Interferência indevida

Membro do Legislativo não pode compor conselho municipal de cultura, diz TJ-SP

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27 de junho de 2022, 14h42

Um representante da Câmara Municipal, ainda que por intermédio de pessoa diversa do parlamentar, não pode integrar conselhos municipais e interferir diretamente em assuntos administrativos da competência do chefe do Poder Executivo, a quem cabe exercer a direção superior da administração e praticar os demais atos de gestão.

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ReproduçãoMembro do Legislativo não pode compor conselho municipal de cultura, diz TJ-SP

Com base nesse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo anulou um dispositivo de uma lei de Santo André, que obrigava a inclusão de um integrante da Câmara de Vereadores no Conselho Diretor do Fundo de Apoio à Gestão Cultural do município.

Tal determinação se deu por meio de emenda parlamentar ao projeto de criação do Fundo de Apoio à Gestão Cultural de Santo André. A emenda foi questionada na Justiça pela prefeitura com o argumento de que houve interferência indevida na atividade da gestão administrativa. A ADI foi julgada procedente, em votação unânime.

De início, a relatora, desembargadora Cristina Zucchi, afirmou que os projetos de lei de iniciativa exclusiva do chefe do Poder Executivo, caso dos autos, podem, a princípio, ser alterados por meio de emendas apresentadas pelo Poder Legislativo. No entanto, tal poder de emenda não é ilimitado, encontrando exceções no texto constitucional.

"Assim, as emendas parlamentares são admitidas em projetos de lei de iniciativa privativa do Executivo, desde que não ocorra: o aumento da despesa prevista e apresentação de emendas que versem assunto distinto do da proposição que se quer emendar, por uma questão de lógica legislativa", afirmou Zucchi.

No caso dos autos, a relatora destacou que a emenda impugnada acrescentou um membro ao conselho, o que guarda pertinência temática com o projeto de lei original encaminhado pelo Poder Executivo, e também não resulta em aumento de despesa, uma vez que os conselheiros não farão jus a remuneração, por se tratar de serviço relevante ao interesse público.

"Não se constata, pois, vício de inconstitucionalidade formal (processo de elaboração da norma), eis que não há impedimento constitucional no sentido do Poder Legislativo apresentar emenda que altere o projeto de lei original iniciado pelo chefe do Executivo, desde que, como na hipótese dos autos, haja pertinência temática e não haja aumento de despesa", disse.

Por outro lado, Zucchi afirmou que, ao prever um representante do Poder Legislativo para participar de um conselho municipal, houve afronta ao princípio da separação dos poderes consagrado pelo artigo 5º, caput, da Constituição do Estado, por vício de inconstitucionalidade material (conteúdo da norma contrário à Constituição).

"O Conselho Diretor do Fundo de Apoio à Gestão Cultural é órgão que desempenha funções administrativas afetas a órgão determinado da administração (Secretaria da Cultura). Neste particular, forçoso reconhecer que há evidente invasão do Legislativo na esfera da gestão administrativa na parte em que impõe a participação de um membro do Legislativo para tratar de questões relativas à organização administrativa e ao funcionamento de órgãos integrantes da administração", completou.

A conclusão da magistrada foi de que a emenda não se mostra formalmente inconstitucional ao acrescentar um membro ao conselho municipal, ante a existência de pertinência temática e ausência de aumento de despesas. Porém, ao impor a representação do referido conselho por um membro do Poder Legislativo, a emenda desbordou para "indesejável ofensa ao sistema da separação dos poderes, com intervenção direta do Legislativo em assunto administrativo".

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2183453-32.2021.8.26.0000

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