Opinião

Revisão do Tema 677 do STJ pode impactar nas execuções fiscais paulistas

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19 de novembro de 2022, 11h08

Ensina o professor Orlando Gomes que a mora corresponde à impontualidade culposa, tendo como pressupostos, então, o vencimento da dívida, a culpa do devedor e a possibilidade de cumprimento tardio. O principal efeito desse atraso é o dever de ressarcir o credor pelos danos sofridos decorrentes do retardo no pagamento (os juros de mora).

É justamente sobre os encargos relativos à mora que a discussão do Tema 677 do Superior Tribunal de Justiça versa. Mais especificamente a respeito da responsabilidade por seu pagamento após o depósito judicial feito pelo devedor, em fase executória, com intuito de suspender a execução. A tese também se aplica ao depósito fruto de penhora on-line.

Originalmente, a tese, fixada em 21/05/2014 (acórdão do REsp. 1.348.640/SP), dizia "na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada".

Pela interpretação do que foi consignado pelo STJ, a princípio, pode-se entender que o depósito judicial libera o devedor da obrigação, inclusive dos encargos de sua mora. O quais serão, relativamente ao período em que se discute judicialmente o direito, de incumbência da instituição financeira que recebeu o depósito.

Assim, ao final do julgamento — com trânsito em julgado — o magistrado determinará o levantamento da quantia em favor do credor, caso seja vencedor na demanda. Esse valor será corrigido, desde o depósito, a cargo do banco.

O que impulsionou a revisitação ao Tema 677 foi a divergência aberta nos tribunais, e dentro do próprio STJ, sobre a sua aplicação. Basicamente, foi julgado (no REsp. 1820963/SP) se o depósito em juízo serviria para extinguir a obrigação do devedor relativamente aos encargos da mora fixados no título executivo que eventualmente fossem superiores à correção monetária operada pelo banco.

Ou seja, se no título executado consta um patamar de juros moratórios inferior àquele utilizado pela instituição financeira (os quais têm natureza remuneratória, e não moratória, conforme aponta o ministro Paulo de Tarso em seu voto), questionou-se se o devedor deverá arcar com a diferença.

A Corte, em sessão plenária do Órgão Especial, realizada em 19 de outubro de 2022, concluiu o julgamento e modificou o conteúdo do Tema 677, por sete votos a seis, o qual passou a constar o seguinte teor:

"Na execução, o depósito efetuado a título de garantia do juízo ou decorrente da penhora de ativos financeiros não isenta o devedor do pagamento dos consectários da sua mora, conforme previstos no título executivo, devendo-se, quando da efetiva entrega do dinheiro ao credor, deduzir do montante final devido o saldo da conta judicial."

A relatora, ministra Nancy Andrighi, cujo voto foi vencedor, ressaltou a distinção entre o depósito feito em ação de consignação, o qual extingue a relação jurídica material, daquele feito no bojo na fase executiva, que tem escopo meramente processual (suspensão dos atos constritivos ou do curso da execução). Para ela, como nesse último caso, os efeitos são processuais, perduram os deveres relativos à relação material e, com isso, os encargos decorrentes da mora.

Do ponto de vista tributário, há potencial impacto negativo aos contribuintes. Isso porque pode existir um descompasso entre o índice legal de atualização do débito tributário (indicado na CDA) e o fornecido pela instituição financeira depositante. Um exemplo são os débitos tributários paulistas de ICMS que são atualizados pela Selic (artigo 565, §1º, RICMS), ao passo que o Banco do Brasil (depositário nas execuções fiscais que correm no estado) remunera o depósito judicial pela Taxa Referencial (em verdade, com a mesma remuneração da poupança), de acordo com o site do BB.

Isso significa dizer que o contribuinte que suspender a exigibilidade do crédito executado pela Fazenda estadual de São Paulo através do depósito (artigo 151 do CTN), com fim de embargar a execução, poderá ter que arcar com a diferença entre a atualização que seria feita pela Selic e aquela operada com base na poupança, relativa ao período posterior ao depósito.

Devem, então, os operadores da área tributária observar com cautela esse ponto, pois, em tese, a Fazenda paulista pode agora continuar a mover a execução para reaver a diferença entre o valor depositado (atualizado pelo banco) e o montante corrigido pela Selic, caso os embargos não sejam acolhidos.

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