Opinião

Decreto cria a possibilidade de adesão a um processo licitatório?

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22 de outubro de 2023, 15h23

Ao dispor sobre "a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico, o apoio técnico e financeiro de que trata o art. 13 da Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020, a alocação de recursos públicos federais e os financiamentos com recursos da União ou geridos ou operados por órgãos ou entidades da União de que trata o art. 50 da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007", o Decreto nº 11.599/2023 estabelece em artigo 2º, II que o titular poderá prestar os serviços públicos de saneamento básico indiretamente, "por meio de concessão, em quaisquer das modalidades admitidas, mediante prévia licitação, conforme o disposto no art. 10 da Lei nº 11.445, de 2007, vedada a sua disciplina mediante contrato de programa, convênio, termo de parceria ou outros instrumentos de natureza precária".

Até aí nenhuma novidade diante do que é preconizado no regime jurídico trazido pelo novo Marco Legal do Saneamento Básico, que foi instituído pela Lei nº 14.026/2020 ao alterar a redação da Lei nº 11.445/2007.

Só que o parágrafo 16 do artigo 6º Decreto nº 11.599/2023 trouxe a seguinte redação: "homologada a licitação para a concessão dos serviços nos termos do disposto no inciso II do caput do art. 2º, fica vedada a adesão de outros Municípios ao mesmo procedimento licitatório, ainda que integrem a mesma estrutura de prestação regionalizada".

Ora, se a adesão a um certame licitatório é vedada somente após a sua homologação, isso significa que, antes de tal ato administrativo, a adesão a um procedimento licitatório realizado para contratar uma concessionária que preste serviços públicos de saneamento seria perfeitamente possível.

Bom, de imediato diga-se que o novo marco não traz qualquer previsão acerca da possibilidade de adesão às licitações que precedem a celebração dos contratos de concessão.

Outra constatação é que, no modelo nacional de licitações, a adesão se dava em “procedimentos para registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras” (Decreto nº 7.892/2013), os chamados registros de preços.

Ora, nos termos do artigo 78, IV da Lei nº 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos), o sistema de registro de preços é um procedimento auxiliar, não uma licitação em si mesmo.

Assim, o artigo 6º, parágrafo 16 do Decreto nº 11.599/2023 não só inovou com relação ao novo marco. Ele trouxe uma hipótese de adesão que não encontra paralelo na nova Lei de Licitações.

Discussões sobre eventual violação ao artigo 84, IV da CF/88, como poderia ser conferida efetividade ao artigo 6º, § 16 do Decreto nº 11.599/2023? Em outras palavras, como seria possível operacionalizar, na prática, a adesão a um procedimento licitatório realizado para contratar uma concessionária para prestar serviços públicos de saneamento sob o regime de concessão?

Diante de total falta de um melhor detalhamento legal ou infralegal, nos parece que a analogia é a única forma de se dar efetividade ao art. 6º, § 16 do Decreto nº 11.599/2023.

Como o TCU autoriza o emprego de analogia em sede de licitações (vide Acórdão 459/2023-Plenário[1] e Acórdão 533/2022[2]-Plenário), a única forma de se tutelar adesão a um procedimento licitatório realizado para contratar uma concessionária para prestar serviços públicos de saneamento sob o regime de concessão seria fazendo remissão às regras contidas nos arts. 82 a 86 da nova Lei de Licitações e no Decreto nº 11.462/2023 (ou norma local equivalente).

 

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[1] Na contratação de serviços de administração, intermediação e fornecimento de benefício alimentação e refeição aos seus colaboradores, é recomendável que as entidades do Sistema S, caso decidam pela técnica do credenciamento, observem, por analogia, as disposições do art. 79, parágrafo único, da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos).

[2] Embora não previsto na Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais), admite-se a utilização do credenciamento pelas sociedades de economia mista, mediante aplicação analógica dos artigos 6º, inciso XLIII, e 79 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos), uma vez que tais entidades, sujeitas ao mercado concorrencial, exigem instrumentos mais flexíveis e eficientes de contratação.

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