O sofrimento dos aposentados com o Imposto de Renda e os JCP
27 de junho de 2022, 8h04
Diferentemente do que ocorre com os tributos sobre o consumo, (ICMS, por exemplo), que são indiretos, o Imposto de Renda (IR) é direto, ou seja, recai diretamente sobre a capacidade contributiva das pessoas. A ideia é apurar exatamente o quanto de "renda" a pessoa auferiu no período, descontando as despesas mais relevantes e tributando o saldo.
A coisa se complica de vez quando se analisa o Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF), pois muitos gastos sequer são apurados devidamente. Um exemplo bastante emblemático: é possível ter sido gasto uma fortuna com educação (própria ou de seus dependentes), mas o valor permitido de desconto é de apenas R$ 3.561,50, por ano! Assim, a capacidade contributiva fica comprometida. Os exemplos poderiam se multiplicar.
Vou centrar atenção no IRPF dos aposentados, pois, para estes, a situação é muito mais perversa.
Parto do pressuposto que é usual os aposentados terem mais de uma fonte de renda tributável, pois muitos se aposentam ainda em condições de trabalho, e retornam ao batente, o que é muito bom. Quem recebe uma aposentadoria do INSS e retorna a trabalhar se depara com um problema, que é o da somatória das fontes.
Explico: a primeira alíquota do IRPF é de 7,5%, a segunda é de 15%, a terceira é de 22,5% e a última é de 27,5%, sendo que esta é aplicável para quem ganha acima de R$ 4.664,68 por mês. Assim, quem recebe de uma fonte (que pode ser a da aposentadoria), sob a alíquota de 15%, e tem uma segunda fonte de renda tributada sob a mesma alíquota, ao declarar o IRPF terá as duas fontes de rendimentos somadas, o que seguramente elevará a tributação para uma alíquota superior, fazendo com que inexoravelmente tenha que pagar mais tributo do que os descontos efetuados na fonte.
É preciso acrescer mais uma informação: quem possui acima de 65 anos, usualmente aposentado, têm um limite de isenção de proventos até o valor anual de R$ 24.751,74, que corresponde ao limite máximo de isenção para todos (R$ 22.847,76), somado ao 13º salário igualmente isento (R$ 1.903,98). O que ultrapassar esse montante é tributado normalmente de acordo com a tabela progressiva do IRPF.
Por exemplo: quem recebe R$ 3.300,00 mensais de uma fonte e recebe R$ 3.800,00 de outra fonte, ao invés de permanecer sob a alíquota de 15%, que incidiu na fonte sobre cada qual desses rendimentos, verá que ao fazer a declaração os valores recebidos serão somados, acarretando que a alíquota passe a ser de 27,5%, gerando saldo a pagar de IRPF. Colocando em números, e considerando a isenção para quem tem 65 anos ou mais: uma parcela da receita auferida com a primeira fonte será isenta (até R$ 24.751,74), o saldo de R$ 18.148,26 será somado ao valor da segunda fonte de renda, que é de R$ 48.100,00 (R$ 3.800,00 x 13), gerando uma base tributável de R$ 67.548,26 sob a alíquota de 27,5%.
Claro que simplifiquei o exemplo, abstraindo os abatimentos que possam ser aplicados, em especial os gastos com saúde, dentre outros aspectos.
Onde reside a iniquidade? No fato de que uma fonte de renda decorre do trabalho atual (a segunda) e a outra decorre de uma retribuição pelo trabalho já realizado (a aposentadoria). Eis mais um caso de divergência entre o direito (que busca a Justiça) e a matemática (que busca a exatidão).
Como resolver esse problema matemático à luz da Justiça?
Estabelecer que o valor recebido de aposentadoria seja exclusivamente tributado na fonte, tal como são os rendimentos das aplicações financeiras e os Juros sobre o Capital Próprio (JCP). Aliás, com um pouco de imaginação, seria possível afirmar que as aposentadorias se caracterizam como uma espécie de JCP — Juros sobre o Capital Próprio, não? Os JCP são uma espécie de juros que a empresa deve aos seus sócios pelo empréstimo de capital, pois, ao iniciar uma empresa, os empresários integralizam recursos na sociedade e recebem JCP em razão disso, que são tributados exclusivamente na fonte.
Considerando que o capital humano foi utilizado ao longo do tempo, o que gera o pagamento de aposentadoria, seu valor deve ser tributado tal qual os JCP, exclusivamente na fonte, pela alíquota de 15%, não recompondo o valor a ser tributado com outras eventuais fontes que existam.
Isso resolveria o problema dos aposentados, tenham ou não outras fontes de renda, ou mesmo que recebam acima dos atuais R$ 24.751,74 anuais (para quem tem mais de 65 anos). Claro que a isenção até esse montante teria que ser mantida, a fim de evitar outras iniquidades.
Afinal, porque não dar às aposentadorias (e às pensões) o mesmo tratamento que se dá aos JCP? Não há justificativa plausível, devendo ambos serem tributados pela mesma alíquota de 15%, exclusivamente na fonte, mantida a atual faixa de isenção para as aposentadorias.
Quem sabe algum parlamentar se anime e apresente essa proposta para debate no Congresso.
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