Ficou na promessa

Após mudanças no Senado, Marco das Garantias terá impacto reduzido

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19 de agosto de 2023, 8h49

Um dos principais objetivos da criação do Marco Legal das Garantias de Empréstimos (PL 4.188/2021) era desafogar o Poder Judiciário e dar mais agilidade à recuperação de ativos. O texto aprovado pelo Plenário do Senado no último dia 5 de julho, contudo, deixou de fora o capítulo sobre execução extrajudicial, o que reduziu o impacto do novo regramento e sua possibilidade de diminuir a litigiosidade.  

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Texto aprovado do Marco Legal das Garantias de Empréstimos ficou muito aquém do que poderia, dizem especialistas
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Essa é a opinião majoritária de estudiosos do assunto ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico. O advogado Pedro Almeida,  especialista em Direito Societário e Recuperação Judicial no escritório GVM Advogados, acredita que, apesar de ser positiva para o mercado, a lei não vai diminuir o número de processos. 

"Mecanismos adicionais de recuperação de crédito otimizam a cobrança de devedores solventes, mas grande parte da inadimplência e das execuções existentes decorrem de devedores insolventes ou de casos de ocultação de patrimônio. O Marco Legal das Garantias não apresenta uma solução satisfatória para essas situações, cuja resolução perpassa, necessariamente, por mecanismos extrajudiciais de execução, tal qual já ocorre com a alienação fiduciária", explica. 

Almeida não é o único que acredita que uma oportunidade de desafogar o Judiciário foi perdida. "A lei perdeu um de seus principais objetivos, que consistia no desafogo ao Poder Judiciário, já que os credores poderiam executar as garantias diretamente no cartório extrajudicial, independentemente da necessidade de provocar o Poder Judiciário para tanto", lamenta Vitor Magalhães da Silva, advogado especialista em finanças corporativas e sócio do escritório Gouveia Zakka Sociedade de Advogados.

José Arnaldo Cione Filho, sócio do LCSC Advogados, queixa-se do fato de a ideia original do Marco das Garantias ter sido deixada de lado na tramitação do texto no Senado Federal. "A principal ideia do legislador era 'desjudicializar' a recuperação de créditos inadimplentes ao propor a criação de um sistema extrajudicial de recuperação de crédito que consistiria na implantação de um sistema eletrônico, gerenciado por um chamado 'agente de execução', que é o tabelião de protesto. Ou seja, seria uma delegação da cobrança judicial para os serviços de protesto."

Segundo ele, o texto aprovado não permite ter a expectativa de que a lei diminua os gargalos que existem hoje no Poder Judiciário e que tiram a eficiência da recuperação de crédito. "Não que a proposta, caso aprovada com a chamada 'desjudicialização', fosse resolver de pronto ou mesmo desafogar o Judiciário. Até porque outras estruturas precisariam ser criadas para essa nova demanda", pondera. 

Desjudicialização relativa
Marcela Cavallo, advogada especializada em Direito Empresarial do Zilveti Advogados, defende que mesmo que o capítulo sobre recuperação judicial não tivesse sido retirado, o impacto da lei não seria tão grande quanto o imaginado. 

Ela explica que o fato de meios de recuperação extrajudicial reduzirem a inadimplência não significa menos judicialização. "Além do mais, existem contratos já vigentes que poderiam ser beneficiados com a execução extrajudicial, o que não vai acontecer agora. O grande apelo do projeto era não só possibilitar lastro aos financiamentos, de forma a diminuir os custos, mas também viabilizar ao garantidor uma maior agilidade da recuperação destas garantias, o que não ocorrerá da forma como foi aprovado", lamenta. 

Marcela acredita que, em um país como o Brasil — cujo endividamento atinge mais de 70% das famílias — , a recuperação de ativos, invariavelmente, vai ser resolvida pelo Judiciário.

Entendimento parecido tem o tributarista Augusto Fauvel: "A questão do impacto nesse cenário seria relativa. O juiz poderia ficar com menos trabalho, mas os cartórios e oficiais de Justiça poderiam ficar sobrecarregados". 

O advogado Rodrigo Luís Kanayama, por sua vez, defende a importância dos meios extrajudiciais. "Esperamos que o Congresso Nacional aprove o PL 6.204 em breve, que ainda está em debate. O foro extrajudicial será um parceiro do Poder Judiciário na melhoria das condições para cobrança de dívidas", diz.

O PL 6.204 tratar de disciplinar meios extrajudiciais da execução civil e tramita na Câmara dos Deputados. Bruno Maglione, sócio da banca Fernandes Figueiredo Françoso e Petros Advogados, também acredita que o impacto prometido pelo Marco das Garantias acabará ocorrendo com a aprovação desse novo PL. 

"O grande impacto certamente virá com as questões vinculadas a bens móveis. Estas, infelizmente, vão acabar sendo direcionadas ao PL 6.204/19", prevê.

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