o Supremo para que este se manifeste sobre a questão.

Celso de Mello ainda participou vivamente de duas importantes e polêmicas discussões no Plenário do STF. Em uma delas, os ministros decidiram que o fim da verticalização, determinado pela Emenda Constitucional 52/06, não vale para este ano, já que mudanças nas regras eleitorais não podem ser impostas em ano de eleição. Celso de Mello observou que a emenda fere a garantia do devido processo legal, a igualdade de condições para a disputa e a estabilidade das regras eleitorais.

Em outra discussão, o ministro se posicionou contrário ao entendimento majoritário. Ele votou pela constitucionalidade da proibição da progressão de regime para condenados por crimes hediondos. Para o ministro, a proibição imposta pela Lei 8.072/90 não contraria a Constituição Federal.

Mandado efetivo

Entre outras importantes questões discutidas pelo Supremo Tribunal Federal, destaca-se a discussão em torno da efetividade do Mandado de Injunção. O STF sinalizou, no começo de junho, que se o Congresso não cumprir seu papel de legislar, o tribunal o fará, quando direito previsto na Constituição não puder ser exercido por omissão dos parlamentares. O sinal foi dado no julgamento do direito de greve dos servidores públicos.

O ministro Celso de Mello ainda não se manifestou no caso, mas um voto seu, de novembro do ano passado, deu um impulso especial à discussão deste ano. Na ocasião, o ministro entendeu que o Judiciário não pode elaborar políticas públicas, mas pode compelir o poder público a implementá-las caso estejam previstas na Constituição.

O entendimento foi acompanhado por todos os integrantes da 2ª Turma do STF, formada então pelos ministros Carlos Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Decidiu-se que o município de Santo André (SP) deve garantir a matrícula de uma criança de quatro anos na creche pública administrada pela prefeitura.

“Quando a proposta da Constituição Federal impõe o implemento de políticas públicas, e o poder público se mantém inerte e omisso, é legitimo sob a perspectiva constitucional garantir o direito à educação e atendimento em creches. O direito não pode se submeter a mero juízo de conveniência do Poder Executivo”, fundamentou Celso de Mello.

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