Opinião

Recurso de revista em face de tese fixada em IRDR tem efeito suspensivo?

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17 de julho de 2022, 6h06

Em 14/3/2022, o Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região, ao julgar o Incidente de Assunção de Competência nº 0000233-34.2021.5.11.0000, fixou a seguinte tese:

"AMAZONAS ENERGIA S.A. NORMA INTERNA. DG-GP- 01/N-013. PROCEDIMENTOS PARA DISPENSA SEM JUSTA CAUSA. REVOGAÇÃO. INEFICÁCIA EM RELAÇÃO AO EMPREGADO ADMITIDO ANTERIORMENTE. O direito do empregado contratado anteriormente à mudança do normativo interno que assegurava que eventual dispensa sem justa causa passaria pelos procedimentos previstos na norma denominada DG-GP-01/N- 013, foi incorporado ao seu contrato de trabalho, uma vez que a norma interna foi criada dentro da vigência do contrato de trabalho do obreiro, sendo irrelevante que a reclamada tenha alterado a sua natureza jurídica, como expressamente descrito no artigo 10 da Consolidação das Leis do Trabalho e na Súmula 51 do C. TST".

Sem aprofundar a discussão de mérito da tese fixada, infere-se que esta equipara equivocadamente uma modificação da própria natureza e regime jurídico da Amazonas Energia, decorrente de sua privatização, a uma mera a alteração de estrutura jurídica e sucessão empresarial, previstas respectivamente nos artigos 10 e 448 da CLT, o que se compreende serem coisas distintas. De igual modo, o precedente firmado em IRDR destoa da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho [1], o qual já decidiu anteriormente que o empregado dispensado sem motivação após o processo de privatização, não tem direito à reintegração no emprego, não havendo o que se falar em direito adquirido às regras anteriores à privatização, incluindo às suas normas internas.

Nesse contexto, indaga-se, eventual Recurso de Revista em face da tese fixada em sede do IRDR pela Corte Regional Trabalhista é revestido ou não de efeito suspensivo?

Pois bem, a primeira resposta que vem a cabeça é não, o recurso de revista interposto não terá efeito suspensivo. É o que informa o artigo 8º, §2º da Instrução Normativa nº 39/2016 do TST e o art. 150 do Regimento Interno do TRT-11, in verbis:

"Artigo 8° Aplicam-se ao Processo do Trabalho as normas dos artigos 976 a 986 do CPC que regem o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR).
§2ºDo julgamento do mérito do incidente caberá recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho, dotado de efeito meramente devolutivo, nos termos dos arts. 896 e 899 da CLT.
Artigo 150. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho, dotado de efeito meramente devolutivo, hipótese em que terão prosseguimento os processos sobrestados, com julgamento de mérito nos órgãos de primeira e segunda instâncias, que observarão necessariamente a tese jurídica fixada no incidente, admitida a execução provisória".

No entanto, advoga-se que essa compreensão adotada pela justiça trabalhista não encontra respaldo em nosso ordenamento jurídico para prevalecer, pois, em que pese o Recurso de Revista possua efeito meramente devolutivo, tem-se que este, ao lado do Recurso Extraordinário e Especial, possui natureza extraordinária [2]. Corrobora o exposto o fato do cabimento do Recurso de Revista em face de decisões dos TRTs que afrontem diretamente à Constituição Federal [3], razão pela qual perfilha-se que em tais casos, os Recursos de Revista são dotados de efeito suspensivo e presunção de repercussão geral (transcendência), nos termos do artigo 987, §1º do CPC, in verbis:

"Artigo 987. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso extraordinário ou especial, conforme o caso.
§1º O recurso tem efeito suspensivo, presumindo-se a repercussão geral de questão constitucional eventualmente discutida".

Milita a favor do Recurso de Revista ser dotado de efeito suspensivo, recente precedente firmado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, o qual consignou que interposto Recurso Especial ou Recurso Extraordinário contra o acórdão que julgou Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), a suspensão dos processos realizada pelo relator ao admitir o incidente só cessará com o julgamento dos referidos recursos, não sendo necessário, entretanto, aguardar o trânsito em julgado. STJ. 2ª Turma. REsp 1.869.867/SC, relator ministro Og Fernandes, julgado em 20/04/2021 (Info 693).

Ademais, aplicar o entendimento das Cortes Trabalhistas de que o Recurso de Revista em face de tese fixada em IRDR somente terá efeito meramente devolutivo, é o mesmo que admitir o prosseguimento dos processos pendentes antes do julgamento dos recursos de revistas interpostos contra o acórdão do IRDR, o que certamente ensejará uma multiplicidade de atos processuais desnecessários, sobretudo recursos, porquanto os sujeitos inconformados com o posicionamento firmado no julgamento do IRDR terão que interpor recursos nos diversos processos subjetivos a fim de evitar a formação de coisa julgada antes do posicionamento definitivo do Tribunal Superior do Trabalho e, possivelmente, do Supremo Tribunal Federal.

De modo contrário, atribuir ao Recurso de Revista o efeito suspensivo previsto no artigo 987, §1º, como se propõe, equivalerá à manutenção da suspensão dos processos pendentes até o julgamento dos recursos pelos tribunais superiores, assegurando-se a homogeneização das decisões judiciais sobre casos semelhantes, garantindo-se a segurança jurídica e a isonomia de tratamento dos jurisdicionados.

Do exposto, imprescindível a adoção pela justiça do trabalho do efeito suspensivo ao Recurso de Revista interposto contra as teses fixadas em IRDR, nos termos do artigo 987, §1º do CPC, em homenagem aos princípios da segurança jurídica e isonomia, e, no caso concreto, da precaução, considerando que imediata aplicação da tese firmada ocasionará prejuízos de elevada monta, de aproximadamente R$ 429 milhões anuais, decorrentes da reintegração dos empregados demitidos após a privatização, mas admitidos sob à égide da norma interna DG-GP-01/N- 013.


[1] PROCESSO Nº TST-Ag-RR-1063-25.2020.5.22.0001

[2] O TST goza da mesma natureza do STF, de instância extraordinária, atuando por delegação na interpretação final do ordenamento jurídico-trabalhista infraconstitucional, razão pela qual o tratamento a ser dado, em termos de mecanismos redutores de recursos ao STF, deve ser adotado também para o TST (e STJ); (MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. O critério de transcendência no recurso de revista. Revista Jurídica Virtual  Brasília, vol. 2, nº 20, jan. 2001).

[3] CLT, Artigo 896  Cabe Recurso de Revista para Turma do Tribunal Superior do Trabalho das decisões proferidas em grau de recurso ordinário, em dissídio individual, pelos Tribunais Regionais do Trabalho, quando:

— proferidas com violação literal de disposição de lei federal ou afronta direta e literal à Constituição Federal.

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