Cruzada cristã

Decisão da Suprema Corte desencadeia novos casos de discriminação nos EUA

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13 de julho de 2023, 10h21

Na pegada ainda fresca da decisão da Suprema Corte dos EUA a favor de uma designer evangélica do Colorado que não quer criar sites para celebrar casamentos gays, porque isso violaria sua fé cristã e seu direito à liberdade de expressão, a proprietária de um salão de beleza, em Michigan, anunciou que não atenderá clientes transgêneros ou queers.

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Decisão da Suprema Corte pavimentou caminho para novos casos de preconceito

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Christine Geiger postou no Facebook, na conta empresarial de sua firma, Studio 8 Hair Lab, sediada em Traverse City: "Se um humano se identifica como outra coisa que não um homem ou uma mulher, por favor, busque serviços em uma salão para animais de estimação. Você não é bem-vindo neste salão. Ponto final."

A dona do salão se escorou na decisão da Suprema Corte para defender sua atitude: o direito à liberdade de expressão, orientada por sua fé religiosa, sobrepõe-se às leis que proíbem discriminar minorias.

O mesmo argumento foi prontamente usado por uma organização cristã para defender uma escola católica que demitiu um professor depois que ele anunciou que ia se casar com outro homem.

Em outubro de 2014, duas semanas depois que o casamento entre pessoas do mesmo sexo foi legalizado na Carolina do Norte, Lonnie Billard anunciou sua união matrimonial com o parceiro com o qual vivia havia 14 anos. Dias depois, foi demitido. Billard processou a escola em 2021, por discriminação com base em sexo, e ganhou.

Algum tempo mais tarde, a organização conservadora Becket Fund for Religious Liberty, que representa a escola católica, recorreu ao Tribunal Federal de Recursos da 4ª Região, em Virgínia. No início do mês, a organização protocolou uma emenda a sua petição inicial, argumentando que a decisão da Suprema Corte dava nova sustentação a seu caso.

Uma semana depois, a mesma organização defendeu, no Tribunal de Recursos da 7ª Região, em Chicago, a Escola Católica de Indianápolis, que demitiu um de seus conselheiros pelo mesmo motivo, também sustentando a defesa no caso "303 Creative", como já é chamada a decisão da Suprema Corte em 303 Creative LLC v. Elenis.

"Se a Primeira Emenda (da Constituição dos EUA) protege a decisão de uma empresa sobre que serviços oferecer ao público, ela protege a decisão da igreja sobre quem é qualificado religiosamente para cumprir a missão de uma escola religiosa", escreveu o advogado Luke Goodrich, em nome da Becket Fund, na emenda à petição inicial.

O professor da Faculdade de Direito da George Washington University duvida que a Suprema Corte vá reconhecer a liberdade de expressão da escola católica: "Pelo fato de que ele anunciou o casamento gay no Facebook e não no campus da escola, nem em seu trabalho, você não pode atribuir essa 'expressão' à escola".

No caso da dona do salão, o presidente do capítulo da American Civil Liberties Union (ACLU) em Michigan, Nathan Triplett, escreveu na mídia social que, ao contrário do que ela reivindica, recusar serviço a alguém por causa da identidade de gênero viola a lei Elliott-Larsen Civil Rights Act de Michigan.

"Essa lei estadual, de 1977, tornou ilegal discriminar com base em religião, raça, idade, peso, sexo e outras características. E foi emendada, posteriormente, para incluir liberdade de gênero e expressão", segundo Triplett.

Reação inversa
A procuradora-geral do Arizona, Kris Mayes, declarou que não vai executar a decisão da Suprema Corte no caso "303 Creative". Ao contrário, o estado continuará processando empresas que discriminarem contra minorias.

"Se qualquer cidadão do Arizona for vítima de discriminação em um lugar público, com base em raça, cor, religião, sexo (incluindo orientação sexual e identidade de gênero), nacionalidade ou descendência, pode apresentar uma queixa na Procuradoria-Geral. Continuarei a executar a lei sobre acomodações públicas em toda sua extensão", ela declarou.

O Arizona tem uma lei semelhante à do Colorado. Ambas proíbem empresas de negar produtos e serviços ao público, com base em qualquer tipo de discriminação.

"A decisão da Suprema Corte foi desgraçadamente equivocada. A corte emitiu uma licença para discriminar. O efeito imediato e simbólico dessa decisão é o de atribuir a gays e lésbicas o status de segunda classe. Não no Arizona", declarou a procuradora-geral.

Ela disse concordar com o voto dissidente da ministra Sonia Sotomayor, segundo o qual a ideia de que a Constituição dá às empresas o direito de discriminar "é profundamente errada".

A ministra escreveu: "Hoje, a corte, pela primeira vez em sua história, garante a empresas abertas ao público o direito constitucional de recusar serviços a membros de uma classe protegida.”
Com informações adicionais das publicações News Nation, HaffPost, The Kansas Star, Raw Story, The Detroit News e The Washington Post.

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