Opinião

Lei de Alienação Parental: revogar ou reformar?

Autor

  • Lucas Menezes

    é sócio responsável pela área de Direito de Família e Sucessões do escritório Pessoa & Pessoa Advogados. Graduado e mestre em Direito pela UFBA (Universidade Federal da Bahia).

25 de abril de 2024, 6h05

Hoje, dia 25 de abril, celebra-se o Dia Internacional de Combate à Alienação Parental, uma ocasião para refletir sobre uma questão que afeta profundamente as dinâmicas familiares em todo o mundo.

No Brasil, o tema é regulamentado pela Lei 12.318 de 2010, que está atualmente sob o escrutínio de um intenso debate devido a um projeto de lei que visa revogá-la. Contudo, é preciso questionar se a revogação é a medida necessária e mais adequada para os desafios presentes.

A alienação parental ocorre quando um dos pais, ou ambos, tentam manipular psicologicamente a criança contra o outro genitor, um processo que pode ter efeitos duradouros e prejudiciais.

A Lei 12.318 foi criada para combater essa prática, fornecendo meios legais para proteger o bem-estar emocional e psicológico dos menores envolvidos. Entretanto, a lei tem sido alvo de críticas contundentes e objeto de intenso debate político na sociedade.

Críticos frequentemente apontam que a lei pode ser manipulada para interromper investigações sobre abusos reais, sob o pretexto de alienação parental, além de poder ser utilizada em uma perspectiva de gênero para atacar as mulheres que denunciam os abusos cometidos pelos pais.

123RF

Essa preocupação foi destacada pelo senador Magno Malta ao justificar o projeto de revogação. De acordo com o senador, a concessão de medidas liminares sem a devida comprovação da alienação parental transforma o abusador em vítima e a vítima em algoz, prejudicando quem a lei deveria proteger: a criança e o adolescente.

Entretanto, as críticas quanto à sua aplicação e às consequências não intencionais que podem inflamar os conflitos familiares sugerem que os problemas derivam mais das interpretações e práticas judiciais do que dos princípios da lei.

Neste ponto, é fundamental eliminar a falsa noção de que a lei de alienação parental é uma questão de gênero. Tanto pais quanto mães podem ser vítimas de alienação. Casos em que os pais alienam os filhos, tentando desqualificar a imagem das mães, não são incomuns. Essas situações são particularmente graves, pois não só prejudicam a relação entre mãe e filho, mas também configuram uma violência contra a mulher, podendo enquadrar-se nas sanções previstas pela Lei Maria da Penha.

Por outro lado, os problemas na aplicação da lei frequentemente surgem devido à sua redação ambígua e à falta de critérios claros para definir o que constitui alienação parental.

Exemplo

Um exemplo problemático é a caracterização de alienação parental pela apresentação de falsas denúncias contra o outro genitor. Esta disposição tem sido criticada por potencialmente desencorajar denúncias legítimas de abuso.

A lei permite a interpretação de que simplesmente arquivar uma denúncia por falta de provas poderia constituir alienação parental.

Clarificar no texto legal que o arquivamento, por si só, não basta para caracterizar a alienação, exigindo-se que o genitor acusado demonstre que o acusador conhecia a falsidade da alegação, ajudaria a prevenir equívocos e corrigir injustiças.

Assim, em vez de revogar a lei, mais apropriado seria atualizá-la para melhor definir os critérios de caracterização da alienação parental e para garantir sua aplicação justa. Isso afastaria essas interpretações enviesadas tanto criticadas por quem defende a sua revogação.

No entanto, o desafio mais significativo reside no sistema judicial. Sem uma reestruturação abrangente, meras melhorias na legislação serão insuficientes. É essencial uma revisão completa do sistema, que inclui, dentre outros, o desenvolvimento de instrumentos processuais mais apropriados para tratar as questões familiares, fortalecendo, por exemplo, os mecanismos que promovam um diálogo eficaz entre as partes envolvidas.

As questões de família não podem ser reduzidas a simples conflitos entre partes opostas, pois envolvem complexidades jurídicas, sociais, emocionais e psicológicas, que exigem uma abordagem multidisciplinar.

Enquanto o aprimoramento não vem, é fundamental que advogados, juízes e promotores atuem com sensibilidade e agilidade nas demandas. Ao enfrentar uma acusação de alienação parental ou abuso infantil, o juiz deve imediatamente ordenar um acompanhamento profissional constante para a criança ou adolescente envolvido.

Em situações graves, pode ser necessário suspender temporariamente o contato com o genitor acusado de abuso, enquanto se agiliza a realização de perícias e acompanhamento psicológico contínuo.

A demora na resolução desses casos pode causar danos irreparáveis ao menor, seja pela perpetuação do abuso ou pelo afastamento injustificado do genitor.

As decisões judiciais devem ser rápidas e fundamentadas em avaliações detalhadas e contínuas, realizadas por profissionais capacitados, como psicólogos e assistentes sociais, que acompanhem de perto a situação das crianças envolvidas.

Atualmente, um grande problema é a inadequação das perícias, frequentemente realizadas superficialmente em uma única sessão, ao invés de um acompanhamento detalhado e prolongado. Portanto, é imperativo que essas práticas sejam revistas para realmente proteger o bem-estar das crianças, em vez de simplesmente considerar a revogação da lei.

Revogar a Lei de Alienação Parental não resolveria os problemas fundamentais, e poderia deixar as crianças mais vulneráveis a manipulações graves. Em vez disso, é necessária a realização de uma revisão cuidadosa e o fortalecimento de boas práticas judiciais para garantir que a lei cumpra seu propósito de proteger o bem-estar das crianças e preservar seus vínculos familiares saudáveis.

Autores

  • é sócio responsável pela área de Direito de Família e Sucessões do escritório Pessoa & Pessoa Advogados. Graduado e mestre em Direito pela UFBA (Universidade Federal da Bahia).

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