O "direito de escolha" na lei que prevê retorno de gestantes ao trabalho
21 de março de 2022, 16h09
A nova lei prevê a volta presencial das grávidas após imunização completa contra a Covid-19, de acordo com os critérios do Ministério da Saúde, ou ainda nas seguintes hipóteses: encerramento do estado de emergência; se a gestante se recusar a se vacinar contra o novo coronavírus, com termo de responsabilidade; ou se houver aborto espontâneo com recebimento do salário-maternidade nas duas semanas de afastamento garantidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A prática relativiza o direito à saúde e a necessidade de vacinação dos trabalhadores. Tendo em vista que referida alteração dispõe que a gestante poderá assinar um termo de responsabilidade para que ocorra o retorno sem a imunização.
Para melhor elucidar tal contexto, podemos mencionar como exemplo casos em que o termo será assinado por empregada gestante que porventura se negue a proceder com a imunização, por motivos ideológicos ou até mesmo como consequência da falta de conhecimento adequado sobre o esquema vacinal, podendo retomar ao trabalho presencial, com a justificativa de estar exercendo seu direito de expressão, liberdade e da autodeterminação individual.
Ocorre que na prática o que temos é uma legislação que relativiza a necessidade e importância da vacina, saúde coletiva e da mulher no ambiente laboral, podendo gerar até mesmo controvérsias de complexa resolução, pois em alguns casos o esquema vacinal para ser completo requer um lapso temporal entre as doses.
Partindo do pressuposto da boa-fé, todos os empregadores serão atenciosos e coerentes, aguardando o ciclo completo de vacinação ou respeitando os riscos que a gestante obtém.
Por outro lado, no dia a dia da empregada ela pode ser coagida a retornar ao trabalho, o mais breve possível, mediante assinatura de tal termo, sem obter subsídios probatórios suficientes para que leve tal fato a ser questionado.
Dessa forma não se vislumbra qualquer proteção contundente à trabalhadora, sendo o viés ideológico uma questão problemática aos direitos trabalhistas.
Com escopo no direito fundamental da liberdade e autodeterminação individual a vacina e a proteção da gestante são aviltadas diante da alteração legislativa, as deixando em um contexto de vulnerabilidade, pois nas relações laborais podem surgir o seguinte questionamento: quem garantirá que o termo de responsabilidade será assinado de espontânea vontade, livre de qualquer coação e que seja assegurando o dito "direito de escolha"? A inquietação que paira é se o referido direito de escolha poderia ter sua finalidade desviada, e ser utilizado como mecanismo de obrigatoriedade para o retorno imediato das empregadas.
Ademais é mister reiterar que o texto da Lei chega a ser ingênuo quanto a realidade fática de trabalhadores que possuem suas garantias legais constantemente negligenciadas sob ameaça constante de demissões e sanções, principalmente frente ao contexto econômico em colapso e o índice de desemprego que está cada vez mais alarmante.
Portanto, a viabilidade prática das alterações promovidas só poderá ser analisada após um período de aplicabilidade nas relações empregatícias, as quais demonstrarão como o mercado de trabalho irá reagir diante das novidades legislativas.
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