Divergência aberta

Zanin vota contra descriminalização do porte de maconha e Mendonça pede vista

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24 de agosto de 2023, 19h14

O Supremo Tribunal Federal voltou a julgar nesta quinta-feira (24/8) a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. No entanto, o julgamento, que está 5 a 1 pela descriminalização, foi paralisado novamente por pedido de vista do ministro André Mendonça. 

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Corte analisa descriminalização do
porte de drogas para consumo próprio
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Votaram na sessão desta quinta os ministros Cristiano Zanin e Rosa Weber, presidente do tribunal. Gilmar Mendes, relator do caso, ajustou seu voto para restringir a descriminalização ao porte de maconha. Anteriormente, ele havia entendido pela necessidade da descriminalização do porte para consumo próprio de todas as drogas (saiba mais abaixo). 

Para Zanin, o artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que está em discussão, é o único dispositivo existente na legislação brasileira a diferenciar usuários e traficantes. Assim, não é possível declarar a inconstitucionalidade do trecho.

Ele, no entanto, defendeu a diferenciação e propôs a fixação de tese no sentido de que deve ser considerado usuário aquele que porta até 25 gramas de maconha, ou seis plantas fêmeas. Para Zanin, a proposta deve valer como parâmetro adicional, mantidos os critérios já existentes na Lei de Drogas. 

"A mera descriminalização do porte de drogas para consumo apresenta problemas jurídicos e pode agravar a situação que enfrentamos na problemática do combate às drogas, que é dever constitucional. Não tenho dúvida de que os usuários são vítimas do tráfico e das organizações criminosas ligadas à exploração ilícita dessas substâncias, mas se o Estado tem o dever de zelar por todos, a descriminalização poderá contribuir ainda mais para esse problema de saúde", afirmou Zanin.

Ainda segundo ele, embora a legislação brasileira sobre drogas precise "evoluir", não é possível declarar a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas. "Como já expus, esse é o único parâmetro relativamente objetivo para diferenciar a situação do usuário da do traficante." 

Zanin propôs a fixação da seguinte tese de repercussão geral:

1) É constitucional o artigo 28 da Lei 11.343.
2) Para além dos critérios estabelecidos no parágrafo 2º do artigo 28 da Lei 11.343 para diferenciar o usuário de maconha do traficante, o tribunal fixa, como parâmetro adicional, a quantia de 25 gramas ou seis plantas fêmeas para configuração de usuário da substância, com a possibilidade de reclassificação para tráfico mediante fundamentação exauriente das autoridades".

Gilmar reajusta voto
O caso começou a ser julgado em 2015, com o voto do relator. Na ocasião, Gilmar propôs que a posse de qualquer droga para uso pessoal não poderia ser considerada crime, sob pena de ofensa à privacidade e à intimidade do usuário. 

À época, também votaram pela descriminalização, mas apenas do porte de maconha, os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. O caso foi paralisado em setembro de 2015 por pedido de vista do ministro Teori Zavascki, morto em acidente de avião em 2017.

O caso foi retomado na sessão do último dia 2, com o voto do ministro Alexandre de Moraes, sucessor de Teori Zavascki. Alexandre propôs a fixação de parâmetros objetivos para diferenciar usuários de maconha e traficantes.

Nesta quinta, Gilmar reajustou o voto para restringir a descriminalização ao porte de maconha. E o ministro também entendeu, nos termos do voto de Alexandre, que não é tráfico o porte de até 60 gramas de maconha ou de seis plantas fêmeas. 

Depois do ajuste, votou Zanin. E, após a divergência aberta pelo novo ministro do Supremo, Mendonça pediu vista. Rosa Weber, que se aposentará no final do mês que vem, decidiu adiantar o voto. Ela se manifestou pela descriminalização. 

"Tipificar o porte de drogas para consumo pessoal potencializa o estigma que recai sobre o usuário e acaba por aniquilar os efeitos pretendidos pela própria lei no atendimento, tratamento e reinserção econômica dos usuários e dependentes de drogas", disse a ministra. 

"Essa incongruência normativa, alinhada à ausência de objetividade na distinção entre usuário e traficante, além de incrementar o estigma social sobre o usuário, fomenta a condenação do usuário como se traficante fosse", prosseguiu. 

Os votos foram dados no julgamento do Recurso Extraordinário 635.659, que discute a descriminalização do porte para uso próprio. O tribunal analisa o crime previsto no artigo 28 da Lei de Drogas, que fixa penas para quem "adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização". 

Em tese, as penas previstas na norma não deveriam levar à prisão — no máximo, às demais consequências de um processo penal. Na prática, no entanto, a falta de distinção clara pode fazer — e tem feito — com que usuários sejam classificados como traficantes, ficando sujeitos a penas privativas de liberdade.

RE 635.659

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