Opinião

A mensagem do diretor da OIT na 111ª Conferência Internacional do Trabalho

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12 de junho de 2023, 12h18

Desde a Declaração de Filadélfia de 1944, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) se afirmou como agente de defesa da justiça social no mundo. Com a chegada do novo diretor-geral, Gilbert F. Houngbo, a promoção da justiça social ganha novo impulso.

Durante seu mandato, o diretor da OIT está comprometido em concentrar seus esforços no fortalecimento e na defesa dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, garantindo que a igualdade, a dignidade e a inclusão sejam pilares fundamentais em todas as esferas da vida profissional. Tanto é assim que o primeiro item da pauta da 111ª Conferência Internacional do Trabalho será a discussão do seu relatório, cujo objetivo expresso é a promoção da justiça social e do trabalho decente.

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O Nobel da Paz de 2014, Kailash Satyarthi (esq.), Michaelle Le Cock (centro), da OIT, e os ministros do TST Lelio Bentes Corrêa, Eduardo Valadão e Alberto Balazeiro (dir.)
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Houngbo defende que o trabalho decente é um dos principais canais para o avanço da justiça social, eis que corresponde ao trabalho marcado pelo respeito aos direitos e princípios fundamentais, o que inclui o direito ao trabalho livre, seguro, devidamente remunerado, além do respeito à livre organização e negociação sindical.

Nesse cenário, o avanço da justiça social e a ampliação do alcance do trabalho decente figuram como respostas da OIT ao cenário crítico vivenciado no mundo do trabalho. A esse respeito, destacam-se, em especial, os efeitos no mundo do trabalho decorrentes das crises econômicas, sociais e humanitárias que se sobrepuseram ante a pandemia da Covid-19, bem como as dificuldades vivenciadas pelos trabalhadores no mercado de trabalho.

Alguns dos aspectos centrais dessas crises podem ser visualizados na organização do mundo do trabalho dos trabalhadores e trabalhadoras essenciais, identificados como aqueles do setor de saúde, abastecimento e distribuição de alimentos, varejo, segurança, limpeza e saneamento, transporte, ocupações manuais, e técnicas e administrativas [1].

De acordo com relatório lançado pela própria OIT em março de 2023 (World Employment and Social Outlook 2023: The value of essential work), ainda é longo o caminho a ser percorrido por esses trabalhadores em direção a um trabalho decente, inclusive após a pandemia.

Apesar de o grave período de crise humanitária ter escancarado a relação de interdependência da sociedade com os trabalhos essenciais, os trabalhadores e trabalhadoras responsáveis pela prestação desses serviços ainda vivem em condições precárias de trabalho.

Pesarosamente, a proteção da saúde e segurança no trabalho não tem sido observada para essa categoria de trabalhadores e, durante a pandemia, a teia protetiva foi severamente ineficaz: dentre o rol de trabalhadores e trabalhadoras, aqueles que se dedicavam a atividades essenciais vivenciaram taxas de mortalidade mais alta.

O relatório demonstra que no período de abril de 2020, a mortalidade de trabalhadores e trabalhadoras essenciais que faleceram decorrentes de covid atingiu um patamar de quase 25%. A seu turno, o índice de trabalhadores não essenciais ficou abaixo dos 15%.

Após a pandemia, constatou-se que 1 a cada 3 trabalhadores e trabalhadoras essenciais são contratados de forma temporária e possuem horários de trabalho irregulares, com acentuada jornada de trabalho e sem acesso a qualquer tipo de proteção social.

Os aspectos relacionados às graves crises decorrentes da pandemia — e sua superação —  têm sido fortemente consideradas nas discussões da 111ª Conferência Internacional da OIT.

Para Houngbo, um dos caminhos para superar esse grave cenário é renovar a confiança nas instituições públicas, no diálogo social, bem como promover a prosperidade — o que pode ser alcançado, entre outros, por meio da garantia de uma remuneração adequada. Trata-se de encontrar arranjos institucionais e sociais que vão ao encontro da justiça social e do trabalho decente.

Para tanto, esses arranjos devem ser realizados a partir e para as pessoas. Isso significa que os direitos, as necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras devem ser postas como prioridade nas políticas econômicas, sociais e ambientais. Um exemplo disso é a internalização do conceito de que a segurança e saúde no trabalho é um direito — e não um privilégio — daqueles que trabalham [2].

Nesse cenário, a concretização de direitos em legislações, tais como as Convenções e as Recomendações Internacionais da OIT, e a criação de instituições de defesa de direitos são alguns dos caminhos necessários à promoção do trabalho decente e da facilitação da justiça — além de possibilitar a participação e o diálogo social. Inclusive, o diálogo tripartite e bipartite é outro inexorável mecanismo de construção de políticas e soluções direcionadas à justiça social.

Esses aspectos somados refletem na noção de que economia sustentável e trabalho decente devem caminhar juntas nos países em que se pretenda alcançar a Justiça Social.

Isto é, as políticas macroeconômicas devem ter como objetivo principal a criação de empregos decentes e produtivos, o que pode ocorrer por meio da criação direta de empregos — com investimentos públicos e privados. Ainda, por meio de transformações estruturais ou da superação de desequilíbrios macroeconômicos que possam promover oportunidades de emprego e fomentar outras dimensões da justiça social.

Tem-se, aqui, alguns dos aspectos centrais que, se observados, viabilizararão a formação de uma coalização global para a justiça social convite que tem sido reiterado pelo diretor-geral desde seu discurso de abertura da da 111ª CIT.

Essa iniciativa, diz Houngbo, tem como propósito "fortalecer a capacidade dos países em reduzir as deficiências de justiça social" [3].  Trata-se de uma pretensão de engajamento de outros agentes do sistema internacional (organismos internacionais, agências de financiamento e de fomento) em torno desse objetivo, que se reflete como verdadeira política global cooperativa e de coordenação multilateral.

As discussões sobre o relatório do diretor-geral, bem como novas propostas em direção a um trabalho decente já têm sido realizadas desde o dia 6 de junho e se estenderão até 13 de junho no plenário da conferência. Há uma grande expectativa para que os membros constituintes da OIT discutam as variadas propostas e iniciativas contidas no Relatório e contribuam com os encaminhamentos finais de ações direcionadas a avançar na justiça social.

Os resultados dos debates sobre o relatório serão apresentados ao final da conferência. Por certo, espera-se que a justiça social seja, de fato, afirmada como guia de direcionamento de políticas e da cooperação internacional, assim como se revele como pedra fundamental da recuperação global, conforme pretende Houngbo.

 

___________

[1] Disponível em: ilo.org/digitalguides/en-gb/story/weso2023-key-workers#about

[2] Em 2022, foi aprovada durante a 110ª CIT, a Resolução que inclui o direito ao ambiente de trabalho seguro e saudável no quadro de princípios e direitos fundamentais da OIT no trabalho (ILC.110/Resolução I). Durante a 111ª Conferência, que está sendo realizada entre os dias 5 a 16 de junho, foi aprovado no âmbito do Comitê de Assuntos Gerais o encaminhamento ao plenário para retificação de 15 instrumentos internacionais para acomodar a inclusão deste direito ao quadro fundamental da OIT.

[3] Tradução livre

Autores

  • é ministro do Tribunal Superior do Trabalho, doutorando em Direito (IDP), mestre em Direito (UCB, 2017), coordenador do Comitê Gestor Nacional do Programa Trabalho Seguro e observador na 111ª Conferência Internacional do Trabalho.

  • é ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Coordenador do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo a Aprendizagem da Justiça do Trabalho. MBA em Administração Judiciária pela FGV. Observador na 111ª Conferência Internacional do Trabalho.

  • é assessor de ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Mestre em Direito, Estado e Constituição pela UnB (Universidade de Brasília).

  • é assessora de ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Mestre em Direito, Estado e Constituição pela UnB (Universidade de Brasília).

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