Direito à moradia

Falhas em construções em comunidade quilombola geram dever de indenizar

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17 de outubro de 2022, 15h48

O contato direto com fezes, urina, animais que rodeiam fossas, gordura, lixo das casas, a impossibilidade de usufruir de água limpa em suas casas, assim como na comunidade, com fossa a céu aberto, é nítida situação ensejadora de dano moral.

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ReproduçãoFalhas em construções em comunidade quilombola geram dever de indenizar

Com esse entendimento, a juíza Hallana Duarte Miranda, da Vara Única de Eldorado Paulista (SP), condenou o Estado de São Paulo, o município de Eldorado, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano e a Fundação Instituto de Terras de São Paulo por falhas na construção de casas em uma comunidade quilombola.

Os réus foram condenados ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 125 mil, a moradores da comunidade quilombola de Pedro Cubas. De acordo com os autos, o programa "moradias quilombolas" do estado, executado por meio de um convênio, entregou as casas com falhas estruturais, que geraram transbordamento de esgoto, vazamentos e goteiras.

Os autores da ação, moradores da comunidade, disseram que, na entrega das chaves, houve a promessa de que as falhas na estrutura seriam resolvidas. Porém, mais de dez anos depois, os moradores ainda sofrem com os mesmos problemas. Ao julgar a ação procedente, a juíza citou o laudo pericial, "produzido sob o crivo do contraditório", que constatou defeitos estruturais na casa dos autores.

"A transferência da responsabilidade aos moradores, portanto, por meio de termo de recebimento das unidades não exonera a parte ré de sanarem defeitos estruturais, pois amplamente comprovado que se não fosse a má execução da obra, os problemas sequer existiram e que ainda com a orientação dos moradores, não se pode excluir o problema sem reparos em toda a estrutura", afirmou.

A magistrada também destacou que a comunidade foi exposta à convivência contínua com seu esgoto e dos outros moradores, contaminando o rio que dá nome ao local, "impedindo os moradores de usufruírem da água, de moradia digna, saúde, sustentabilidade e de um projeto de vida que garanta padrões mínimos de higiene e saneamento".

Assim, Miranda concluiu pela ocorrência de dano moral e pela responsabilidade das rés de efetuar os reparos nas casas, no prazo de um ano. "No presente caso, o repositório dos bens ideais da parte autora, composto por seus atributos incorpóreos, essenciais e indisponíveis da personalidade, experimentou ofensa que lhe marcou negativamente."

A magistrada afirmou que a situação dos autos é a mais próxima que já presenciou, juridicamente, de violação evidente à dignidade humana: "Não se trata apenas de dano moral, comparável às ofensas por negativação indevida, espera em fila de banco, ou situações corriqueiras sobre as quais a jurisprudência já não tem dúvidas. E essa violação vai além de parâmetros jurídicos filosóficos, mas recai, essencialmente, em violações concretas e evidentes."

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Processo 1001049-38.2017.8.26.0172

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