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Violação do dever de revelação gera suspensão de sentença arbitral, diz TJ-SP

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15 de setembro de 2023, 19h57

Caso seja comprovada a ausência de revelação por parte de árbitro em relação à sua atuação junto a determinada parte, em meio a processo de arbitragem, depois de sentença já proferida, a decisão e seus efeitos são passíveis de suspensão.

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TJ-SP suspendeu efeitos de arbitragem por causa do dever de revelação do árbitro
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Com essa fundamentação, a 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) suspendeu uma sentença arbitral em razão de violação do dever de revelação. No caso, verificou-se que a defesa de uma das empresas envolvidas contratou três pareceres de um dos árbitros do procedimento.

Além disso, o escritório que representa essa mesma companhia indicou o referido árbitro para atuar em outra disputa.

Nos autos, consta que o árbitro admitiu que suas atividades profissionais incluem a elaboração de pareceres, e que poderia aceitar a contratação desse tipo de serviço mesmo que por alguns dos escritórios envolvidos em assuntos diferentes ao da arbitragem em questão. A existência dos pareceres, todavia, foi descoberta posteriormente, ou seja, constituiu fato novo no processo.

Na ação, a empresa que entrou com o pedido de anulação afirmou que os pareceres tratam dos mesmos temas discutidos na arbitragem. Além disso, a parte apontou erro na decisão de primeiro grau que rejeitou a anulação, indicando que as partes poderiam ter recusado o árbitro e não o fizeram. A empresa alegou que só tomou conhecimento da situação depois que a sentença arbitral foi proferida.

Já a empresa que venceu a arbitragem negou que os assuntos dos pareceres eram os mesmos da disputa arbitral — argumento que chegou a ser aceito em primeira instância. Também sustentou que os documentos eram públicos e poderiam ter sido verificados pela outra parte.

O desembargador Jorge Tosta, relator, ressaltou em seu voto que a análise do recurso não se prestava a discutir, nesse momento, o mérito da ação anulatória, e, sim, se estavam presentes os pressupostos para a suspensão da sentença arbitral.

"Parece consistente a alegação de que teria havido violação ao dever de relevação por parte do árbitro […], de molde a configurar a probabilidade do direito", escreveu.

Pilar da confiança
O julgador também citou voto do desembargador Araldo Telles, morto no ano passado, segundo o qual "o dever de revelação é o 'pilar da confiança exigida para a efetividade da jurisdição arbitral (artigo 13 da Lei de Arbitragem)' e sua não observância compromete todo o procedimento e a própria sentença arbitral". Tosta também lembrou que o Superior Tribunal de Justiça decidiu que esse compromisso perdura durante toda a arbitragem. 

A Lei de Arbitragem prevê que "as pessoas indicadas para funcionar como árbitros têm o dever de revelar, antes da aceitação da função, qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e independência". E Tosta afirmou ser plausível que esse dispositivo tenha sido violado em razão da contratação de três pareceres pelo mesmo escritório de advocacia que patrocina os interesses de uma das partes.

O relator ainda afirmou que "merece melhor investigação e análise" a alegação de que os pareceres tratavam do mesmo tema em discussão na arbitragem — o que poderia ter causado pré-julgamento ou adiamento da questão decidida. "Veja-se que o parecer de fls. 2.049/2.090 trata do exercício do direito de preferência, matéria que também é objeto de discussão na arbitragem cuja sentença se pretende anular", acrescentou.

O voto de Tosta foi acompanhado pelos desembargadores Ricardo Negrão e Grava Brazil. 

Nulidades
A suspensão ou anulação de sentenças arbitrais por falhas no dever de revelação têm se tornado rotina no Judiciário. Recentemente, a mesma 2ª Câmara de Direito Empresarial do TJ-SP decidiu que as partes não têm obrigação de investigar os árbitros e eventuais conflitos de interesse.

Mesmo se constatada depois da sentença arbitral, a violação do dever de revelação gera a nulidade do julgamento.

No STJ, a ministra Nancy Andrighi entendeu que o dever de violação havia sido violado ao deferir um pedido para suspender medidas executivas contra um médico em uma arbitragem. No caso, o profissional alegou que o árbitro era amigo de um dos advogados da empresa na disputa, além de terem dividido escritório e atuação em outros processos judiciais.

AG 2061531-53.2023.8.26.0000

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