Opinião

TJ-RJ aumenta o valor dos emolumentos para realização de inventário extrajudicial

Autor

  • Gabriel de Britto Silva

    é advogado especializado em direito imobiliário e participante da comissão de arbitragem do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ubradim) e da OAB/RJ.

17 de janeiro de 2023, 13h14

Estamos na era dos meios adequados, seja de soluções de conflitos, seja de soluções para os atos da vida desprovidos de conflitos, como é o caso da realização de inventário amigável. E, comprovadamente, a via mais adequada para o inventário não é a jurisdição estatal, não é o Poder Judiciário.

Com base nessa via mestra, surgiu a Lei 11.441/2007, relativa ao inventário e à partilha extrajudiciais, tendo como intuito simplificar a realização da partilha consensual por meio de escritura pública, e, ainda, desafogar o Poder Judiciário, utilizando-se, em substituição, os oficiais de registro para a realização do procedimento.

O número de inventários feitos em cartórios de notas de todo o país registrou aumento de 40% em 2021 na comparação com 2020. Em 2021, 219.459 escrituras foram lavradas no país, em comparação a 156.706 feitas em 2020.

Segundo o Colégio Notarial do Brasil  Conselho Federal (CNB/CF), o número de inventários realizados em 2021 foi 88,7% maior na comparação com a média de atos praticados entre os anos de 2007 a 2020  116.278 escrituras.

Porém, apesar de a lei ter aberto caminho e fomentado a desjudicialização do inventário, e ter sido acolhida e utilizada de forma intensa e crescente ao longo dos anos pelos herdeiros, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro irá romper essa crescente em 2023 no âmbito do estado do Rio, fruto da sua compulsão arrecadatória, inviabilizando a realização do extrajudicial, ante o aumento desproporcional e irrazoável dos emolumentos incidentes por esse ato.

Houve aumento pelo TJ-RJ para 2023 de cerca de 11 vezes o valor máximo em relação ao ano de 2022 quanto à lavratura de escrituras extrajudiciais de inventário. O teto passou de R$ 8.032,26 em 2022 para R$ 90.253,61 em 2023.

Através do artigo 19 da Portaria CGJ Nº 1952/2022 da Corregedoria Geral de Justiça do TJ-RJ, vigente a partir de 05/01/2023: "O valor teto dos emolumentos para lavratura das escrituras de inventário e partilha de bens, conforme previsto na Lei Federal nº 11.441/2007, será de R$ 90.253,61, já incluídos os correspondentes acréscimos legais e tributos". Portaria expedida pelo desembargador Ricardo Rodrigues Cardozo, Corregedor-Geral da Justiça.

Já, a Portaria CGJ Nº 1863/2021 vigente em 2022, também expedida pelo desembargador Ricardo Rodrigues Cardozo, corregedor-geral da Justiça, o seu artigo 21, assim previa: "O valor teto dos emolumentos para lavratura das escrituras de inventário e partilha de bens, conforme previsto na Lei Federal nº 11.441/2007, será de R$ 8.032,26, já incluídos os correspondentes acréscimos legais e tributos".

O aumento mostra-se irrazoável, desproporcional, excessivo, confiscatório e completamente infundado, devendo ser revisto imediatamente. O aumento do valor do teto em 11 vezes não encontra base fática e o valor do teto de R$ 90.253,61 também não encontra precedente em qualquer dos demais Estados da federação. Apresenta-se como o maior teto do país.

Como exemplo, o TJ-SP em 2022, para inventários com valor envolvido de até R$ 3.252.289, apresenta o valor de R$ 8.425,49 a título de emolumentos. Já para valores superiores acima de R$ 29.270.600,01, tem-se o montante de R$ 53.922,98 a título de emolumentos. Ou seja, o teto em SP, em 2022 era de R$ 53.922,98. E, em 2023, para inventários com valor envolvido de até R$ 3.485.249,01, há o valor de R$ 11.737,66 a título de emolumentos. Já para valores superiores acima de R$ 31.367.243,01, tem-se o montante de R$ 57.785,47 a título de emolumentos. Ou seja, o teto em SP em 2023 é de R$ 57.785,47.

Já, o TJ-MG, em 2022, tinha como teto o valor de R$ 8.839,71, considerando que para todo valor de inventário acima de R$ 3.200.000, se pagaria R$ 8.839,71 a título de emolumentos. O valor do teto, em 2023, aumentou para R$ 9.333,74.

O TJ-ES, 2022, em 2022, tinha como teto o valor de R$ 5.927,55, considerando que para todo valor de inventário acima de R$ 200.000,01, se pagaria R$ 5.927,55 a título de emolumentos. Ainda não foi disponibilizada a tabela referente a 2023.

O TJ-RS, em 2022, tinha como teto o valor de R$ 4.425,70, considerando que para todo valor de inventário acima de R$ 1.001.598,90, se pagaria R$ 4.425,70 a título de emolumentos. O valor do teto, em 2023, aumentou para R$ 4.752,80.

O TJ-PE, em 2022, tinha como teto o valor de R$ 5.832,96, considerando que para todo valor de inventário acima de R$ 201.000,01, se pagaria R$ 5.832,96 a título de emolumentos. O valor do teto, em 2023, aumentou para R$ 6.177,10.

A alteração ocorrida no Rio de Janeiro não tem qualquer correlação com o custo estatal despendido para prestação dos serviços e viola diversos direitos e garantias constitucionais, dentre eles o direito à vedação de utilização de tributo com efeito de confisco e, especialmente, o direito de acesso aos meios extrajudiciais de pacificação dos atos da vida, aí repousando a realização de inventário de forma extrajudicial. Os emolumentos devem servir de custeio das atividades cartorárias dos ofícios de notas, guardando com elas proporcionalidade, jamais podendo adquirir nítido cunho confiscatório, como no caso. Além de comprometer o exercício do direito constitucional ao acesso aos meios extrajudiciais e de inviabilizar a efetividade da Lei Federal nº 11.441/2007, ainda exterioriza insensibilidade do TJ-RJ à realidade dos contribuintes.

A sustação imediata dos efeitos do artigo 19 da Portaria CGJ Nº 1952/2022 da Corregedoria Geral de Justiça do TJ-RJ é medida que se impõe.

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