Opinião

Capacidade postulatória de consultores do Legislativo e do Judiciário

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13 de maio de 2023, 17h07

Ao concluir o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 44/2019, por meio do plenário virtual, o STF (Supremo Tribunal Federal) tomou o cuidado de assegurar que integrantes de das carreiras de consultoria jurídica do Judiciário e do Legislativo podem, desde que inscritos na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e em caráter excepcional, praticar atos de representação jurídica dos órgãos a que estão vinculados.

Trata-se de uma decisão fundamental para a garantia da independência e autonomia dos tribunais e órgãos legislativos de todo o país, como as assembleias legislativas e as câmaras municipais, alinhada com a rigorosa atuação do STF em favor da correta aplicação da Constituição.

O voto do ministro relator, Gilmar Mendes, que foi seguido por todas as ministras e ministros do Supremo, esclarece, no entanto, as situações em que os consultores jurídicos podem praticar esses atos. "As tais procuradorias também se franquearia a representação judicial, mas tão apenas nas situações em que Poder Legislativo, Judiciário ou a Corte de Contas necessitassem praticar em juízo, em nome próprio, atos processuais na defesa de sua autonomia e independência, face aos demais poderes", afirma o ministro. Ele ainda explica que "o que importa, portanto, é saber se o órgão postula defesa de atribuições ou a manutenção de sua autonomia institucional frente a incursões promovidas pelos demais poderes".

Apesar de a ADI em questão tratar do Tribunal de Justiça e da Assembleia Legislativa do Paraná, o plenário do STF fixou a tese de julgamento proposta pelo relator, de forma a promover a harmonia e a segurança jurídica no país. A seguir, a íntegra da tese:

"É constitucional a instituição de órgãos, funções ou carreiras especiais voltadas à consultoria e assessoramento jurídicos dos Poderes Judiciário e Legislativo estaduais, admitindo-se a representação judicial extraordinária exclusivamente nos casos em que os referidos entes despersonalizados necessitem praticar em juízo, em nome próprio, atos processuais na defesa de sua autonomia, prerrogativas e independência face aos demais Poderes, desde que a atividade desempenhada pelos referidos órgãos, funções e carreiras especiais remanesça devidamente apartada da atividade-fim do Poder Estadual a que se encontram vinculados."

Há, ainda, dois pontos importantes a serem destacados no voto do ministro e na decisão do plenário do STF.

O primeiro deles é que restou clara a necessidade de regular inscrição nos quadros da OAB por parte dos servidores incumbidos de praticar tais atos. A discussão, inclusive, chegou ao Supremo pelo questionamento sobre possível ofensa dos consultores jurídicos à Lei 8.906/1994, o Estatuto da Advocacia. Mais precisamente, o questionamento se dirigia aos artigos 2º e 4º da Emenda Constitucional nº 44 à Constituição do Estado do Paraná, que criou os artigos 124-A e 243-B. Segue o que dizem esses dispositivos:

"Artigo 124A. No processo judicial que versar sobre ato praticado pelo Poder Legislativo ou por sua administração, a representação do Estado incumbe ao Procurador-Geral da Assembleia Legislativa, na forma do artigo 243 desta Constituição.
Artigo 243B. A consultoria jurídica, o assessoramento jurídico e a representação judicial, no que couber, do Poder Judiciário, bem como a supervisão dos seus órgãos de consultoria e de assessoramento jurídicos, serão exercidas, privativamente, pelos Assessores Jurídicos do Tribunal de Justiça, que passam a ser denominados Consultores Jurídicos do Poder Judiciário, integrantes da Carreira Especial.
§1º Os Consultores Jurídicos do Poder Judiciário poderão exercer, em caráter extraordinário, por determinação do Presidente do Tribunal de Justiça, a representação judicial e a defesa do Poder Judiciário estadual nas institucionais e a sua autonomia.
§2º Aos Consultores Jurídicos do Poder Judiciário, aplica-se, no que couber, o disposto nos 88 22 e 3º do art. 125 desta Constituição."

O segundo ponto meritório de nota é o reconhecimento, por parte do ministro relator e de todo o plenário, do princípio da unicidade das procuradorias dos estados e do Distrito Federal.

"Anoto que os Estados-membros da Federação, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, consolidaram sua representação judicial por meio da atuação dos procuradores dos Estados, que, organizados em carreira (na qual o ingresso depende de seleção pública de provas e títulos, com participação da OAB), passaram a desempenhar a defesa da Administração Pública Direta Estadual, na forma do artigo 132 da Constituição", escreveu o ministro Gilmar Mendes.

Em seguida, ele define que "a representação dos Estados é feita pelos procuradores de Estado, cabendo a divisão, por matérias ou atuações, ao âmbito interno de organização administrativa das Procuradorias. Assim, firmou-se, como regramento constitucional, a opção pela unicidade institucional, centralizada na atuação da Procuradoria-Geral do Estado, excluindo-se eventual possibilidade de atuação concorrente nas atribuições jurídicas".

É fundamental, portanto, o trecho "excluindo-se eventual possibilidade de atuação concorrente nas atribuições jurídicas", que garante o direito de atuação dos órgãos do Legislativo e do Judiciário em defesa de sua autonomia e independência, qualidades essenciais de órgãos vitais para o Estado democrático de Direito.

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