Opinião

Derrubada do veto presidencial e resgate à dignidade da advocacia

Autor

  • Thiago de Miranda Coutinho

    é graduado em Jornalismo e Direito especialista em inteligência criminal coautor de três livros articulista e agente de Polícia Civil e integrante do corpo docente da Academia de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina.

6 de julho de 2022, 11h28

Na noite desta terça-feira (5/7), o Congresso derrubou relevantes dispositivos que haviam sido vetados pelo presidente da República no Projeto de Lei que altera as prerrogativas dos advogados e atualiza a Lei Federal n° 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia).

Com 414 votos a 39 na Câmara dos Deputados e 69 a 0 no Senado, a Advocacia brasileira teve sua dignidade restabelecida e sua proteção constitucional assegurada.

Não obstante, cumpre destacar o respaldo ao nobre papel do Advogado esculpido a duras penas na Carta Cidadã no histórico artigo 133, que aduz:

"Art. 133, CF – O Advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei".[1]

Notadamente, versando acerca da importante noite de Brasília, o ponto mais polêmico rejeitado pelo chefe do Executivo versava justamente sobre a inviolabilidade dos escritórios de Advocacia e que, agora, torna a impor maiores regramentos às medidas de busca e apreensão realizadas nestes locais.

Assim, fica vedada a concessão dessas medidas cautelares tão drásticas cuja fundamentação se dê, somente, com base em elementos declaratórios provenientes de delação premiada. Agora, o magistrado deverá considerar a existência de fundamentos substanciados em outros meios de prova que ratifiquem tal ação contra o local sagrado de exercício da Advocacia.

Nesse ponto, frisa-se que o referido projeto surgiu após inúmeras operações policiais, sobretudo no âmbito da Lava Jato, que aviltaram as prerrogativas funcionais da Advocacia e criminalizaram a profissão do Advogado, que é um dos pilares do Estado democrático de Direito e da própria democracia.

Há quem desacredite. Mas acredite! Vide os episódios não tão distantes de um período ditatorial experimentado no país ou, ainda mais recentes — nas palavras do eminente ministro do STF Luís Roberto Barroso — de cenários preocupantes de "recessão democrática" e "constitucionalismo abusivo"[2] que vêm se desenhando numa trama de instabilidade constitucional à brasileira.

Não obstante, vale recordar de casos em que escritórios de advocacia foram alvos de interceptações telefônicas e de escutas ambientais. Formas escabrosas e ardilosas de atacar o sigilo do advogado no afã de subsidiar investigações natimortas ou cujo fim já é sabido de início; típicas de uma guerra fria ou de um estado de exceção.

Notadamente, um constrangimento pra lá de criminoso às causas daqueles investigados e acusados já acuados diante do poder punitivo do Estado.

Desta feita, embora tal inviolabilidade já estivesse prevista no Estatuto da Advocacia de forma genérica, no presente momento ela foi especificada e delineada a prover maiores lastros protetivos àquele que é o elo entre o cidadão e o justo e perfeito acesso à Justiça, baseado no direito à defesa, ao contraditório e ao devido processo legal.

Outrossim, ter a advocacia preservada é assegurar a paridade de armas e a real finalidade da Justiça como conditio sine qua non para um processo democrático, como assevera Carlos Alberto Carbone:

"Por este principio se quiere que el Estado litigante esté em pie de igualdad, pero que a más de abarcar la igualdad de armas respecto a las mismas posibilidades de contradecir, ofrecer prueba, recurrir, etcétera, supone también contemplar la igualdad de recursos estructurales y materiales"[3]

Por fim, ganha a sociedade, pois nas palavras do eterno Rui Barbosa: "A acusação é sempre um infortúnio enquanto não verificada pela prova".[4] 


[1] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.

[2] BARROSO, Luís Roberto. Palestra no evento da Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catarina. Florianópolis, 2022.

[3] CARBONE, Carlos. Principios y problemas del proceso penal adversarial. Santa Fé: Rubinzal-Culzoni, 2019. p. 49-50.

[4] BARBOSA, Rui. Novos Discursos e Conferências, 112.

Autores

  • é jornalista, especialista em Inteligência Criminal, agente de Polícia Civil em Santa Catarina, graduando em Direito pela Univali, coautor de três livros sobre Direito e autor de diversos artigos jurídicos.

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