Segunda Leitura

Propósitos e relevância das academias de letras jurídicas do Brasil

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

11 de junho de 2023, 10h17

A natureza jurídica das Academias de Letras Jurídicas é a de uma associação de direito privado, criada nos moldes previstos no artigo 53 do Código Civil e devidamente registrada no Cartório de Títulos e Documentos, em conformidade com o artigo 128, inciso I, da Lei 6.015/73, que trata dos registros públicos.

Para a Academia de Letras Jurídicas de Minas Gerais, uma ALJ "visa proporcionar tanto quanto possível o estudo da ciência jurídica, seja entre seus membros como entre aqueles que nela ainda não ingressaram, sejam advogados, juízes, procuradores ou estudantes".[1]

As Academias de Letras Jurídicas podem ser consideradas um derivativo das Academias de Letras. Manoel Onofre Júnior as vê "tão-somente, na sua condição de alta agremiação literária, capaz de dinamizar a vida cultural, sob o signo da renovação, todavia sem perder de vista as melhores tradições".[2]

É possível criar-se tantas Academias Jurídicas quantas se queira. Porém, o fato é que elas só serão aceitas pela sociedade em razão dos valores que adotam e pela qualidade de seus membros. Em outras palavras, criar uma Academia, valendo-se de pessoas de baixo nível cultural e que não tenham conquistado o respeito de sua comunidade, é a mesma coisa que nada criar.

Em Portugal não há Academias de Letras Jurídicas, mas sim Academia de Ciências. Na capital, atua desde 1779 a Academia de Ciências de Lisboa, localizada no antigo Convento de Nossa Senhora de Jesus da Ordem Terceira de São Francisco, na Rua da Academia das Ciências, n.º 19. As atividades dividem-se em duas classes e cada uma delas divide-se em sete seções. Na chamada Classe de Letras, 5ª Seção, encontram-se Direito e Ciência Política.[3]

A Academia Brasileira de Letras Jurídicas (ABLJ) foi a precursora no Brasil, tendo sido criada no ano de 1975, dela fazendo parte 50 acadêmicos de elevado nível cultural. Segundo o seu site, "ela tem por finalidade o estudo do Direito em todos os seus ramos e, sobretudo, o aperfeiçoamento das letras jurídicas, funcionando de acordo com o Código Civil e as demais leis aplicáveis assim como com as regras estabelecidas neste Estatuto e em seu Regimento Interno". "Ela segue o traço das congêneres inspiradas no modelo francês." [4]

Outras tantas foram criadas nos estados da federação, seguindo os moldes da ABLJ. Regra geral elas se vinculam a uma instituição que as impulsiona, como o Tribunal de Justiça, uma universidade ou a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Algumas academias se destacam por seu tempo de existência, atividades permanentes que extrapolam os limites de uma gestão eficiente.

Uma delas é a Academia de Letras Jurídicas do Paraná (APLJ), à qual pertenço e no momento presido. Foi ela criada em 4 de novembro de 1998 por iniciativa do desembargador Henrique Chesneau Lenz César, com a decisiva participação do advogado João Casillo e do juiz de Direito Albino de Brito Freire. Dela fazem parte 40 acadêmicos, além de beneméritos e honorários. Os seus membros são pessoas reconhecidas no meio jurídico paranaense e nacional, dela fazendo parte, inclusive, um ministro do Supremo Tribunal Federal.

Spacca
Durante os seus quase 25 anos de existência, a APLJ produziu vários números de sua Revista, promoveu concursos de artigos, atividades literárias, seminários jurídicos, sempre trabalhando com outras instituições, como tribunais, a OAB e universidades. [5]

Mas não é fácil manter ativa uma Academia de Letras Jurídicas. Normalmente elas sobrevivem das anuidades pagas por seus membros. E todas as suas atividades exigem serviços voluntários, regra geral feitas pelos acadêmicos ou alguém que lhes preste serviços.

Por exemplo, uma das dificuldades é a atualização dos sites. Como seus membros são pessoas atarefadas, não raramente eles se mostram desatualizados. Este é um dos problemas complexos, pois sem um site eficiente rompe-se a relação com a sociedade. Vejamos, aleatoriamente, algumas academias.

A Academia de Ciências e Letras Jurídicas do Amazonas (ACLJA) possui 50 membros e um site bem estruturado, inclusive revelando a boa iniciativa de doação de livros.[6] Na região Nordeste, a Academia Pernambucana de Letras Jurídicas (APLJ) foi fundada em 3 de maio de 1976, ficou inativa em 1979 e retornou em 1999, 20 anos depois.

A Academia pernambucana tem 53 membros e, além de participantes beneméritos e honorários, possui três membros correspondentes em outros estados, uma boa e incomum iniciativa. [7]

A Academia Paraense de Letras Jurídicas (APLJ) possui um site bem estruturado e interessante, mas as notícias se reportam a fevereiro deste ano.[8] A Academia Mineira de Letras Jurídicas (AMLJ), salvo engano muito vinculada ao TRT-3 (Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região), possivelmente enfrenta dificuldades, pois o seu site não foi localizado e o cadastro está desativado desde 2018.[9] 

Igual é a situação da Academia de Letras Jurídicas do Espírito Santo (Acalejes), que revela proximidade com a OAB [10] e também de Goiás, onde a Academia Goianense de Letras Jurídicas (AGLJ) não exibe maiores informações na internet, limitando-se à ficha cadastral. [11]

A Bahia apresenta situação especial. A academia mostra-se muito ativa, apresenta várias atividades em seu site, inclusive a posse da nova diretoria no dia 23 de maio passado e a realização de um congresso nacional em outubro deste ano.[12]

Ocorre que, no mesmo estado, há a Academia de Letras Jurídicas do Sul da Bahia (Aljusba), com sede em Ilhéus, a qual, segundo o seu site, parece próxima da Ordem dos Advogados.[13] Talvez a enorme extensão geográfica do estado tenha sido a razão de duas academias.

Mas as Academias de Letras Jurídicas não se limitam à brasileira e às estaduais. Há, também, a Academia Internacional de Letras Jurídicas (AILJ), com sede em Brasília e página no Facebook,[14] e outras de âmbito municipal, como a Academia Jundiaiense de Letras Jurídicas (AJLJ), cuja ficha cadastral se encontra na internet. [15]

De todo o exposto, a conclusão a que se chega é que é simples fundar uma Academia de Letras Jurídicas, porém é difícil mantê-la ativa e trabalhando em favor da sociedade e das Ciências Jurídicas. Isto, todavia, não deve desanimar os seus idealizadores, pois tal instituição pode ser um forte fator de desenvolvimento das Ciências Jurídicas na localidade onde se situa. Por exemplo:

  1. promovendo concursos de trabalhos jurídicos junto com entidades parceiras;
  2. estimulando os jovens estudantes de Direito a interessar-se por textos jurídicos de autores locais;
  3. editando uma revista que, na eventual falta de verbas, pode ser digital;
  4. promovendo eventos junto com faculdades de Direito, em especial as de locais menos desenvolvidos;
  5. principalmente, lutar para manter o interesse dos que dela participam;
  6. trabalhar com a Academia Brasileira de Letras Jurídicas e com as congêneres estaduais ou municipais.

Às diretorias da Academias de Letras Jurídicas cabe, com dedicação e criatividade, alcançar estas e outras metas. O Brasil merece.

 

[2] PAPCultura. Algumas considerações a respeito da Academia de Letras., 21 nov. 2019. Disponível em: https://papocultura.com.br/consideracoes-sobre-a-academia-de-letras/. Acesso em 8 jun. 2023.

[3] PORTUGAL. Academia de Ciências de Lisboa. Disponível em: https://www.acad-ciencias.pt/. Acesso em 9 jun. 2023.

[4] Academia Brasileira de Letras Jurídicas – ABLJ. Disponível em: http://www.ablj.org.br/ablj.asp. Acesso em 8.jun. 2023.

[5] PARANÁ. Academia Paranaense de Letras Jurídicas – APLJ. Disponível em: https://aplj.com.br/. Acesso em 8 jun. 2023.

[6] AMAZONAS. Academia de Ciências e Letras Jurídicas do Amazonas. – ACLJA. Disponível em: https://www.aclja.com/. Acesso em 10 jun. 2023.

[7] PERNAMBUCO. Academia Pernambucana de Letras Jurídicas – APLJ. Disponível em: http://www.loveira.adv.br/aplj/index.htm. Acesso em 10 jun. 2023.

[8] PARÁ. Academia Paraense de Letras Jurídicas – APLJ. Disponível em: https://aplj.org/. Acesso em 8 jun. 2023.

[9] MINAS GERAIS. Academia Mineira de Letras Jurídicas – AMLJ. Disponível em:

[10] ESPÍRITO SANTO. CAAES OAB. Disponível em: https://caaes.com.br/a-academia-de-letras-juridicas-do-estado-do-espirito-santo-abre-processo-seletivo/. Acesso em 10 jun. 2023.

[11] GOIÁS. Academia Goianense de Letras Jurídicas – AGLJ. Disponível em: https://cnpj.biz/14303412000105. Acesso em 10 jun. 2023.

[12] BAHIA. Academia de Letras Jurídicas da Bahia – ALJB. Disponível em: https://aljba.org.br/. Acesso em 10 jun. 2023.

[13] BAHIA, SUL. Academia de Letras Jurídicas do Sul da Bahia – ALJUSBA. Disponível em: http://www.academiadeletrasjuridicasdosuldabahia.com/. Acesso em 10 jun. 2023.

[14] BRASÍLIA. Academia Internacional de Letras Jurídicas – AILJ. Disponível em: https://www.facebook.com/profile.php?id=100076207573356. Acesso em 10 jun. 2023.

[15] JUNDIAÍ – SP. Academia Jundiaiense de Letras Jurídicas – AJLJ. Disponível em: https://cnpj.biz/10873561000159. Acesso em 10 jun. 2023.

Autores

  • é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná; pós-doutor pela FSP/USP, mestre e doutor em Direito pela UFPR; desembargador Federal aposentado, ex-Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região. Foi Secretário Nacional de Justiça, Promotor de Justiça em SP e PR, presidente da International Association for Courts Administration (Iaca), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

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