Impacto das alterações pela Lei 14.451 nos quóruns de deliberação dos sócios de Ltda.
18 de outubro de 2022, 6h05
Existem diversos instrumentos jurídicos à disposição daquelas e daqueles que pretendem realizar um planejamento patrimonial e sucessório. Dentre as principais ferramentas utilizadas é possível citar a constituição das denominadas holdings familiares, definidas na doutrina como:
(FLEISCHMANN, Simone Tassinari Cardoso; GRAEFF, Fernando René. Contornos jurídicos da holding familiar como instrumento de planejamento sucessório. In: TEIXEIRA, Daniele Chaves. Arquitetura do Planejamento Sucessório. Tomo II. Belo Horizonte: Fórum, 2021, p. 675-712, p. 675).
A constituição da sociedade dependerá da escolha de um dos tipos societários previstos em lei, sendo usualmente adotados a sociedade limitada e a sociedade anônima de capital fechado.
A sociedade limitada é regulamentada, em grande parte, pelo Código Civil que, em seu artigo 1.052, prevê que na referida sociedade empresária, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.
No âmbito das sociedades limitadas, o Código Civil dita regras sobre: as quotas sociais (artigos 1.055 a 1.059), a administração (artigos 1.060 a 1.065), o conselho fiscal (artigos 1.066 a 1.070), as deliberações dos sócios (artigos 1.071 a 1.080-A), o aumento e a redução do capital (artigos 1.081 a 1.084), a resolução da sociedade em relação a sócios minoritários (artigos 1.085 a 1.087) e a dissolução (artigo 1.087).
Especificamente sobre as decisões tomadas no âmbito da sociedade, prevê o artigo 1.071 que dependem de deliberação dos sócios: a aprovação das contas da administração (inciso I); a designação dos administradores, quando feita em ato separado (inciso II); a destituição dos administradores (inciso III); o modo de sua remuneração, quando não estabelecido no contrato (inciso IV); a modificação do contrato social (inciso V); a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação (inciso VI); a nomeação e destituição dos liquidantes e o julgamento das suas contas (inciso VII); e o pedido de concordata (inciso VIII).
Indo mais além, o artigo 1.076 do Código Civil instituiu quóruns mínimos de votação/aprovação para as deliberações elencadas no artigo 1.071[1], excepcionando a hipótese do artigo 1.061 do Código Civil (segundo a qual dependeria de aprovação da unanimidade dos sócios, enquanto o capital não estivesse integralizado, e de 2/3, no mínimo, após a integralização).
A redação destes dispositivos legais, contudo, será alterada pela Lei nº 14.451/202, publicada em 22/9/2022, que modificou os quóruns de deliberação dos sócios da sociedade limitada previstos nos artigos 1.061 e 1.076.
O artigo 1.061 passará a ter seguinte redação: "a designação de administradores não sócios dependerá da aprovação de, no mínimo, 2/3 (dois terços) dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e da aprovação de titulares de quotas correspondentes a mais da metade do capital social, após a integralização".
No que toca ao artigo 1.076 passará a ser instituído que as deliberações dos sócios serão tomadas pelos votos correspondentes a mais da metade do capital social, nos casos previstos nos incisos II, III, IV, V, VI e VIII do caput do artigo 1.071 do Código e pela maioria de votos dos presentes, nos demais casos previstos na lei ou no contrato, se este não exigir maioria mais elevada.
A alteração operada pela Lei nº 14.451/2022 representa uma tendência que, em sua essência, tem como escopo desburocratizar as relações jurídicas econômicas entre particulares.
Antes mesmo desta lei mais recente, a Lei nº 13.792/2019 havia promovido a alteração do caput do artigo 1.076 que deixou de se referir à hipótese prevista no § 1.º do artigo 1.063 do Código Civil (parágrafo esse também alterado pela Lei nº 13.792/2019). Designado administrador por prazo indeterminado, sua destituição passou a depender de aprovação dos sócios titulares, observando-se o quórum previsto no § 1.º do artigo 1.063. Previa-se, antes da reforma da Lei nº 13.792/2019, que seria necessária a aprovação pelos sócios titulares de mais de dois terços do capital social. Com a nova redação, o § 1.º do artigo 1.063 passou a contentar-se com a aprovação de titulares de quotas correspondentes a mais da metade do capital social.
A reforma da Lei nº 14.451/2022 segue a mesma tendência. Na prática, houve o abrandamento das regras sobre as deliberações dos sócios para permitir a tomada de decisões sociais com quórum mais reduzido, atendendo-se à dinamicidade deste tipo de relação jurídica.
Com isso, aqueles e aquelas que já operavam através de sociedades empresárias (especialmente no âmbito do planejamento patrimonial e sucessório) deverão revisitar seus contratos sociais (e demais instrumentos), realizando as modificações e revisões necessárias.
A Lei nº 14.451/2022 entra em vigor 30 dias após a sua publicação (que ocorreu em 22/9/2022).
[1] Art. 1.076. Ressalvado o disposto no art. 1.061, as deliberações dos sócios serão tomadas:
I – pelos votos correspondentes, no mínimo, a três quartos do capital social, nos casos previstos nos incisos V e VI do art. 1.071;
II – pelos votos correspondentes a mais de metade do capital social, nos casos previstos nos incisos II, III, IV e VIII do art. 1.071;
III – pela maioria de votos dos presentes, nos demais casos previstos na lei ou no contrato, se este não exigir maioria mais elevada.
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