Tudo sob controle

Acusado de corporativismo, Conselho Nacional do MP busca se fortalecer

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30 de março de 2022, 9h01

*Reportagem publicada no Anuário do Ministério Público Brasil 2022. A publicação está disponível gratuitamente na versão online e à venda na Livraria ConJur, em sua versão impressa.

Criticado por agir com corporativismo e evitar punições severas a procuradores e promotores que extrapolam suas funções, o Conselho Nacional do Ministério Público passou por momentos de tensão em 2021. A Câmara dos Deputados colocou em pauta proposta de emenda à Constituição (PEC 5/2021) para alterar a sua composição e restringir a autonomia dos membros do MP na análise dos processos que lhe são confiados. O projeto uniu membros de todos os ramos do Ministério Público em forte reação, com movimentos coordenados pelas associações de classe. O substituto levado pelo relator à votação na Câmara foi derrotado por apenas 11 votos, em outubro de 2021, mas o presidente da casa, deputado Arthur Lira (PP-AL), promete pautar o texto original da PEC em 2022.

Três pontos principais geraram preocupação na categoria. O primeiro previa que o corregedor do CNMP fosse um membro da carreira indicado pelo Legislativo — hoje ele é eleito entre os conselheiros do órgão. O segundo aumentava o número de conselheiros de 14 para 17, ampliando o número de indicados pelo Congresso e diminuindo uma indicação do MPU. O terceiro permitia que o CNMP anulasse atos de procuradores e promotores, o
que só pode ocorrer por decisão judicial.

Na semana da votação da PEC na Câmara, o Plenário do CNMP referendou a instauração de processo administrativo disciplinar contra onze membros do MPF e uma do MP de Sergipe. O conselho apurou que membros da extinta força-tarefa “lava jato”, no Rio de Janeiro, vazaram para a imprensa o conteúdo de duas denúncias contra os ex-senadores Edson Lobão e Romero Jucá que estavam em sigilo. A Corregedoria Nacional sugeriu como punição suspensão por 30 dias.

O Plenário aplicou, ainda, a pena de demissão — a única no ano — ao procurador da República no Paraná Diogo Castor de Mattos, responsável pela encomenda de outdoor em Curitiba enaltecendo os membros da “lava jato” no estado. Para o conselho, o fato violou a instituição, propiciando a segregação entre os membros que atuaram na operação e os demais. O colegiado também censurou outro procurador “lavajatista” por fazer manifestações sobre as eleições para a presidência do Senado, em 2019, entendendo que as declarações ultrapassaram os limites da simples crítica e da liberdade de expressão.

Para o conselho, cabe aos membros do Ministério Público zelar pela lisura dos processos eleitorais. Assim, seus integrantes não podem se manifestar a favor ou contra determinado candidato ou partido político. Também deslocou um promotor de Justiça do MP da Bahia do meio ambiente por falta de produtividade, afirmando que a atuação exclusivamente por provocação não se identifica com o modelo proativo do Ministério Público.

O CNMP instaurou correição extraordinária em todas as unidades do Ministério Público dos estados e da União, para apurar a aquisição de ferramentas para interceptação telefônica. Também baixou resolução que fixou que coaching não é atividade docente, sendo proibida a sua prática por membros do MP, principalmente porque não garante transparência perante os órgãos da administração superior, inclusive sobre a declaração anual de patrimônio.

Pelo histórico, o conselho tem se mostrado muito propositivo, mas pouco corretivo. Foram 24 sanções aplicadas em 2020 e 22 em 2021, e não houve nenhuma pena de disponibilidade compulsória. Em 2021, até novembro, tinham sido julgados 766 casos. O conselho aplicou oito suspensões, cinco advertências e quatro censuras. Chama a atenção, no entanto, que o Plenário do conselho instaurou muito mais procedimentos em 2021: foram 914 contra 529 do ano anterior.

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O maior número de processos julgados se refere a conflitos de atribuições entre membros de diferentes ramos ministeriais, competência que lhe foi atribuída pelo STF no julgamento da Ação Cível Originária 843/SP. Na sequência, vêm pedidos de providência, reclamações disciplinares, correições e procedimento de controle administrativo.

Em seu relatório de gestão 2019-2020, Augusto Aras diz ter buscado fortalecer a Corregedoria-Geral do MPF. Ele observa que o “pacote anticrime” (Lei 13.964/2019) conferiu ao MP um protagonismo especial por meio de institutos despenalizadores, como os acordos de não persecução penal e cível, de leniência e de colaboração premiada.

“Isso vai impor o fortalecimento urgente das corregedorias. Temos que evitar que as vantagens desses institutos atraiam também os vícios que a atuação sem controle possa ocasionar. É hora de fortalecer as nossas corregedorias para que o empoderamento advindo do pacote anticrime não atraia também vícios que possam macular a importância desses institutos”, afirma Aras.

No evento “Ministério Público de uma Nova Era: Reflexões e Projeções”, o corregedor nacional do Ministério Público à época, Rinaldo Reis, disse que a epidemia foi um momento de grandes mudanças. “Vivemos um novo Ministério Público, que precisa reaprender a viver e se relacionar interna e externamente nesta nova realidade”, sustentou. “Não tenho dúvidas de que estamos vivendo um dos momentos mais importantes para a instituição, em que as forças políticas tentam nos enfraquecer. Temos que nos unir e pensar estrategicamente para não sairmos enfraquecidos”.

Em maio de 2021, Augusto Aras inaugurou o Plenário Virtual do CNMP. Para o presidente do conselho, com ele haverá otimização de processos, com racionalização do tempo, celeridade processual e economia de recursos. Desenvolvido pela Secretaria de Tecnologia da Informação com apoio da Secretaria Processual e da Secretaria de Comunicação Social, o Plenário Virtual permite que sejam lançados os votos do relator e dos conselheiros, bem como registrado o resultado final da votação.

O julgamento de cada procedimento é considerado concluído se, no horário previsto para encerramento da votação, forem computados pelo menos nove votos e alcançada a maioria. A Emenda Regimental 31/2021, que instituiu o Plenário Virtual, prevê que os julgamentos sejam públicos e possam ser acompanhados pela internet.

Em dezembro de 2021, Aras assinou com o Governo do Distrito Federal e a Superintendência do Patrimônio da União no Distrito Federal (SPU/DF) escritura pública de doação do terreno da futura sede do CNMP. O terreno com área de 15.750 metros quadrados se localiza no Setor de Embaixadas Norte. O primeiro semestre de 2022 será dedicado a preparar a licitação e os estudos para os projetos de arquitetura e de engenharia da nova sede. Desde 2005, o conselho vinha ocupando imóveis alugados ou funcionando na própria PGR.

O CNMP passou por uma grande renovação de quadros a partir de outubro de 2021, quando quatro conselheiros se despediram: Sebastião Caixeta, Sílvio Amorim, Sandra Krieger e Fernanda Marinela. Em fevereiro de 2022, Marcelo Weitzel Rabello de Souza, representante do MPM, também encerrou seu mandato e deixou o conselho.

Em dezembro, seis conselheiros tomaram posse. Foram reconduzidos ao cargo Oswaldo D’Albuquerque e Rinaldo Reis, ambos representantes do MP dos estados. Para o primeiro mandato assumiram Ângelo Fabiano Farias (MPT); Antônio Edílio Magalhães Teixeira (MPF); Daniel Carnio Costa (STJ) e Paulo Cezar Passos (MP estadual). Em fevereiro, Jaime de Cassio Miranda, tomou posse na vaga destinada ao MPM. Antes de ser conselheiro, Miranda já ocupara a Secretaria-geral do CNMP, entre 2020 e 2022.

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Para a composição do CNMP ficar completa, isto é, com os 14 integrantes, faltam as indicações para as duas vagas destinadas à Ordem dos Advogados do Brasil e para a vaga do Supremo Tribunal Federal. A demora do Senado em pautar a aprovação dos novos conselheiros em plenário chegou a prejudicar as atividades do órgão por falta de quórum, já que o conselho precisa de pelo menos sete dos 14 integrantes para abrir as sessões. Sessões do final de outubro e de novembro de 2021 tiveram de ser canceladas. Na ocasião, quatro conselheiros estavam em final de mandato, e as seis indicações estavam travadas no Senado Federal.

A demora na aprovação dos nomes foi atribuída à suspensão das sessões presenciais do Senado em razão da epidemia de covid-19. O Conselho Nacional de Justiça e o próprio Supremo Tribunal Federal também ficaram desfalcados – neste, em razão da resistência do presidente da Comissão de Constituição e Justiça, senador Davi Alcolumbre, à indicação de André Mendonça pelo presidente Jair Bolsonaro. Foram cinco meses de espera até a aprovação; Mendonça tomou posse como ministro do STF em 16 de dezembro de 2021.

Dois candidatos a ocupar postos na composição do CNMP foram rejeitados pelo Plenário do Senado, em dezembro de 2021, depois de terem passado pela sabatina da Comissão de Constituição e Justiça da casa, ainda em março de 2020. O juiz do Tribunal de Justiça de Santa Catarina Marcos Paulo de Farias, indicado pelo STF, precisava de 41 votos, mas obteve 36. Entre 2016 e 2020, ele trabalhou nos gabinetes dos ministros do Supremo Teori Zavascki (morto em um acidente aéreo em janeiro de 2017) e Edson Fachin. Ambos foram relatores da “lava jato” em processos contra autoridades com foro privilegiado, entre eles alguns senadores. Em declarações ao jornal O Estado de S.Paulo, Farias definiu a rejeição do seu nome pelo Senado como uma decisão política.

Já Ediene Santos Lousado, ex-chefe do MP-BA, foi aprovada na CCJ para ocupar uma das vagas destinadas ao MP dos estados, mas, nesse intervalo, foi afastada de suas funções no Ministério Público da Bahia em dezembro de 2020 por decisão do ministro do Superior Tribunal de Justiça Og Fernandes. Ela é investigada na operação faroeste, que apura um suposto esquema de venda de sentenças no Tribunal de Justiça da Bahia. A ex-chefe do MP baiano de 2016 a 2020 nega participação.

Em 15 de junho de 2020, foi publicada a Resolução 214/2020, que regulamentou a retomada gradual do trabalho presencial no âmbito do MP brasileiro. A norma regula a forma de retorno das atividades de forma gradual e sistematizada. Cada MP assumiu a responsabilidade da retomada gradual, obrigando-se a cumprir as normas sanitárias.

Anuário do Ministério Público Brasil 2022
ISSN: 2675-7346
Edição: 2021 | 2022
Número de páginas: 204
Editora ConJur
Versão impressa: R$ 40, exclusivamente na Livraria ConJur (clique aqui)
Versão digital: acesse gratuitamente pelo site http://anuario.conjur.com.br e pelo app Anuário da Justiça

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