Opinião

A transação tributária e o Teorema de Coase

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2 de janeiro de 2022, 14h12

Por meio da Medida Provisória nº 889/2019, posteriormente convertida na Lei nº 13.988/2020, a transação tributária, antes já prevista no artigo 171 do Código Tributário Nacional, passou a ser tutelada.

Conforme o referido artigo do CTN [1], transação tributária é uma modalidade de extinção de crédito tributário que se dedica a resolver litígios referentes à cobrança de créditos de natureza tributária. Essa resolução ocorre por meio de um acordo firmado entre o contribuinte (devedor) e o Fisco (cobrador), podendo haver diferentes cláusulas de resolução, como desconto no valor da dívida, parcelamento da mesma, extensão do prazo de pagamento, entre outros. Tendo como objetivo garantir que a cobrança dos créditos tributários seja realizada de forma a equilibrar os interesses da União e dos contribuintes, buscando, assim, reduzir os níveis de inadimplência fiscal e recuperar o crédito devido.

A transação tributária pode ser dividida em dois tipos, sendo eles: 1) a transação por adesão, na qual não há muito espaço para negociação, podendo apenas o devedor aceitar as condições fixadas no edital; e 2) a transação individual, na qual ocorre uma análise individual da situação de inadimplência do contribuinte, observando as suas características e demandas específicas, havendo mais espaço para concessões e mais caminhos para se seguir em uma negociação entre o devedor e o cobrador.

Teorema de Coase
Este segundo tipo, transação tributária individual, pode ser relacionado com uma importante teoria econômica, o Teorema de Coase. A relação entre ambos será o foco deste artigo. Criado pelo economista Ronald Coase, este compreende que quando os direitos de propriedade são bem estabelecidos e os custos de transação são nulos, a solução de uma barganha é pareto-ótima. Ou seja, em um acordo, quando as partes estabelecem de maneira clara todos os seus direitos e deveres, elas tendem a trabalhar de maneira a conciliar os interesses de ambas, de modo a solucionar a barganha para que ninguém saia prejudicado. Em outras palavras, partindo do pressuposto econômico que todos são seres racionais e agem de maneira a maximizar o seu bem-estar, as partes estão agindo corretamente ao evitar uma assimetria de informação, deixando claros seus objetivos e direitos, fazendo com que o trato seja eficiente, viabilizando um cenário favorável para todos os envolvidos.

Tal conceito é relevante por se tratar de uma espécie de "fórmula" a ser seguida quando se busca estabelecer um acordo em que nenhuma das partes se prejudique.

Relação entre o Teorema de Coase e a transação tributária
Como já explicado antes, a transação tributária funciona como um acordo entre o Fisco e o contribuinte, havendo espaço para apreciação de demandas e deveres e juízo de valor destas. Nesse sentido, o devedor (contribuinte inadimplente) tem a chance de negociar com o cobrador (Estado). Assim, seguindo o Teorema de Coase, antes de começar, de fato, a negociação, é necessário estabelecer de maneira clara as demandas e direitos de cada parte. Em outras palavras, cada litigante deve determinar de maneira objetiva as suas intenções, buscando elucidar a outra parte sobre a necessidade de firmar um acordo em que ninguém se prejudique, ou seja, o contribuinte devedor explana seus motivos de inadimplência e até onde alcança a sua capacidade para suprir o débito, assim como o Estado explicita a sua necessidade de receber aquele crédito tributário.

Uma vez estabelecidas as exigências e capacidades, os atores vão para a negociação de fato, sendo nessa fase em que o teorema efetivamente tem impacto, tendo em vista que, neste momento, as partes já esclareceram as suas limitações e necessidades. Ao considerar o que foi estabelecido, estas têm limites e direções para seguir no momento de fazer uma proposta, resultando, assim, em uma propositura que esteja nos parâmetros possíveis (considerando as variáveis da negociação), não prejudicando nenhum litigante e proporcionando um acordo satisfatório para ambas

Por que a transação tributária é um acordo eficiente?
Por ter uma constituição escrita, formal e analítica, diversos assuntos do cotidiano encontram respaldo na lei, o que contribui para sobrecarregar o Judiciário com os mais diversos casos, gerando uma letargia, que atrasa diversos processos. Ao considerar que parte destes são processos de execução fiscal (87,3% de congestionamento do judiciário por este processo em 2020) [2], o Estado vai deixar de receber milhões de reais devido a processos que não dão seguimento. Somado ao fato de que tal processo (execução fiscal) gera um gasto público de cerca de R$ 20 mil pela sua tramitação. Consequentemente, com inúmeros litígios de execução fiscal em tramitação e sem resolução, o que só gera um gasto desnecessário e ineficiente para o Judiciário tornando este mais letárgico.

Por outro lado, ao olhar para a transação tributária, esta se faz viável ante a opção infrutífera de execução fiscal. No sentido de que abre mais espaço para o contribuinte se sentir confortável, pois ele pode buscar um acordo com o Estado o qual agora estaria a mais um passo de recuperar o crédito tributário, além das transações de adesão que se dedicam a pequenas empresas entre outras, aumentando o escopo para mais pessoas (tanto físicas quanto jurídicas) desse tipo de extinção de crédito tributário, que antes parecia distante e de difícil recuperação.

Conclusão
Em razão desse cenário, a transação tributária se coloca como uma alternativa à execução fiscal. Esse instituto abre mais espaço para o contribuinte se sentir confortável para buscar um acordo com o Estado, que, por sua vez, estaria a mais um passo de recuperar o crédito tributário, torna-se imprescindível destacar que a transação tributária possui o mesmo objetivo que o Teorema de Coase: negociar de forma que as duas partes envolvidas no processo sejam beneficiadas. Tendo isso em vista, é palpável que o uso da transação tributária poderia diminuir consideravelmente o número de processos de execução fiscal em trâmite no Judiciário. Além disso, ajudaria o Estado a arrecadar o que é devido, já que a transação tributária permitiria que devedores conseguissem pagar suas dívidas ao firmarem acordos com o Fisco.

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