Opinião

A incompleta metamorfose do STF

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28 de janeiro de 2023, 9h26

Em 14 de dezembro de 2022, os ilustres ministros do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, firmaram duas decisões importantes: primeira, todas as decisões monocráticas urgentes, tomadas pelo ministro relator do processo, devem ser levadas à imediata apreciação dos demais ministros, no colegiado competente, turma ou plenário, de preferência pelo sistema de votação virtual e, segunda, quando um ministro pedir prazo para estudar o processo, paralisando um julgamento, caso não apresente seu voto em 90 dias para continuidade, o processo será incluído automaticamente na pauta de julgamento seguinte.

A nova postura do Supremo deve ser festejada, pois representa uma virada histórica fundamental, reclamada há muito tempo pelos juristas e pela sociedade. Mostra a grandeza dos componentes da Corte, ao reconhecer disfuncionalidades nos procedimentos processuais e decidir por mudanças correcionais, no sentido de fortalecer a indispensável colegialidade e autocontenção de poder.

A efetiva realização do que foi decidido é dada como certa, pois é a palavra unânime da Suprema Corte, que não pode ser desrespeitada, nem mesmo pelos seus membros. Muitos juristas de renome já destacaram a importância e grandeza desse acontecimento. Destacamos dois, por representarem resumidamente a importância desta esperada mudança.

Disse Celso de Mello, ministro aposentado do STF: "A reforma regimental em questão, viabilizada sob a égide da presidência da ministra Rosa Weber, responde, com segurança e objetividade, à exigência legítima dos cidadãos da República que querem a instituição, em nosso País, de um sistema de administração da justiça que seja politicamente independente, processualmente célere, tecnicamente eficiente e socialmente eficaz[1].

Em esclarecedor artigo, o renomado jurista José Miguel Garcia Medina, concluiu que "a depender do modo como a reforma se implementar, podemos estar diante de uma das mais importantes transformações pelas quais passou o Supremo, em tempos recentes. Não será demasiado dizer que poderemos ter, doravante, um novo Supremo Tribunal Federal" [2].

A metamorfose, mesmo com as duas medidas impactantes acima, ainda não está completa. Dois outros pontos de estrangulamento precisam ser enfrentados. Primeiro, a exagerada competência processual do STF, decorrente da amplitude do texto constitucional, funcionamento como corte constitucional, tribunal de recursos e foro privilegiado para casos excepcionais. Segundo, por consequência, o tenebroso número de processos encaminhados à Corte (por volta 75 mil por ano, um desatino na comparação com cortes similares), impossível de ser vencido pelos onze ministros em prazo razoável e compatível com as urgências da modernidade.

Tangenciando estes dois pontos, Haderlann Chaves Cardoso, especialista em Direito Constitucional, afirmou "que será um desafio para o STF conciliar os novos prazos regimentais com o volume de processos que chegam ao Supremo. Apesar da alteração, acredito que o desafio ainda será conciliar o cumprimento do prazo regimental com o elevado volume de processos que tramitam na Corte" [3]

A regulação de prazo máximo para devolução de processo em julgamento, sob pena de automática inclusão na pauta seguinte e o encaminhamento obrigatório de decisão monocrática do  relator aos demais ministros do colegiado para votação eram necessidades incontornáveis, agora atendidas. Da mesma forma, a redução da amplíssima competência processual e redução do número de processos encaminhado à Suprema Corte, também são necessidades incontornáveis para administração de justiça que seja politicamente independente, processualmente célere, tecnicamente eficiente e socialmente eficaz, na feliz fórmula de Celso de Mello acima.

Concluindo, o Supremo precisa completar essa transformação, liderando e encaminhando mudança constitucional para compatibilizar sua competência processual, transferindo aos tribunais superiores a responsabilidade para conclusão definitiva de processos subjetivos, de interesse privado e particular, reduzindo massivamente a entrada de processos e recursos, permitindo que a Corte invista seu precioso tempo em questões objetivas de interesse nacional, assim podendo entregar à sociedade brasileira segurança jurídica em tempo razoável, cumprindo com eficiência sua função constitucional de pacificar com justiça. O STF ainda tem escolhas cruciais para fazer, para o bem do Brasil.

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