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Emenda ao PL 2.481/22: a necessidade de reforma do artigo 61 da Lei 9.784/99

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2 de abril de 2023, 8h00

O Projeto de Lei (PL) nº 2.481/2022, que trata da reforma da Lei 9.784/99, não pode ser promulgado sem antes resolver a incoerência legislativa havida no entorno da ausência automática de efeito suspensivo para o recurso administrativo.

Segundo o artigo 61 da atual lei federal de processo administrativo, "salvo disposição legal em contrário, o recurso não tem efeito suspensivo". Pode não parecer, mas essa regra contribui enormemente para o aumento da judicialização dos litígios envolvendo a administração pública.

Questões que poderiam ser resolvidas em âmbito recursal administrativo acabam sendo levadas ao Judiciário porque a falta de efeito suspensivo faz perecer o direito de impetrar mandado de segurança, caso seja ultrapassado o prazo decadencial de 120 dias.

Prevê o artigo 23 da Lei 12.016/09 que "o direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado". A consequência é que o cidadão não possui o direito de ao menos tentar esgotar a via administrativa antes de recorrer ao Judiciário. Se o processo administrativo for moroso, o jurisdicionado será forçado a impetrar mandado de segurança mesmo quando ainda pendente decisão final administrativa a respeito do mérito do recurso protocolado.

Essa incoerência não beneficia a ninguém: a) a administração pública perde o estímulo de resolver o conflito na origem e acaba se acomodando na função jurisdicional dos tribunais; b) ao cidadão é imposto um ônus de contratar um advogado para reproduzir judicialmente os mesmos argumentos pendentes de solução definitiva na via administrativa; c) ao Poder Judiciário é, desnecessariamente, transferido mais um litígio, prejudicando a boa e célere função da Justiça.

Infelizmente, o PL 2.481 silenciou a respeito desses fatos. Quando falou sobre recurso, se referiu apenas ao efeito suspensivo automático do processo administrativo sancionador (artigo 68-I) e não dos demais processos administrativos.

O legislador federal pode e deve fazer mais em prol da desjudicialização de conflitos administrativos. Não basta a previsão isolada de mandamentos estimulando o consenso e a escolha de métodos alternativos para a solução de conflitos. Para proporcionar maior eficiência, é preciso que as normas jurídicas tenham harmonia e coerência entre si. O sistema legislativo precisa conversar consigo mesmo.

O aumento do número de processos judiciais será duramente impactado caso sejam previstas regras para garantir tranquilidade processual às partes, no sentido de que a escolha pelo diálogo administrativo não prejudicará o direito de ação do cidadão jurisdicionado. Em outras palavras, o sujeito que escolher por recorrer às autoridades superiores não terá em seu desfavor a continuidade do prazo decadencial de 120 dias, podendo aguardar o deslinde da questão na esfera administrativa para então ponderar se buscará ou não amparo judicial por meio de writ.

Por essa lógica, o prazo decadencial para impetração de mandado de segurança somente começaria a contar após intimação da decisão recursal e não mais da ciência do fato pelo recorrente, conforme prevê o citado artigo 23 da Lei 12.016/09.

Essa correção precisa ser feita de imediato, emendando o PL 2.481/22 para inserir um dispositivo que supere a pobreza legislativa do artigo 61 da Lei 9.784/99, force um diálogo processual com o artigo 23 da Lei 12.016/09 e discipline hipóteses ou regras para a concessão automática de efeito suspensivo aos recursos administrativos.

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