Opinião

Holdings patrimoniais na mira: os impostos fora da reforma tributária

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28 de agosto de 2023, 13h17

Quando vemos que o tema do momento é a reforma tributária e os tributos sobre o consumo, deixamos de pensar nos reflexos sobre outros impostos, que certamente sofrerão uma revisão com voracidade incomparável.

Nas PECs principais (45 e 110), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre Serviços (ISS) saem do controle dos estados e municípios. Isso muda toda a estrutura organizacional e operacional dos fiscais e procuradores destes entes.

Sem o que hoje é seu principal âmbito de atuação, será necessário focar nos impostos remanescentes sob seu controle. Os municípios olharão para o IPTU, que não têm muito o que mudar, e para o ITBI, que foi tema recente de recursos relevantes no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF).

Já os estados podem mirar no IPVA, que também é excessivamente travado, ou no ITCMD que, em verdade, consolida todo acúmulo patrimonial da vida de absolutamente todos os contribuintes.

Certamente, não serão os impostos sobre propriedade que entrarão na pauta fiscal, mas os impostos sobre transferências patrimoniais. Nada faz mais sentido do que isso!

Tentar aumentar um pouco o quanto o cidadão, inclusive o de mais baixa renda, paga para manter sua casa e seu carro é muito mais limitado do que olhar com mais atenção sobre os incontáveis negócios patrimoniais que são realizados a cada dia e que, atualmente, não se mostram relevantes quando comparados aos resultados financeiros da tributação de serviços ou da circulação de mercadoria.

Será que os imóveis estão realmente mudando de mãos? Pelo preço que as partes livremente dizem? Será que os pais só transferem bens a seus filhos no fim da vida? E pelo valor usado para a construção do patrimônio? 

Ou, sem ter que olhar para o ISS e ICMS, é possível achar caroços nesses angus? 

Já é possível notar movimentação relevante ocorrendo exatamente nessa linha. Se é difícil aumentar impostos (pela capacidade econômica dos contribuintes ou pelo capital político necessário à mudança impopular); se é ainda mais difícil torná-los progressivos, o mesmo não se pode dizer de estar mais atento ao que já acontece.

 Os municípios vêm se valendo dos precedentes judiciais para exigir tributos em negócios antes ignorados, em especial na incorporação de bens em holdings. Os estados, por sua vez, além de terem — em muitos casos — aumentado a alíquota do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), vêm buscando reavaliar as bases de cálculo do tributo; mais uma vez, especialmente em Holdings e na transferência de suas quotas.

Isso coincide com uma perspectiva adicional de aumento do teto do imposto sobre heranças de 8% para 20%, com declarações públicas favoráveis expressas, tanto do presidente quanto do ministro da Fazenda. Para isso, basta dar continuidade à PEC 96/15 (criada justamente no último governo petista, com apoio unânime do Confaz). A medida tem uma lógica econômica muito palatável e razoável, pois é realmente apta a reduzir a concentração de renda, sem ser tão polêmica quanto a tributação de grandes fortunas.

Por outro lado, o movimento acaba coincidindo com um movimento derivado da pandemia e do caos tributário em que o uso de holdings familiares aumentou exponencialmente — algumas das quais com exclusiva finalidade de evitar Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e ITCMD, usando valores históricos dos bens que não correspondem a seu valor de mercado.

Mesmo no âmbito federal, as holdings costumam minimizar impactos de Imposto de Renda sobre aluguéis e sobre o ganho de capital imobiliário, principalmente considerando a isenção sobre a distribuição de dividendos; outro assunto que marginalizado nos projetos de reforma tributária priorizados e que, para ser modificado, não depende de uma coordenação política tão intensa assim.

Em outras palavras, nota-se a possibilidade de criação de uma tempestade perfeita para o planejamento patrimonial por meio de holdings. Todos os tributos envolvidos nesse instrumento jurídico estão fora do âmbito da reforma tributária e dentro de um novo e necessário redirecionamento do contingente de pessoal dedicado à administração tributária pré-reforma.

Nessa linha, é uma ilusão acreditar que a movimentação política dos financistas e tributaristas deve limitar-se aos tributos da reforma (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS). É imperativo que os assessores tributários de grandes empresários e proprietários de bens considerem também os reflexos em outros tributos e se antecipem às prováveis mudanças. A crença de que discutimos uma reforma limitada é uma visão incompleta, com sérios riscos.

Autores

  • é advogado especializado em planejamento patrimonial, nova economia, assuntos digitais, sócio da LBZ Advocacia, especialista em Processo Civil pela PUC-SP, mestre em Direito Constitucional, MBA em Gestão Tributária pela Fipecafi, com extensão em Direito Internacional em Genebra, em Direito Falimentar pela FGV, em Estratégias de Mentoria Empresarial e Liderança por Harvard, LL.M. em Direito Societário e Direito do Mercado Financeiro e de Capitais, acadêmico de Economia e entusiasta de blockchain e criptoativos.

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