Opinião

Patrimônio de afetação rural e os efeitos da Lei 13.986/20

Autores

  • Gilmar Pereira Custódio

    é sócio-fundador da Custódio e Schmidt Advocacia pós-graduado em Direito Civil Processo Civil e Imobiliário e pós-graduando em Direito Registral e Notarial membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-ES e vice-presidente jurídico da Ademi-ES.

  • Kelly Durazzo

    é advogada sócia do Durazzo & Medeiros Advogados presidente da coordenaria da Comissão de Loteamento da OAB-SP e Ibradim e diretora estadual da Comissão da Reurb SP.

14 de junho de 2022, 7h03

A Lei 13.986, de 7 de abril de 2020, introduziu no ordenamento jurídico brasileiro (artigo 7º) a possibilidade de instituição do patrimônio de afetação nos imóveis rurais ou na fração deles.

O patrimônio de afetação é instituto afeto às incorporações imobiliárias e encontra-se disciplinado no artigo 31 [1]-A da Lei 4.591/64, dispondo que o incorporador poderá afetar o terreno, as acessões e os diretos oriundos de uma incorporação imobiliária como patrimônio de afetação, o qual não se comunicará com o patrimônio pessoal do incorporador e só responderá pelas dividas e obrigações vinculadas àquela incorporação.

Com o advento da Lei 13.986/20 foi regulamentada à possibilidade de os proprietários de imóveis rurais solicitarem à instituição e registro do patrimônio de afetação no RGI, sobre a totalidade do terreno ou em parte dele e sobre as benfeitorias, excluindo os semoventes, as lavouras e os bens móveis.

A instituição do patrimônio de afetação rural visa permitir, prioritariamente que o proprietário possa prestar garantias por meio das Cédulas de Produto Rural (CPR) prevista na Lei 8.929/94, bem como, utilizá-las em garantias nas operações financeiras contratadas por ele, sendo vedada a instituição do patrimônio de afetação rural nos casos previstos nos incisos I a IV do artigo 8º, quais sejam: (1) sobre imóveis gravados com ônus reais (hipoteca — alienação fiduciária); (2) sobre a pequena propriedade com área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento; (3) sobre a área de tamanho inferior ao módulo rural ou à fração mínima de parcelamento; (4) sobre o bem de família.

As Cédulas de Produto Rural (CPR) são aquelas emitidas pelo produtor rural representada pela promessa de entrega de produtos rurais obtidos com atividade agrícola, pecuária, floresta plantada, pescas, aquicultura, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico, as atividades relacionadas à conservação de florestas nativas e dos seus respectivos biomas, floresta de manejo concedidas pelo poder público e outras atividades florestais a serem posteriormente definidas em lei.

Por outro lado, é importante atentar que uma vez instituído o patrimônio de afetação rural, enquanto o imóvel estiver sujeito a ele, não poderá ser objeto de compra e venda, doação, parcelamento ou outro ato traslativo por iniciativa do proprietário (§ 2º — artigo10), bem como, não poderá servir de garantia a qualquer outra operação estranha à que ele esteja vinculada, é impenhorável e não se sujeita a atos de constrição judicial, falência, insolvência civil ou recuperação judicial do proprietário de imóvel rural, concurso de massa falida, exceto quanto aos créditos trabalhistas, previdenciários e fiscais do produtor rural.

Para instituir o patrimônio de afetação o proprietário rural deverá fazer uma solicitação por escrita ao oficial do RGI e providenciar os documentos exigidos no artigo 12 da lei 13.986/20, que basicamente são: (1) Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR); (2) Cadastro Ambiental Rural (CAR); (3) Certidão de regularidade fiscal, trabalhista, protesto, distribuidores forenses e previdenciária do domicilio do requerente e do imóvel; (4) Certificado do Incra; (5) Georreferenciamento do imóvel do qual a totalidade ou a fração está sendo constituída como patrimônio rural em afetação; (6) Memorial descritivo com coordenadas, planta e ART.

Uma vez protocolado o pedido de instituição do patrimônio de afetação, o oficial do RGI competente fará a averiguação da documentação apresentada. Nesse ponto a lei foi omissa quanto ao prazo para essa averiguação, nos fazendo crer que deve prevalecer o prazo de 15 dias úteis fixado no §4º — art.198 da Lei 6.015/73. Se a documentação for considerada incompleta ou inapta pelo oficial do RGI, o interessado terá o prazo de 30 dias para suprir as incoerências apontadas, sob pena de ter seu pedido indeferido. Estando apta, o pedido de registro será processado normalmente.

A partir da instituição do patrimônio de afetação, caberá ao proprietário promover todos os atos para sua preservação e conservação, inclusive com a adoção das medidas judiciais necessárias, bem como manter-se adimplente com as obrigações tributárias, fiscais, previdências e trabalhistas do imóvel e dos seus empregados.

Para extinção do patrimônio de afetação, o caminho a ser seguido será basicamente o mesmo da sua instituição. O proprietário deverá formular pedido por escrito ao oficial do RGI, e apresentar os documentos necessários e comprovar a inexistência de CIR (Cédula Imobiliária Rural) ou CPR (Cédula de Produto Rural) gravada sobre o imóvel que se pretende desafetar.

Ao nosso sentir, a Lei 13.986/20 trouxe importante instrumento que possibilitará os produtores rurais lastrearem suas operações de crédito ou de fomento por meio de uma garantia real, proporcionando-os acesso mais fácil ao crédito, taxas de juros mais acessíveis e quando quiser, possibilidade de fracionamento da terra sem comprometer a totalidade do seu patrimônio.


[1] Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004).

Autores

  • é sócio-fundador da Custódio e Schmidt Advocacia, pós-graduado em Direito Civil, Processo Civil e Imobiliário e pós-graduando em Direito Registral e Notarial, membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-ES e vice-presidente jurídico da Ademi-ES.

  • é sócia do Durazzo & Medeiros Advogados, presidente da Comissão de Loteamentos do Ibradim, diretora SP da Comissão de Regularização Fundiária Urbana (Reurb) e presidente da Coordenaria de Loteamento da Comissão da OAB/SP.

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