Os eventos de 8/1 e a lacuna a ser preenchida na legislação trabalhista
20 de janeiro de 2023, 8h00
Os eventos de 8 de janeiro, em Brasília, despertaram, em alguns, a preocupação da possível aplicação de punição aos participantes com a perda do emprego por justa causa, considerando o tamanho das ofensas morais e materiais ao patrimônio nacional, com cenas repugnantes e que jamais deveriam figurar na história política do Brasil. As autoridades públicas já estão cuidando das penalidades para aqueles que são servidores públicos ou militares, flagrados na depredação.
É inconteste que há muito tempo a legislação trabalhista se afastou de um modelo capaz de trazer ao cidadão, que tem um emprego, expectativas duradouras e que possam dar a oportunidade de construir um futuro. As exceções são raras. O emprego com descarte barato parece ser a tônica do desprezo recíproco, e o emprego sem criar raiz acaba gerando a percepção de exclusão e não pertencimento a qualquer tipo de grupo capaz de fazer a diferença na sociedade.
A valorização do emprego e suas garantias, para que a sociedade possa pensar na construção de um futuro melhor, deveriam ser objeto de pauta nas mudanças da legislação trabalhista.
A Constituição Federal de 1988 deixou uma lacuna que o Legislativo não conseguiu ainda resolver. Com efeito, a Carta trouxe como única forma de garantia de reparação do tempo trabalhado pelos empregados o FGTS e excluiu de uma vez por todas a antiga indenização pelo tempo de serviço previsto na CLT. O FGTS transformou-se em verba de natureza trabalhista, crédito ao qual se aplica a prescrição quinquenal em detrimento da trintenária prevista na Lei nº 8.036/1990.
O artigo 7º, em seu inciso I, prevê, como princípio, que a relação de emprego seria protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, com a previsão de que norma complementar viria a estabelecer o indenização correspondente. A norma complementar, como era de esperar, não veio e, portanto, em caso de rescisão contratual não há indenização legal que seja aplicada e que venha reparar o tempo de serviço.
Dito isto, a discussão sobre a apreciação, pelo STF, da inconstitucionalidade (ADI 1.625) do Decreto nº 2.100 de 1996, editado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, que cancelou a aplicação da Convenção 158 da OIT, traz preocupações porque, à época, utilizou-se da lei do FGTS para justificar sua inaplicabilidade, considerando que a lei nacional já previa um procedimento e uma forma de reparação da perda de emprego.
Ocorre, todavia, que o conceito do FGTS se alterou e passou a ser considerado crédito trabalhista e não verba de natureza indenizatória, deixando in albis a previsão de indenização pelo tempo de serviço. Desta feita, a análise do Decreto 2.100, no seu tempo, parece prevalecer relativamente ao conteúdo de adequação da lei trabalhista nacional aos termos da Convenção 158.
Outra situação, entretanto, seria a análise da Convenção e seus termos nos dias atuais em que o emprego se revela com pouca aderência de seu significado interno nas empresas, tendo, na maioria das situações, perdido seu valor e sua capacidade de gerar esperanças que ultrapassem o período de aviso prévio.
Portanto, fica a reflexão de que não parece fora de propósito a preocupação dos rumos que poderão ser tomados pela decisão do Supremo Tribunal Federal quanto à inconstitucionalidade do Decreto 2.100 de 1996 e de que forma se daria a aplicação da Convenção 158 da OIT, nas relações de emprego, diante da inoperância do Legislativo na elaboração e aprovação da norma complementar de que trata o artigo 7º, I, da Constituição Federal.
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