Opinião

Pensão indenizatória como pressuposto para efetivação da dignidade humana

Autor

  • Letícia Colleen Andrade de Miranda

    é advogada sócia do escritório Rafael Mayer Lucena e Colleen assessora jurídica na Autarquia Municipal de Trânsito e Transportes de Ipojuca (PE) pós-graduada em Direito Previdenciário e Seguridade Social pela Escola de Magistratura Trabalhista da 6ª Região e pós-graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela Uninassau.

11 de novembro de 2022, 17h11

A cidadania e a dignidade da pessoa humana estão elencados na Constituição como fundamentos da República Federativa do Brasil, dispostos no artigo 1º, incisos  II e III da CF de 1.988. Tais fundamentos são colocados em prática, dentre outras disposições, através das normas de direitos sociais.

O Brasil possui como característica de Estado Social a efetivação de políticas sociais inclusivas e inseriu a assistência social e outras prestações positivas para a efetivação da dignidade da pessoa humana no rol da seguridade social.

A característica basilar da seguridade social se expressa pela gratuidade e universalidade do atendimento. Fato que faz com que a seguridade social seja expressamente interligada à cidadania para a efetivação da dignidade da pessoa humana, vez que toda sociedade possui o dever de custear projetos de direitos sociais.

As pensões especiais são exemplos de benefícios destinados às pessoas que foram atingidas, de forma física principalmente, pela má gestão do Estado em momentos de calamidade pública.

No plano federal o ordenamento jurídico atual abarca oito tipos de pensões especiais indenizatórias:

1) A pensão especial às pessoas atingidas pela hanseníase que foram submetidas a isolamento e internação compulsórios
Na década de 1930, durante o governo de Getulio Vargas, os portadores de hanseníase passaram a ser isolados em hospitais-colônia. O país chegou a ter 101 hospitais-colônia, sendo que 33 continuam parcialmente ativos. A internação compulsória foi abolida em 1962, mas estima-se que ainda existam cerca de três mil pessoas remanescentes do período de isolamento.

Após a extinção total dos hospitais-colônia, ocorrida em 1986, muitos pacientes não tinham qualquer condição de reinserção social, seja por falta de recursos financeiros, seja por não mais encontrarem suas famílias.

Dessa forma foi instituída em  2007, pela Lei 11.520 a pensão especial a pessoas com hanseníase que foram submetidas a isolamento e internação compulsórios em hospitais-colônia.

De caráter personalíssimo, ela é vitalícia, não gera direito à pensão por morte, nem ao abono anual, devendo ser requerida junto ao Ministério da Mulher, família e direitos humanos, não no INSS.  É possível acumulá-la com benefícios previdenciários, mas não com indenizações sobre os mesmos fatos.

2) A pensão especial decorrente da síndrome de talidomida
A Lei nº 7070/1982, por sua vez, autorizou o poder executivo a conceder pensão especial, mensal, vitalícia e intransferível, aos portadores da deficiência física conhecida como "Síndrome da Talidomida" que a requererem, a qual será devida a partir da entrada do pedido de pagamento junto ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).

Talidomida ou tecnicamente conhecida como "Amida Nftálica do Ácido Glutâmico", é um medicamento que foi desenvolvido em 1954 na Alemanha como um sedativo. Entretanto, quando essa fórmula passou a ser comercializada em 1957, houve a ocorrência de milhares de casos de Focomelia, ou seja, uma síndrome caracterizada pelo encurtamento dos membros junto ao tronco do feto  devido a ultrapassar a barreira placentária e interferir na sua formação. Se a fórmula for administrada durante a gestação pode provocar graves deficiências na coluna vertebral, auditivas, visuais e, em casos mais raros, deformidades no tubo digestivo e problemas cardíacos.

Assim a medida que o medicamento passou a ser administrado nas gestantes ocorreu uma grande tragédia, em que passaram a nascer crianças com um tipo peculiar de malformação que passou a ser denominada "síndrome da talidomida".

Esse benefício indenizatório é pessoal, intransferível, vitalício, pago mensalmente às pessoas afetadas e que estão incapacitadas de trabalhar, demandando perícia. É possível acumulá-la com qualquer benefício previdenciário e o benefício de prestação continuada da assistência social. Os beneficiários possuem direito à isenção do imposto de renda, bem como a um adicional em seu benefício correspondente a:

a) 25% caso possua mais de 35 anos de idade, obter pontuação igual ou superior a seis e possuir a necessidade de assistência permanente de terceiros;

b) 30% se tiver 25 anos de contribuição ou mais  homem ou 20 anos ou mais se mulher. OU idade H55/ M50 + 15anos de tempo de contribuição;

3) A pensão especial devida aos seringueiros que tenham trabalhado durante a 2ª Guerra Mundial nos Seringais da Região Amazônica
É assegurado aos seringueiros recrutados nos termos do Decreto-Lei nº 5.813, de 14 de setembro de 1943, que tenham trabalhado durante a 2ª Guerra Mundial nos Seringais da Região Amazônica, amparados pelo Decreto-Lei nº 9.882, de 16 de setembro de 1946, e que não possuam meios para a sua subsistência e da sua família, o pagamento de pensão mensal vitalícia correspondente ao valor de dois salários-mínimos vigentes no país.

A comprovação da efetiva prestação de serviços a que alude a referida lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.

Esta pensão especial possui característica mensal, vitalícia, sendo transferível aos dependentes que possuam rendimento inferior a dois salários mínimos. É proibido recebe-la conjuntamente a benefícios do RGPS ou RPPS, podendo o requerente optar pelo benefício mais vantajoso.

4) A pensão especial devida ao ex-combatente em operações bélicas durante a 2ª Guerra Mundial
O benefício será pago mediante requerimento, devidamente instruído, em qualquer organização militar do ministério da defesa, se na data do requerimento o ex-combatente, ou o dependente, preencher os requisitos desta lei.

Caracterizado por ser mensal, vitalício e transferível aos dependentes:

a) de 1ª classe: cônjuge/companheira (o) e o filho (a) de qualquer condição, solteiros, menores de 21 anos ou inválidos;
b) de 2ª classe: o pai e a mãe inválidos, que comprovem dependência econômica; e
c) de 3ª classe: o irmão e a irmã, solteiros, menores de 21 anos ou inválidos que comprovem dependência econômica.

Cabe ressaltar que o dependente será considerado indigno se for condenado por crime doloso, do qual resulte a morte do ex-combatente ou de outro dependente.

4) A pensão especial devida às Vítimas de Caruaru (PE)
Por meio da Lei 9.422/96 ficou o Poder Executivo autorizado a conceder pensão especial mensal, retroativa à data do óbito, no valor de um salário mínimo vigente no País, ao cônjuge, companheiro ou companheira, descendente, ascendente e colaterais até segundo grau das vítimas fatais de hepatite tóxica, por contaminação em processo de hemodiálise no Instituto de Doenças Renais, com sede na cidade de Caruaru, no Estado de Pernambuco, no período compreendido entre fevereiro e março de 1996, mediante evidências clínico-epidemiológicas determinadas pela autoridade competente.

Característica mensal, no valor de um salário mínimo vigente, podendo ser acumulada com qualquer benefício do RGPS, RPPS ou BPC.

4) A pensão especial devida aos contaminados pelo Césio 137
A Lei nº 9.425/96 instituiu a pensão vitalícia, a título de indenização especial, às vítimas do acidente com a substância radioativa Césio 137, ocorrido em Goiânia, Estado de Goiás.

A pensão de que trata esta Lei, é personalíssima, não sendo transmissível ao cônjuge sobrevivente ou aos herdeiros, em caso de morte do beneficiário.

A comprovação deverá ser feita por meio de junta médica oficial, a cargo da Fundação Leide das Neves Ferreira, com sede em Goiânia, Estado de Goiás e supervisão do Ministério Público Federal.

É caracterizada por ser mensal, vitalícia, pessoal e intrasnferível.

5) A pensão especial devida ao Zika Vírus
Em 2000, a Lei Federal nº 13.985 instituiu a pensão especial destinada a crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus, nascidas entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2019, beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada (BPC) de que trata o artigo 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Esta pensão especial é mensal, vitalícia, intransferível e terá o valor de um salário mínimo, não gerando décimo terceiro, nem pensão por morte.

6) A pensão especial devida aos anistiados políticos
São declarados anistiados políticos aqueles que, no período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988, por motivação exclusivamente política, sofreram perseguições por órgãos ou indivíduos ligados ao Estado brasileiro.

A reparação econômica, de caráter indenizatório, poderá ser deferida em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade. A prestação única se destina aqueles que não conseguiram trabalhar, devendo corresponder a 30 salários mínimos por ano de punição, não podendo ultrapassar R$ 100 mil. A reparação mensal destina-se àqueles que conseguiram trabalhar, mas tiveram algumas limitações, correspondendo ao valor equivalente à remuneração que ele receberia se não fosse um anistiado político, variando entre o salário mínimo e o subsídio dos ministros do STF.

Esta pensão especial é transferível aos dependentes.

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  • é advogada, sócia do escritório Rafael Mayer, Lucena e Colleen, assessora jurídica na Autarquia Municipal de Trânsito e Transportes de Ipojuca (PE), pós-graduada em Direito Previdenciário e Seguridade Social pela Escola de Magistratura Trabalhista da 6ª Região e pós-graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela Uninassau.

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