Opinião

Mulheres no poder e um conto: o moço de lá e o moço de cá

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1 de novembro de 2022, 15h07

A história que vou contar é sobre dois moços: o de lá e o de cá. Eles não serão nomeados, porque suas identidades compõem o sem-lugar solitário em nossos tempos. Os moços são figuras do passado, retrógradas, mortos-vivos do patriarcado que insiste em não ser sepultado.

O moço de lá é figura conhecida nas páginas destinadas aos jagunços de terno. É adepto ao bang bang. O tal moço aumentou o tom para ofender as mulheres que estão no poder, porque não tem argumentos e nunca teve classe. Ofendeu a ministra, porque não respeita nem as mulheres, nem as instituições. Lança palavras ao vento que voam do nada para o nada.

O moço de cá é solitário. Ele destoa da multidão de colegas e amigos que, sob elogios, reconheceram a importância d'A luta das lideranças femininas da OAB, título do artigo que escrevi aqui na ConJur. O moço de cá, em reação ao meu texto, expressou seu ressentimento enlutado pela morte contínua de um sistema que exclui mulheres. Seu lamento faz jus aos nossos tempos. Ele o intitula assim: "para de escrever essa m*!". Não repetirei a palavra. Aprendi com a ministra que o silêncio grita para os ouvidos dos ignorantes.

O moço de lá e o moço de cá pertencem ao grupo dos brucutus, como definiu a professora Débora Diniz. O de lá, não conhece outra língua a não ser aquela que emite pólvora. O de cá, sem saber, revela uma bússola para as mulheres no poder. Quando eles  homens antagonistas da história feminina  dizem onde não devemos estar, nos ajudam a encontrar o espaço no incômodo que causamos aos seus sonos injustos, como escreveu Conceição Evaristo. O sono tranquilo dos privilégios que sempre excluíram as mulheres.

O moço de lá desconhece o senso de dignidade que pode existir nas palavras e, também, no silêncio. O moço de cá terá seu não-lugar na história porque não sabe usar as palavras. É um analfabeto na arte da elegância de (con)viver.

Sou filha de pai mineiro. Aprendi a admirá-lo por suas histórias e pelo seu respeito às mulheres. Isso me faz pensar sobre nossos tempos. Meu pai foi um homem cuja existência era necessária no presente. Ainda o vejo assim: no agora. Quanta falta fazem os homens de bem com as mulheres, com a diferença!

Ao me ver Secretária-Geral do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil  OAB Nacional, orgulhoso, meu pai diria: minha filha! Nessa exclamação, estaria o mundo de palavras não ditas, mas de alegria tanta que faria transbordar seus olhos com a voz embargada de amor e emoção.

É isso: sou uma mulher num espaço de poder, assim como tantas mulheres que compõem o Sistema OAB e outros lugares de liderança, ladeadas por homens, com os quais nos unimos por um Brasil que é lugar de todos e todas. O Brasil plural é um país melhor. Que incômodo isso representa para os moços de cá e de lá…

Meu pai me ensinou que o lugar de mulher é exatamente onde ela quiser. E aqui estou. Aqui, nós estamos: no lugar onde os dois moços das margens deixam de existir.

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