Opinião

Limitações da governança corporativa na evitabilidade de fraudes

Autor

  • David Rechulski

    é advogado fundador e sócio titular do escritório David Rechulski Advogados especializado em Direito Penal Empresarial e Público.

20 de agosto de 2023, 6h06

A importância de se implementar e aprimorar as boas práticas de governança nas empresas e corporações é tema relevantíssimo, pois a qualificação das estruturas de governança corporativa gera maior valor às empresas que as adotam, bem como mais segurança e retorno aos acionistas e investidores. Para além disso, buscam garantir que as corporações estejam em compliance com as legislações às quais estão sujeitas.

Pouco se fala, contudo, das limitações da governança corporativa e, não raro, os menos entendidos tentam equivocadamente atribuir-lhe papel policialesco, dotado de pseudopoder e aptidão onisciente e onipresente para assegurar de maneira absoluta que fraudes ou outras condutas impróprias jamais possam ocorrer.

Spacca
Quem envereda por esse caminho se esquece de que a governança corporativa se edifica sobre os pilares fundamentais da confiança e da presunção de lisura, sem os quais haveria um engessamento absoluto de qualquer agir ou decidir, seja no âmbito de uma empresa ou da própria sociedade.

Quando a premissa da confiança é violada e o agente interno burla os mecanismos de controle, a vigilância dos órgãos de auditoria e das instâncias de gestão, é de se convir que as melhores práticas de governança corporativa poderão ser insuficientes para impedir ou descortinar uma fraude requintada.

Portanto, na ocorrência de uma fraude ou de um evento lesivo, é preciso ter claro que isso não significa que tenha a priori havido insuficiência de governança, seja sob a perspectiva de faltas ou falhas de controles internos e externos, de políticas de compliance, ou mesmo de diligência da alta administração.

As boas práticas de governança não são um "colete à prova de tudo", ou seja, não são aptas para impedir, de forma absoluta, toda e qualquer possibilidade de fraude, pois essas, quando sofisticadas, certamente são arquitetadas para burlar as balizas criadas para evitá-las, sobretudo quando os fraudadores conhecem os mecanismos de controles existentes.

Da mesma forma, não é possível exigir que qualquer órgão de governança ou controles internos parta da premissa de que todos são criminosos. Assim, se não há razões factuais para desconfiança alicerçada em concretudes, seja da veracidade de informações prestadas, seja da idoneidade de indivíduos, qual o racional lógico para uma desconfiança generalizada em tudo e contra todos?

Quem assim sustenta são os profetas do passado, que, após ocorrido o evento, olhando-o do conforto do presente para o passado, pelo retrovisor do tempo, dizem que qualquer um teria sido capaz de antevê-lo. Será?

Em resumo, as boas práticas de governança corporativa ou os órgãos de controle interno e externo, bem como a alta gestão, não podem nem devem ser instantaneamente pré-julgados e automaticamente condenados como se falhos, omissos ou coniventes fossem ante a ocorrência de alguma irregularidade ou fraude, pois não existe escudo protetor invencível em nenhuma prática de gestão de integridade e compliance; e não será nenhum overcompliance que vai se prestar a tanto!

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