Opinião

Oportunidades perdidas: a jurisdição voluntária nos tribunais

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23 de setembro de 2022, 9h10

Recentemente, teve-se notícia de uma grande empresa do ramo de prestação de serviços que entrou em recuperação judicial deixando milhares de colaboradores sem receber salários, verbas rescisórias, vale-transporte, dentre outros direitos trabalhistas básicos.

A preocupação em relação à situação dos colaboradores desalentados era também compartilhada pelas clientes da empresa devedora, responsáveis subsidiárias pelas obrigações inadimplidas pela última.

Sentaram-se à mesa, empresa devedora, seus clientes e sindicatos representantes da categoria, todos em extenso diálogo para negociar os termos de um acordo pelo qual as clientes pagariam diretamente aos empregados da empresa devedora os direitos trabalhistas não pagos até então.

O acordo saiu, e, nos termos da lei, tinha partes capazes, forma prescrita em lei e objeto lícito. Além disso, observava todos os requisitos impostos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para que pudesse atingir seu fim: pacificar uma situação de vulnerabilidade de cerca de quatro mil empregados.

Distribuídos em quatro regiões distintas, somente uma delas decidiu por negar seus efeitos, e, justamente, aquela que representa o maior Tribunal Trabalhista do país.

Este artigo não irá discutir os motivos jurídicos pelos quais somente um, dos três acordos, foi negado pelo Poder Judiciário, sendo que todos tratavam da exata mesma situação.

Trará, de outro lado, uma reflexão sobre o diálogo  ou falta dele  nos procedimentos de jurisdição voluntária no âmbito da Justiça do Trabalho.

E aqui tem-se sob enfoque duas questões elementares nesta que é uma justiça popular: conciliação e oralidade.

Da experiência trazida sobre os casos homologados, foi possível observar que diante da relevância do caso, os Juízes que os aceitaram chamaram as partes ao diálogo. Marcaram audiências nas quais esclareceram suas dúvidas, solicitaram documentos adicionais às partes e, finalmente, formaram seu convencimento sobre e legalidade do que fora posto à mesa para análise. Houve caso em que até os substituídos foram convidados para confirmarem os recebimentos dos valores propostos.

À contramão, no caso em que a homologação não ocorreu, observou-se o oposto  recusa a dialogar. Apesar de as partes solicitarem audiência e registrarem por escrito que antes de uma decisão de mérito gostariam de sanar toda e qualquer dúvida sobre o acordo, o juiz condutor não o fez e, depois de um despacho saneador padrão  que é proferido em todos os casos submetidos ao núcleo de conciliação do Tribunal em questão  veio a decisão de mérito extinguindo o feito sem resolução de mérito.

A bem verdade é que, na prática, o Judiciário não demonstra o mesmo interesse de viabilizar a conciliação na jurisdição voluntária como o tem nos processos comuns. Refletindo sobre este fato, imaginamos que uma das razões pode ser o fato de que, nestes casos, não existe pretensão resistida e por não ter uma visão completa sobre as situações que ensejaram a composição, o juiz prefere, na dúvida, simplesmente não homologar seus termos (deixando de lado princípios básicos, como a presunção de boa-fé dos atos processuais).

Fato é que ao proceder desta forma, o Judiciário afasta o jurisdicionado, pois já há clara impressão no meio jurídico de que as jurisdições voluntárias são rechaçadas por grande parte dos magistrados, o que se revela como uma imensa perda de oportunidade a todos.

Retornando à situação que originou esse texto, no caso em que não houve homologação, havia cerca de mil empregados substituídos pelo sindicato. São mil processos a menos no Judiciário, mil trabalhadores recebendo verbas trabalhistas de maneira rápida. Menos processos, mais efetividade no Judiciário.

Se todas as partes envolvidas estão comungando de esforços comuns para verem o acordo entabulado integralmente homologado, por que não as chamar às audiências e discutir seus termos? O princípio da celeridade, nestes casos, não socorre aos agentes do processo caso o fim almejado por eles deixe de ser atingido.

Mais vale uma longa discussão sobre os termos do acordo com uma sentença homologatória ao final, do que um trâmite rápido com final negativo em razão de questões que poderiam ter sido alvo de debate entre partes e Judiciário.

A Justiça do Trabalho é reconhecida pela conciliação e pelo princípio da oralidade, mas tem se observado, principalmente nas jurisdições voluntárias que tramitam nos centros de conciliação de grandes Tribunais, o afastamento destas duas características.

A pergunta que fica é: quantas oportunidades são perdidas pela falta de diálogo entre agentes e Poder Judiciário nas jurisdições voluntárias?

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