Opinião

Desenho institucional da lista tríplice para nomeação do procurador-geral da República

Autor

  • Leandro Bastos Nunes

    é procurador da República professor de cursos do MPU (Ministério Público da União) especialista em Direito Penal e Processo Penal e autor do livro "Evasão de Divisas" (Editora Juspodivm).

3 de agosto de 2023, 7h09

Ao se aproximar o fim do mandato do atual procurador-geral da República, questiona-se a necessidade de observância da lista tríplice na sucessão, para fins de preservação dos princípios democráticos, republicanos e da independência da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Em relação à democracia interna, o escrutínio da classe submeteria o candidato à sabatina dos próprios colegas e a um sistema de votação em que todos pudessem discutir as propostas até ulterior fase do processo de votação.

U.Dettmar
U.Dettmar

No que se refere à independência da PGR, esta ficaria resguardada, porquanto o membro escolhido exerceria as funções sem as eventuais pressões externas ou políticas, conferindo legitimidade para administrar a instituição.

 Quanto ao princípio republicano, embora inexista vedação constitucional a sucessivas reconduções do PGR, sua relação estaria adstrita à temporariedade do mandato, legitimidade do eleito perante seus pares e à prestação de contas a que estaria submetido em relação às promessas feitas em sua campanha nos debates públicos promovidos pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e nas entrevistas à imprensa, firmando compromissos perante a Constituição e os cidadãos.

Ademais, os atos do procurador-geral da República são controlados pelo princípio da legalidade (observância da legislação), supervisionados pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal (MPF), e os pedidos decorrentes das ações ajuizadas no Supremo Tribunal Federal submetidos à apreciação e ao julgamento da Suprema Corte, sem prejuízo da previsão legal conferida a qualquer cidadão para postular o impeachment do procurador-geral nas hipóteses de crime de responsabilidade da Lei 1.079/50, eliminando eventual alegação do suposto cunho corporativista da lista.

Cumpre salientar que a lista tríplice tem previsão constitucional para nomeação dos ministros do TCU (artigo 73, parágrafo 2º, I, da CF/88), ministros do STJ (artigo 104, I, da CF/88) e para a escolha dos procuradores-gerais de Justiça dos Ministérios Públicos dos estados e o do Distrito Federal (artigo 128, parágrafo 3º, da Constituição Federal/88), e tem sido observada na escolha do procurador-geral do TCE, reitores de universidades federais e no âmbito dos Conselho Nacional do Ministério Público e do Conselho Nacional de Justiça, sendo instrumento de exercício da democracia interna e legitimação dos eleitos.

Embora não haja previsão constitucional de sua obrigatoriedade, a tradição de sua observância foi inaugurada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003 — e mantida até o governo de Michel Temer (2016-2018).

Ao escolher o próximo procurador-geral entre um dos nomes da lista, o atual presidente da República, que sempre respeitou a tradição republicana, prestigiará não apenas o desejo da maioria dos membros do MPF, e sim dividirá a responsabilidade da nomeação com a sociedade e o Ministério Público brasileiro.

Por outro lado, todos os membros da lista tríplice, em entrevista concedida no mês de junho deste ano, reconheceram a incidência de alguns equívocos e excessos por parte da operação "lava jato", refutando qualquer suposição de que haveria atuação desequilibrada na condução do cargo de procurador-geral da República.

Não se pode olvidar que o PGR possui relevante atribuição não apenas na persecução criminal, mas também na defesa do regime democrático, propositura de ações diretas de inconstitucionalidade e incidentes de deslocamento de competência para a Justiça Federal nas hipóteses de graves violações de direitos humanos, supervisão da legalidade nas eleições presidenciais, entre outras.

Por fim, as divergências em relação ao método de escolha devem ser exercidas com equilíbrio e respeito ao procurador-geral, sendo as discussões restritas ao debate principiológico do regime democrático.  

Assim, espera-se que o presidente da República observe, na nomeação do próximo procurador-geral, os princípios decorrentes do desenho institucional da lista tríplice.

Autores

  • é procurador da República, professor de cursos do Ministério Público da União, especialista em Direito Penal e Processo Penal e autor da obra "Evasão de Divisas" (Editora Juspodivm).

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