Opinião

Política repressiva de combate ao comércio de drogas: uma guerra perdida

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28 de março de 2023, 12h13

Há alguns dias, o instituto "Data Favela" fez uma pesquisa sobre as necessidades de que as comunidades pobres do país mais reclamam. São 18 milhões de pessoas que residem em favelas em todo Brasil. Se juntássemos todos esses cidadãos em um único território, teríamos uma área correspondente a um estado com a terceira maior população do país.

Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro
Defensoria Pública do Rio

Pois bem, se alguém imagina que a prioridade dessas comunidades é educação, ou saúde, ou saneamento básico, ou a melhoria em infraestrutura, errou. A prioridade é a segurança pública. Essas pessoas são as maiores reféns do crime organizado.

Diante desse quadro, é necessário um amplo debate sobre o equívoco da política repressiva de combate ao comércio de drogas. Trata-se de uma guerra perdida, tal como foi o combate ao comércio de bebidas alcoólicas nos Estados Unidos no século passado.

O que está acontecendo no Rio Grande do Norte e no Rio de Janeiro é revelador. Ocupei o cargo de secretário de segurança pública do estado da Bahia, nos dois últimos anos do governo Rui Costa, e constatei que cerca de 80% dos homicídios têm origem no tráfico de drogas. Isso ocorre, em maior ou menor intensidade, em todas as grandes cidades do país.

Os investimentos pesados em tecnologia que governo do estado da Bahia realizou levou à redução de homicídios por 15 meses seguidos, mas ainda assim em índices nada civilizados. Essa guerra tem levado à morte milhares de pretos pobres e dezenas de policiais, em sua maioria também pretos, que saem para trabalhar todos os dias e não sabem se voltam. Sem falar na superlotação dos presídios, porque não resta, aos governantes, em face da legislação atual, senão reprimir, reprimir e reprimir, como forma de minimizar o problema, que só se agrava.

A imprensa veiculou que, no Rio Grande do Norte, crianças de 10 anos são aliciadas pelos chefes das organizações criminosas para cometer crimes e o atual governo federal tem feito um esforço enorme para conter essa onda de violência. Não tenho dúvida de que haverá uma contenção, mas o problema não será resolvido.

Não há estatística segura sobre o movimento financeiro do comércio de drogas no país, mas há quem estime uma arrecadação superior a duas receitas tributárias anuais da Bahia. Muitos argumentam pelo receio da ameaça à desestruturação familiar, mas não me consta que isso tenha ocorrido com famílias holandesas e dos mais de 30 estados americanos e outros países que flexibilizaram o comércio da maconha. O que desestrutura uma família é a miséria, a falta de educação, de emprego e outras carências.

Por que não adotarmos, então, pelo menos com relação à maconha, que tem ampla utilidade medicinal, a mesma política que adotamos com o cigarro? Se não der certo, não estaremos diante de uma cláusula pétrea e haveremos de buscar outra solução.

O Brasil tem a melhor política de combate ao fumo do mundo. Em 1980, 30% da nossa população fumavam, hoje, depois de uma massiva campanha de conscientização, só 10% fumam. A população brasileira é a que menos fuma no mundo inteiro.

O comércio de algumas drogas mais leves como a maconha poderia sofrer uma tributação específica, fora do orçamento geral da União, cujos recursos seriam destinados à construção de hospitais para a recuperação de pessoas vítimas do consumo de drogas e para uma publicidade massiva contra o seu uso. Haveria redução das despesas do Estado com a segurança pública e um aumento de arrecadação.

Ou se inicia esse debate ou, não vai demorar muito, o Estado brasileiro terá que se sentar à mesa com os chefes das organizações criminosas para negociar algum armistício, como foi feito na Colômbia.

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